
O fechamento de empresas do setor florestal pode estar entre as consequências do tarifaço americano de 50% sobre produtos brasileiros a partir de 1º de agosto. O alerta é da Associação Paranaense de Empresas de Base Florestal (Apre Florestas). “Se a cobrança da tarifa nesse percentual se concretizar, inviabilizará a atividade para parte das empresas. O setor terá um impacto muito negativo e o fechamento delas não está fora da lista”, ressalta Fábio Brun, presidente da Apre, em entrevista à Globo Rural.
Leia também
Brasil tem opção de retaliar com quebra de patentes
Agro brasileiro vê impacto de US$ 5,8 bilhões com tarifaço dos EUA
Empresas de café dos EUA pedem isenção de tarifa sobre o produto
Em manifesto público divulgado na semana passada, a Apre pediu atuação urgente do governo federal para reverter a decisão dos Estados Unidos. Sem isso, destaca o documento, as empresas serão forçadas a rever estratégias em tempo recorde, com risco de fechamento de unidades e demissões em massa.
Principal produto agropecuário do Estado na lista de exportação para os Estados Unidos, o setor florestal já relata contratos cancelados, embarques suspensos e contêineres retidos em portos. “A estimativa é de que os produtos do Paraná que estão atualmente em contêineres nos portos para embarque ou já a caminho dos Estados Unidos, com previsão de chegada após o dia 1º de agosto, girem em torno de US$ 70 milhões. Se a medida se manter, acreditamos que a receita líquida proveniente dessa remessa será praticamente anulada”, prevê Brun.
A Apre ainda não tem os cálculos das perdas para o setor com a nova tarifa, mas o presidente ressalta que várias empresas exportam 100% da produção para o país americano, enquanto para outras os Estados Unidos não são o único destino, mas representam o principal mercado.
Indústrias paranaenses que têm o mercado norte-americano como principal destino das exportações já anunciaram medidas que afetam diretamente trabalhadores do setor. A Sudati, empresa do setor de compensados e MDF, anunciou no último dia 24 a demissão de 100 colaboradores nas unidades de Ventania e Telêmaco Borba, na região dos Campos Gerais, devido à insegurança gerada pela tarifa de 50%.
Segundo a empresa, “o atual cenário econômico tem exigido das indústrias maior eficiência e resiliência a uma demanda mais retraída até a definição de início de vigência ou negociação de tais tarifas. Após cuidadosa análise, a medida se mostrou necessária para garantir o equilíbrio financeiro e a sustentabilidade da operação, sem comprometer os compromissos com clientes, fornecedores e parceiros”.
A empresa tem produção anual de aproximadamente 600 mil m³ e, até então, em torno de 2,8 mil colaboradores. Com cinco plantas na unidade de negócios de compensados, está presente no Paraná, incluindo também as cidades de Palmas e Ibaiti, e em Santa Catarina, em Otacílio Costa, com produção de MDF. A princípio, a empresa informou que os trabalhadores das outras cidades não devem ser afetados.
A BrasPine, que atua na produção de molduras para exportação, concedeu férias coletivas para 1,5 mil funcionários, equivalente a 60% do quadro total. A medida atinge as unidades de Jaguariaíva e Telêmaco Borba. Segundo a empresa, após o anúncio da taxação, “uma quantidade significativa de pedidos” foi suspensa ou adiada.
Na Millpar, de Guarapuava – segunda maior empresa do setor no Brasil e terceira na América Latina –, 640 funcionários ligados à manufatura de produtos exportados foram incluídos nas férias coletivas, o que representa 58% do total. Além disso, houve redução nas operações, visando ajustar a produção à nova dinâmica temporária do mercado internacional.
O presidente da Apre adverte que as férias coletivas e reavaliações de contrato são as alternativas que estão na mesa das empresas do setor nesse momento. Ele diz que a associação tem conhecimento de empresas que também optaram por essa alternativa sem tornar pública a decisão.
Os Estados Unidos são o maior importador de serrado de pinus do Brasil e o principal destino de compensado de pinus do Paraná
Carolina Mainardes/Globo Rural
Destinos dos embarques
Redirecionar a produção florestal paranaense para outros mercados não está sendo considerada uma medida viável no curto ou médio prazo. A associação lembra que o setor está atrelado ao perfil de consumo dos Estados Unidos, onde a madeira brasileira é utilizada tanto na movelaria quanto na geração de energia.
“No caso da exportação, mudar o destino não é uma decisão que se toma rapidamente. É um processo que pode levar meses, é necessário pesquisar e avaliar mercados”, comenta Brun. Ele também considera que, nessa situação, o empresário brasileiro apresenta uma desvantagem na hora de negociar com novos clientes: “os outros países entenderão que não foi uma escolha, mas sim uma necessidade. Isso nos coloca numa posição desfavorável”.
No primeiro semestre de 2025, a exportação de produtos florestais paranaenses para os Estados Unidos movimentaram US$ 331 milhões, valor semelhante ao mesmo período do ano passado, com US$ 330 milhões. Segundo a Apre, a dependência do Paraná do mercado americano engloba produtos como madeira serrada, compensados, painéis, molduras, portas e móveis.
Os Estados Unidos são o maior importador de serrado de pinus do Brasil (37,15%) e o segundo maior importador do Paraná do mesmo produto (30,79%). Além disso, é o principal destino de compensado de pinus do Paraná e de painéis reconstituídos de madeira, portas, molduras e móveis do Brasil.
Antes do anúncio do tarifaço, o setor florestal vinha trabalhando desde abril deste ano com tarifa de 10% para exportação aos EUA. Brun lembra ainda que, desde então, a Seção 232 das leis comerciais do país americano autoriza o presidente a impor tarifas ou outras restrições às importações se elas forem consideradas uma ameaça à segurança nacional.
Soluções
Apesar da proximidade com a data de validade do tarifaço, o presidente da Apre ainda espera uma solução diplomática para evitar ou postergar a decisão do governo americano. “A cada dia que passa sem movimento algum para renegociação, fica mais evidente que a nova tarifa irá entrar em vigor. Mas ainda temos esperança”, frisa.
No manifesto, a Apre Florestas solicita que o governo federal atue junto aos EUA na tentativa de suspender ou, ao menos, prorrogar a medida tarifária por, no mínimo, 90 dias, permitindo ajustes contratuais e logísticos. Porém, a entidade defende que o Brasil evite retaliações tarifárias, o que poderia prejudicar ainda mais o diálogo com o governo norte-americano.
“O setor florestal está fazendo sua parte, fornecendo dados, cenários e impactos. Mas as negociações ultrapassam a atuação setorial e exigem uma ação governamental com urgência e prioridade”, analisa o presidente da Apre. E acrescenta que o setor vive uma corrida contra o tempo para manter sua competitividade e evitar perdas irreparáveis em empregos e faturamento.
Perdas para o agro
Com início previsto para 1º de agosto, a aplicação de uma tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos está tirando o sono do agronegócio do Paraná. Agroindústrias e lideranças rurais do Estado temem um “terremoto” econômico, com impacto direto em setores estratégicos como madeira, café, piscicultura, laranja e até carne bovina.
Em 2024, os EUA foram o segundo principal parceiro comercial do Paraná, com importações de produtos agropecuários que somaram US$ 1,58 bilhão. Só nos dois primeiros meses de 2025, o país respondeu por US$ 214 milhões em exportações paranaenses, configurando-se como terceiro maior destino dos embarques. Segundo a Federação da Agricultura do Estado do Paraná (FAEP), os valores totais das exportações estão em xeque, o que, num cenário mais drástico, pode gerar impacto bilionário.
*Com contribuição de Isadora Camargo, de São Paulo