O Tribunal de Contas da União (TCU) criou um Comissão de Solução Consensual que deverá buscar um acordo, no prazo de 90 dias, para tentar evitar a interrupção das atividades em 379 agroindústrias do país. O objetivo é chegar a um entendimento para a conversão de penalidades máximas aplicadas no passado a frigoríficos de carne bovina e de aves e laticínios, com a suspensão da produção nas unidades, em multas em dinheiro, com a definição dos valores a serem pagos. O passivo judicial dos casos abertos é superior a R$ 183 milhões.
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Os casos analisados são anteriores à aprovação e sanção da lei 14.515/2022, do autocontrole na fiscalização agropecuária, que acabou com esse tipo de penalidade. O pedido de solução consensual foi apresentado pelo Ministério da Agricultura.
A controvérsia é se ainda pode ser aplicada a antiga penalidade de “suspensão de atividades” em processos administrativos que já estavam em curso quando a nova lei entrou em vigor ou se, por analogia, deva-se aplicar a nova penalidade de “suspensão de registro” a infrações cometidas após a vigência da nova lei, mesmo sem a devida regulamentação.
O setor produtivo entende que a sanção de “suspensão de atividades” deixou de existir. Desse modo, seria aplicável o princípio da retroatividade da norma mais benéfica aos processos administrativos ainda em curso. Sem a regulamentação da nova sanção, as associações de frigoríficos contestam pela impossibilidade de sua aplicação, pois violaria os princípios da legalidade estrita e da tipicidade.
Já a Consultoria Jurídica do Ministério da Agricultura e Advocacia-Geral da União (AGU) defendem a aplicação da lei vigente no momento da prática infracional. O entendimento da administração pública é que “os processos iniciados na vigência da lei antiga deveriam ser concluídos de acordo com os seus fundamentos, afastando-se a aplicação da retroatividade benéfica, instituto que, segundo a AGU, estaria restrito à esfera penal”.
O Ministério da Agricultura publicou portarias para tentar solucionar o caso “administrativamente” e substituir a sanção de suspensão por uma multa compensatória, mediante a celebração de um termo de compromisso. “Entretanto, ante a ausência de concordância quanto aos valores pecuniários fixados para a multa compensatória, não houve celebração de termo de compromisso algum”, relatou o presidente do TCU, ministro Vital do Rêgo, no despacho que determinou a instalação da comissão conciliatória.
Segundo o presidente da corte de contas, o passivo judicial relacionado a, pelo menos, 117 ações judiciais, somam mais de R$ 183 milhões, com risco de pagamento de honorários pela União estimado entre R$ 18,3 milhões e R$ 36,6 milhões. Já no campo administrativo, a controvérsia afeta 788 processos sancionadores que podem resultar na interrupção das atividades de 379 empresas, que somam mais de 8,2 mil dias de suspensão já aplicados.
O presidente do TCU disse que a não pacificação da controvérsia “acarreta riscos sistêmicos para o país, com potencial paralisação de unidades produtivas gerando impacto direto na geração de empregos, na arrecadação de tributos e no abastecimento do mercado interno”. Ele apontou ainda efeitos negativos na competitividade do produto brasileiro no exterior.
O assunto foi tratado pelo ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, em reunião com membros do TCU nessa terça-feira (11/11).
A comissão será composta por integrantes da Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos do TCU, o ministro Carlos Fávaro e representantes da Secretaria de Defesa Agropecuária e da consultoria jurídica da Pasta, além da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), e a Associação da Brasileira da Indústria de Lácteos Viva Lácteos).