Atualmente, as políticas de incentivo específico à agricultura regenerativa ainda são escassas e dispersas A agricultura regenerativa é um conceito disputado e sem uma delimitação específica. Contudo, pode ser compreendida como um sistema produtivo que adota princípios agrícolas que reabilitam todo o ecossistema e melhoram os recursos naturais, em vez de esgotá-los, conforme apresentado pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (“CEBDS”).
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É um sistema baseado nos eixos do pluralismo; da proteção; da pureza; da permanência; da paz; do potencial; e do progresso e que prioriza a restauração e a resiliência dos ecossistemas, por meio de práticas como plantio direto, adubação verde, agrofloresta, integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), manejo adequado do pasto, fixação biológica de nitrogênio e recuperação do solo.
Tais eixos são estabelecidos pelo Plano ABC+ (2020–2030), que é uma agenda do Ministério da Agricultura e Pecuária (“MAPA”) que busca ampliar a adoção de práticas agrícolas sustentáveis com baixa emissão de carbono, consolidando a agropecuária nacional alicerçada sobre sistemas sustentáveis, resilientes e produtivos, como soluções de adaptação e mitigação embasadas em ciência.
Apesar de não haver uma menção expressa à agricultura regenerativa, alguns objetivos específicos do Plano ABC+ (2020-2030) tratam de estratégias relativas à “agricultura regenerativa”, tais como os objetivos de “estímulo à adoção e manutenção de sistemas agropecuários conservacionistas e sustentáveis de produção, com aumento da produtividade e renda, da resiliência e do controle das emissões de GEE” e de “estimular e apoiar a pesquisa aplicada para o desenvolvimento ou aprimoramento de Sistemas, Práticas, Produtos e Processos de Produção Sustentáveis com foco no aumento da resiliência, da produtividade e renda, e no controle das emissões de GEE”.

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Essas práticas têm seu fundamento de validade nas normas constitucionais de proteção ambiental e de desenvolvimento sustentável, estabelecidas pelos artigos 170, inciso VI, e 225 da Constituição da República, além de estarem alinhadas com os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris e na Agenda 2030 (ODS 2, 12, 13 e 15).
Atualmente, as políticas de incentivo específico à agricultura regenerativa ainda são escassas e dispersas, mas vêm ganhando espaço tanto no Brasil quanto no exterior, especialmente diante das metas de descarbonização, conservação da biodiversidade e uso sustentável do solo.
Além do Plano ABC+ (2020-2030), alguns dos principais instrumentos e iniciativas, com foco no cenário nacional e com algumas referências internacionais são:
Política Nacional de Incentivo à Agricultura e Pecuária de Precisão (Lei nº 14.475/2022): sancionada em dezembro de 2022, a Política Nacional de Incentivo à Agricultura e Pecuária de Precisão é o conjunto de ferramentas e tecnologias aplicadas em um sistema de gerenciamento agropecuário baseado na variabilidade espacial ou individual e temporal que objetiva a elevação da eficiência na aplicação de recursos e insumos de produção, de forma a diminuir o desperdício e aumentar a produtividade e a competitividade, bem como garantir a sustentabilidade ambiental, social e econômica.
Há também a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (“PSA”) (Lei nº 14.119/2021), que prevê remuneração por conservação, recuperação ou melhoria dos ecossistemas, sendo compatível com práticas regenerativas.
A implementação de medidas como o PSA e de incentivo à agricultura regenerativa nos contextos locais é de extrema relevância, pois por meio do estímulo à adoção de práticas sustentáveis e de conservação e recuperação do meio ambiente, os cidadãos se sentirão incentivados a alterar as práticas ambientais.
O Programa de Incentivo à Agricultura Sustentável (PL 4.417/2023), aprovado na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, tem foco em pequenos produtores e prevê apoio técnico e financeiro para práticas sustentáveis, com potencial de incluir ações regenerativas.
Além do mercado de carbono, há também instrumentos econômicos e financeiros disponíveis para produtores que se utilizam de práticas sustentáveis, tais como o PRONAF Agroecologia e o próprio Plano ABC, por meio de financiamentos com condições diferenciadas.
Além disso, é possível e de grande importância a contribuição dos entes federativos com o estabelecimento de isenções e incentivos por meio da redução do ITR, isenção de ICMS para produtos sustentáveis e descontos em taxas ambientais, por exemplo. Além disso, a descentralização de políticas públicas permite a criação de zonas especiais de agricultura sustentável e consórcios regionais para fomentar práticas regenerativas.
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Diversos entes federativos têm regulamentado suas próprias políticas de PSA, como é o caso de Minas Gerais (Bolsa Verde), Pará, Espírito Santo e São Paulo (Programa Refloresta).
No âmbito internacional, o Fundo Verde para o Clima (GCF), o Banco Mundial, o BID e a GIZ (Alemanha) já financiam projetos que incorporam práticas regenerativas.
A agricultura regenerativa começa a ganhar espaço no debate político, sendo necessário criar uma agenda nacional de incentivo à regeneração, que vá além da conservação e que contemple pesquisa, assistência técnica e remuneração dos serviços ambientais.
A agricultura regenerativa representa uma evolução do paradigma agroambiental brasileiro. Embora ainda careça de uma definição legal própria e específica, ela é compatível com os instrumentos jurídicos e institucionais existentes e pode ser fortemente impulsionada por políticas públicas, instrumentos de mercado, inovação tecnológica e engajamento multissetorial.
Recomenda-se que produtores, gestores públicos e o setor privado articulem ações coordenadas para promover a agricultura regenerativa como eixo estratégico de desenvolvimento rural sustentável, mitigação das mudanças climáticas e valorização da biodiversidade.
*Gabriel Amaral Rocha Ferreira é advogado do escritório Renata Franco Advogados, especializado em Direito Ambiental
As ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva de seu autor e não representam, necessariamente, o posicionamento editorial da Globo Rural.