
O Conselho Nacional do Café (CNC) manifestou-se nesta sexta-feira (25) contra a possibilidade de compartilhamento do material genético dos Bancos Ativos de Germoplasma (BAGs) do Brasil com outros países, no âmbito do Protocolo de Nagoya, reacendendo o tema. Em carta assinada pelo presidente da entidade, Silas Brasileiro, o CNC classificou o tema como “de extrema relevância para a soberania científica, econômica e ambiental do país” e alertou para riscos à competitividade e à sustentabilidade da cadeia produtiva do café.
Initial plugin text
Na avaliação do CNC, a tentativa de incluir a cafeicultura brasileira no protocolo internacional pode abrir caminho para a transferência irrestrita de pesquisas, tecnologias e conhecimentos estratégicos a países concorrentes. “A inclusão do café neste protocolo representa não apenas o risco de se perder a soberania sobre o nosso conhecimento científico acumulado ao longo de décadas, mas também a possibilidade de comprometer toda a cadeia produtiva nacional”, diz a carta.
No início de julho, o CNC já havia criticado a inclusão do café brasileiro no protocolo, que foi assinado pelo Brasil em 2021, à Embrapa.
O Protocolo de Nagoya sobre Acesso a Recursos Genéticos e Repartição Justa e Equitativa dos Benefícios é um acordo internacional, vinculado à Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), adotado em 2010, no Japão.
O documento estabelece regras para garantir que os países e comunidades que detêm recursos genéticos — como sementes, plantas, microrganismos ou material genético animal — sejam remunerados caso esses recursos sejam utilizados em pesquisas, desenvolvimento de novos produtos ou tecnologias.
O objetivo principal é combater a biopirataria. O Brasil é signatário do Protocolo de Nagoya e possui legislação nacional que regulamenta o acesso a recursos genéticos e o conhecimento tradicional associado. Contudo, há divergências internas sobre a extensão da aplicação do protocolo em setores estratégicos, como a cafeicultura, onde entidades como o CNC temem a perda de controle sobre tecnologias desenvolvidas com recursos públicos e com anos de pesquisa.
Silas Brasileiro argumenta que transferir esses conhecimentos é “tirar a condição do país continuar produzindo café”.
De acordo com a entidade, o setor responde por cerca de 8,4 milhões de empregos, está presente em quase dois mil municípios e movimentou R$ 79,59 bilhões em 2024. Além disso, o café é o quarto produto do agronegócio brasileiro na balança comercial, destaca o Conselho.
Segundo Brasileiro, manter o Brasil fora do protocolo é assegurar um trabalho de evolução da cafeicultura feito nas últimas décadas, priorizando a qualidade e o cumprimento de exigências ambientais que garantiram a competitividade do café brasileiro nos mercados internacionais.
O presidente da entidade reforça que outros países produtores não enfrentam os mesmos níveis de exigência ambiental e trabalhista que o Brasil, o que gera um cenário de competição desigual. “Ao invés de valorizar o modelo produtivo responsável e sustentável do Brasil, forças externas — muitas vezes impulsionadas por organizações com interesses comerciais — buscam impor padrões que fragilizam nosso setor”, critica a entidade.
Por isso, o CNC decidiu não responder formalmente, por ora, à pesquisa conduzida pelo Secretariado do Tratado Internacional e pelo CIRAD sobre o tema. Segundo a carta, “o tema exige uma abordagem estratégica e coordenada, considerando os riscos associados à exposição do banco de germoplasma do café e dos resultados de pesquisas nacionais”.
A entidade reforça que está disposta a dialogar com o Itamaraty e outras instituições do governo federal para chegar a um acordo “coeso”.
“A vantagem competitiva do Brasil reside na pesquisa, ciência e conhecimento, com a coordenação reconhecida em todo o mundo pela Embrapa. Trata-se de um patrimônio nacional que não pode ser transferido de forma impensada ou subserviente”, conclui a carta.