
Governo suspeita de fraudes e espera que mudança na regra economize R$ 3,2 bi até 2026 A despesa com seguro-defeso – modalidade do seguro-desemprego pago a pescadores artesanais no período em que a atividade é proibida – disparou neste ano, em meio a suspeitas de fraudes. A alta acendeu o alerta no governo, que incluiu na medida provisória (MP) alternativa ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) mudanças nessa rubrica para tentar controlar o gasto. A expectativa é de uma economia de R$ 1,57 bilhão neste ano e de R$ 1,7 bilhão em 2026, segundo o Ministério da Fazenda.
De janeiro a abril deste ano, o governo gastou R$ 4 bilhões com o pagamento de benefícios do seguro-defeso, segundo dados do Tesouro Nacional. O valor é 57% maior do que os R$ 2,6 bilhões gastos no mesmo período do ano passado, já considerando os dados atualizados pela inflação. Ainda de acordo com o Tesouro, o gasto com o programa está em R$ 6,1 bilhões considerando o período de 12 meses encerrado em abril. No ano de 2024, o programa teve um custo de R$ 4,4 bilhões.
Fábio Serrano, economista do BTG Pactual, afirma que são três fatores que explicam essa alta em 2025. O primeiro é o efeito preço, já que o benefício é igual a um salário mínimo, que cresce acima da inflação. O segundo tem relação a efeitos extraordinários, como o auxílio pago a pescadores atingidos pela seca do Norte e do Nordeste e a fila de requerimentos, que ficou represada no último trimestre de 2024, devido à implementação do cadastro biométrico. “Ao longo desse período, nem todos os benefícios foram emitidos por causa dessa mudança de cadastro, acumulando um estoque que começou a ser regularizado neste ano.”
O terceiro fator, diz Serrano, pode estar ligado a irregularidades, já que o número de beneficiários do programa está acima do público-alvo. “Mesmo quando você limpa esses eventos extraordinários, há um crescimento da quantidade de beneficiários, o que leva a entender que pode ter algo acontecendo, talvez regras frouxas de cadastro”, completa.
Seguro defeso
Valor
Medida provisória
Com a MP 1.303, editada na semana passada, o governo tenta controlar o crescimento do seguro-defeso de duas maneiras. A primeira é sujeitá-lo à dotação orçamentária. Para o ano de 2025, valerá a dotação na data de publicação da MP, o que, segundo técnicos do governo, era de R$ 6,5 bilhões. Para 2026 em diante, valerá o valor que constar na Lei Orçamentária Anual.
Em tese, o governo terá que parar o programa – inclusive novas concessões – caso o limite seja atingido. Especialistas têm dúvidas se essa trava funcionará, já que teria custo social alto para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Outra dúvida é se o seguro-defeso pode ganhar esse caráter de despesa discricionária, enquanto o seguro-desemprego, pago a celetistas, continua como despesa obrigatória sem controle de fluxo.
Outra medida da MP para tentar reduzir as concessões é a obrigatoriedade de homologação do Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP) pelo município ou distrito em que o pescador mora. É uma forma de garantir a dupla checagem do cadastro, a fim de evitar fraudes. Essa medida enfrenta resistência de confederações de pescadores, que patrocinaram uma emenda apresentada pelo deputado Silas Câmara (Republicanos-AM) para excluir da MP a obrigatoriedade de “double check”.
Número de beneficiários do programa está acima do público-alvo”
Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter, observa que a maior parte dos pagamentos do seguro-defeso em 2025 já aconteceu, uma vez que o período de defeso (pesca proibida) tende a se concentrar entre novembro até os primeiros meses do ano. Por isso, ela avalia que a MP não deve impactar o crescimento da despesa neste ano. Serrano, do BTG Pactual, também avalia que a economia de R$ 1,5 bilhão projetada pela Fazenda parece superestimada.
Ainda assim, Vitória avalia que a medida é “importante para controlar o crescimento atípico do programa que aponta irregularidade, considerando que o número de trabalhadores na atividade de pesca artesanal, para a qual se destina o benefício, não tem variação expressiva, como pode ser monitorado pelos dados da Pnad”.
Atualmente, 1,2 milhão de pescadores recebem seguro-defeso. O governo suspeita que parte desse contingente pode ser reflexo de cadastros fraudulentos, já que as regras anteriores não exigiam biometria nem a checagem do município. A exigência de biometria entrou em vigor em setembro do ano passado, mas passou a ser aplicada somente neste ano, devido a dificuldades operacionais do INSS.
Procurados para explicar o aumento das concessões, INSS e os Ministérios da Pesca e do Trabalho não responderam.