Medida causa impacto direto no agro, afirma ex-ministra Tereza Cristina A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) divulgou nota nesta quinta-feira (12/6) criticando a Medida Provisória 1.303/2025, que prevê a cobrança de impostos sobre os dividendos de títulos do agronegócio.
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Como primeiro grande impacto da MP, a frente do agro cita o aumento dos preços de itens da cesta básica.
“Dos R$ 158 bilhões apontados como “renúncia fiscal” pelo Ministério da Fazenda, mais de R$ 88 bilhões dizem respeito à desoneração de itens da cesta básica, como arroz, feijão, carne, leite e ovos. Esses alimentos são consumidos diariamente pela população mais pobre, e sua isenção tributária já era uma conquista histórica. […] Agora, o próprio governo ameaça esse avanço por meio de artifícios infralegais”, disse a FPA, em comunicado.
De acordo com a frente parlamentar do agro, o aumento de tributos também penaliza o produtor rural, já que, segundo o colegiado, seu custo de produção aumentará com a tributação de insumos essenciais, como fertilizantes, defensivos e sementes.
A FPA ainda projeta impactos para os investidores do setor produtivo. O colegiado lembrou que a taxação das Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) compromete diretamente o financiamento da produção agrícola. Esses papéis representaram 43% do crédito privado rural em 2024 e viabilizaram R$ 108 bilhões no Plano Safra.
“Ao tributar esse mecanismo, o governo reduz a oferta de crédito, encarece a produção e pressiona o preço dos alimentos, tudo isso em um cenário de alta dos insumos, câmbio elevado e Selic em patamar proibitivo”, diz a nota.
A FPA segue, dizendo que “ao contrário do que afirma o governo, não são os “super-ricos” que serão os mais atingidos. Quem sofre é quem investe em fundos de previdência, quem aplica em produtos financeiros populares, quem trabalha no campo, quem empreende e, no fim da cadeia, quem consome. São brasileiros que movimentam a economia real e sustentam o país com trabalho e produção”.
Para justificar a afirmação, a bancada agro cita dados Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Segundo a entidade, 4,1 milhões de investidores classificados como “tradicionais”, ou seja, sem patrimônio milionário, são titulares de contas aplicadas nesses instrumentos de renda fixa isentos, como LCAs, LCIs, CRIs, CRAs e debêntures incentivadas.
Esses investidores representam 63,7% do total de contas, sendo que os grupos “alta renda” e “private”, com valores superiores a R$ 5 milhões, representam 36,3%. Juntas, essas aplicações somam um estoque de R$ 1,2 trilhão, dos quais R$ 361 bilhões estão nas mãos de investidores tradicionais, a parcela da população mais atingida pelas medidas.
IOF
Ainda na avaliação da FPA, o aumento do IOF sobre remessas internacionais proposto pelo governo também agrava o quadro para o setor produtivo. A cobrança atinge royalties da biotecnologia, operações entre tradings e matrizes, franquias de alimentação e cadeias logísticas, criando novos custos em praticamente todos os elos do agro. O impacto é direto no produtor rural e em toda a cadeia agroindustrial, comprometendo o abastecimento interno e a competitividade do Brasil no exterior.
Resposta a Haddad
A nota da Frente Parlamentar da Agropecuária responde ainda a uma fala do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O ministro disse nesta semana que o governo “patrocina” o agro com uma renúncia fiscal de R$ 158 bilhões. A frente retrucou a fala e disse que ela não se sustenta.
“Dos R$ 158 bilhões em renúncias, cerca de R$ 68 bilhões referem-se a insumos agropecuários que, se tributados, aumentam o custo dos alimentos. A cesta básica não é subsídio ao produtor, mas um direito do consumidor. Além disso, mesmo as desonerações do agro não representam, na prática, perda efetiva de arrecadação, já que se trata de tributos não cumulativos que gerariam crédito para o adquirente”.
A bancada do agro, ao mencionar dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), destacou que o Brasil é um dos países que menos subsidiam sua agricultura: apenas 3,1% da receita bruta agrícola nacional vem de apoio público.
Por fim, a frente que representa os deputados do agro, cobrou medidas como a reforma administrativa como forma de cortar gastos públicos, e ainda defendeu mecanismos contra a sonegação fiscal.
“A FPA defende uma política tributária justa, que onere menos quem produz. Que valorize o trabalho, o empreendedorismo e a geração de riqueza. Não aceitaremos medidas que penalizem o produtor rural e o prato do brasileiro para cobrir o descontrole fiscal do governo”.
Para a senadora Tereza Cristina (PP-MS), medida vai ter impacto imediato e direto no financiamento do setor agropecuário
Pedro França/Agência Senado

Tereza Cristina
A senadora Tereza Cristina (PP-MS), vice-presidente da FPA, afirmou nesta quinta-feira que a Medida Provisória 1.303/2025 vai ter impacto imediato e direto no financiamento do setor agropecuário. Ao Valor, ela disse que a reação do Congresso Nacional ao texto é “ruim”, mas que as equipes técnicas vão avaliar a MP no detalhe para entender os efeitos na economia do país como um todo.
“A reação é ruim porque vem uma cobrança de tributos, mas não vem nada de corte de gastos nem de priorização de políticas que poderiam estar melhor revistas”, disse a ex-ministra da Agricultura. “Ainda estamos recolhendo as impressões, mas pelo o que estou sentindo tem muita resistência”, indicou. O PP, partido da senadora, e o União Brasil já anunciaram que não votarão nenhuma matéria que trate de aumento de imposto.
Deputados e senadores têm até a próxima terça-feira (17/6) para apresentar emendas ao texto. “Ainda estamos estudando os impactos, pois tem muito detalhe. Tem coisas que foram colocadas e não foram discutidas na reunião de domingo, pelo que disseram hoje”, acrescentou. “Temos que analisar com muita calma para saber o impacto que vai ter na economia como um todo”, completou.
Tereza Cristina disse que a taxação de 5% do Imposto de Renda sobre as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) terá “impacto imediato” sobre o financiamento agropecuário, altamente dependente dessa captação de recursos. “Passa a valer em 2026, mas as pessoas já começam a mudar as aplicações para outras modalidades, e sabemos que o agro hoje é financiado, em grande parte, pelas LCAs”, afirmou.
A senadora também questionou os dados de renúncia fiscal do setor agropecuário apresentados pela equipe econômica do governo para justificar a taxação dos títulos do agronegócio. Segundo o governo, o campo tem R$ 158 bilhões anuais de benefícios fiscais.
“Desse total, mais de R$ 88 bilhões são de desoneração da cesta básica, do arroz, do feijão. O governo quer tirar isso?”, apontou. “Não tem essa de andar de cima [que será impactado], serão todos. Dizer que o agro é muito beneficiado e que não paga imposto é uma narrativa que não traz a real situação, a verdade sobre o setor”, acrescentou.
Ela argumentou ainda que outra parte da renúncia fiscal está na isenção para importação de insumos agropecuários, como sementes, fertilizantes e pesticidas. “Mas isso é custo de produção, se tirar a isenção o impacto será direto no bolso do consumidor. Não tem ponta solta”, completou.
A ex-ministra concordou, no entanto, que é preciso fazer uma revisão nos benefícios fiscais em geral. “É necessária a revisão, não dá para negar. A situação é muito séria, ninguém quer jogar contra o país. Mas isso tem que ser feito com tempo para resolver, não é só taxar”, disse.