
Nas festas de fim de ano, cresce a procura pelo moscatel, espumante que lidera as vendas da bebida no Brasil. Nas últimas semanas de 2026, quando a demanda voltar a subir mais uma vez, os consumidores vão comprar a bebida feita com as uvas moscato que estão em pleno desenvolvimento neste fim de 2025.
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Frescor, baixo teor alcoólico, sabor adocicado e preço acessível são alguns dos atributos que ajudam a explicar o sucesso do produto nas prateleiras — além da qualidade, reconhecida em premiações nacionais e internacionais.
Em Farroupilha, município da região serrana do Rio Grande do Sul que ganhou o título de Capital Nacional do Moscatel, o viticultor Luiz Antônio Toso produz uvas moscato em 12 hectares de sua propriedade. A área corresponde a cerca de 40% do vinhedo.
“O nosso terroir apresenta as condições favoráveis, mas o cultivo das uvas moscato exige capricho e dedicação”, afirma. “Em anos chuvosos, elas têm muita tendência a doenças durante a maturação. O nosso maior sócio é o clima”.
No momento, a meteorologia indica que o fenômeno La Niña — o resfriamento das temperaturas no Oceano Pacífico tropical, que está ativo e costuma reduzir o volume de chuvas no Sul do país — será de intensidade fraca. Com essa perspectiva, Toso projeta colher cerca de 25 toneladas de moscato branco por hectare e algo entre 15 e 20 toneladas por hectare das outras duas variedades de moscato que ele cultiva na propriedade.
O mercado brasileiro de espumantes ainda é pequeno se comparado com o de outros países. Segundo a consultoria Ideal, o consumo da bebida per capita é de 175 ml ao ano, média bem inferior à de França e Alemanha, por exemplo, onde o consumo anual é de três a quatro garrafas.
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Mas, em termos absolutos, as vendas têm crescido de maneira consistente. De acordo com a Ideal, em 2024, o mercado brasileiro de espumantes cresceu 2%, para 37,2 milhões de litros — esse foi o quarto ano consecutivo de expansão —, e nada menos do que 40% em comparação com o volume de 2019. O moscatel, que responde por 40% de todo o mercado de espumantes, é o grande responsável por esse aumento.
Para assegurar uma safra de qualidade, Natalino Tumelero, também de Farroupilha, aposta em ações como cobertura e correção de solo e uso de sistema de irrigação no parreiral. A uva moscato ocupa cinco dos 11 hectares do vinhedo do produtor.
Natalino Tumelero, com a sua produção de uva moscato
Arquivo Pessoal
Como o ciclo de produção do fruto é mais longo do que o de outras variedades, isso exige mais cuidado, explica Tumelero — o que, para ele, está longe de ser um fardo, muito pelo contrário. “Nasci na roça, em uma casa encostada no vinhedo. Sou a terceira geração da família que trabalha no cultivo de uva, e, para nós, é uma satisfação acompanhar esse avanço”, afirma.
De acordo com a Associação Farroupilhense de Produtores de Vinhos, Espumantes, Sucos e Derivados (Afavin), Farroupilha tem a maior área de produção de uvas moscato do Brasil, autorizadas para a elaboração dos produtos da Indicação de Procedência (IP) Farroupilha. Na região, o destaque é a cultivar moscato branco, que tem perfil genético identificado como único no mundo.
A produção nacional de espumantes tem crescido a despeito de uma certa inconstância na colheita das uvas moscato. De acordo com o Sistema de Informações da Área de Vinhos e Bebidas (Sivibe), do Ministério da Agricultura, a produção nacional das variedades de moscato mais cultivadas — branco, giallo e moscato —, a produção foi de 134,7 mil toneladas em 2022, caiu para 131,8 mil toneladas no ano seguinte e para 93,7 mil toneladas em 2024. Para este ano, em contrapartida, estima-se colheita de 132,6 mil toneladas.
Essas grandes oscilações refletem, especialmente, os problemas climáticos que o Rio Grande do Sul enfrentou nos últimos anos, segundo Eduardo Piaia, diretor executivo do Instituto de Gestão, Planejamento e Desenvolvimento da Vitivinicultura do Estado do Rio Grande do Sul (Consevitis-RS). O estado lidera a produção de moscato no país.
“Mas há outro fator determinante”, diz ele. “Sempre se produziu a uva moscato para vinhos, mas ela foi migrando para os moscatéis, e [o uso para a produção de vinhos foi] diminuindo”. É por isso, afirma Piaia, que a produção de moscateis está crescendo, mas sem aumento constante na produção de uvas.
E por que os brasileiros têm consumido esse espumante cada vez mais? Não há uma razão única. “O espumante brasileiro cresceu muito, em produção e qualidade, e hoje é uma referência mundial. Isso se reflete no consumo”, afirma Adeliano Cargnin, pesquisador e chefe da Embrapa Uva e Vinho.
A evolução tem resultado em prêmios mundo afora. O Amitié Moscatel Premium, produzido pela vinícola Amitié, de Garibaldi (RS), e o Salton Ouro Moscatel, da Salton — vinícola da qual os produtores Luiz Toso e Natalino Tumelero são parceiros —, figuraram neste ano entre os dez melhores espumantes do mundo no concurso Effervescents du Monde, realizado em Dijon, na França.
Neiva Toso, com sua produção de uva mosato
Arquivo Pessoal
Outra característica do moscatel que agrada ao paladar dos brasileiros é seu baixo teor alcoólico, avalia Thompson Didone, enólogo da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Sul (Emater-RS/Ascar) em Bento Gonçalves. O teor fica entre 7% a 10%, com predominância do percentual de 7,2% na bebida nacional, um patamar inferior ao de vinhos e outros espumantes.
As uvas moscato são aromáticas, exalando cheiro que lembra frutas tropicais como maracujá e abacaxi, mas também pêssegos e peras, além de especiarias e florais. “É uma uva marcante, o que combina com a doçura do produto”, diz o enólogo. A produtividade média fica entre 25 e 30 toneladas por hectare.
Para Andreia Gentilini, sócia-proprietária da vinícola Amitié, das mais de 100 variedades de uvas moscato cultivadas no mundo, as da região de Farroupilha estão entre os maiores destaques. “Nosso espumante moscatel, produzido com as uvas dessa região, é um produto bastante valorizado”, afirma. A vinícola fabrica cerca de 30 mil garrafas de moscatel branco e rosé por ano.
A elaboração do espumante moscatel ocorre por meio do método italiano Asti, em que há somente uma fermentação. Assim, ele difere dos demais espumantes, feitos a partir das técnicas champenoise e charmat, que consistem em duas etapas de fermentação. “O resultado é uma bebida mais doce e fresca, com boa acidez”, observa Andreia Gentilini.





