Cidade paulista busca resgatar relevância na produção de uvas A cidade de São Roque, no interior de São Paulo, tenta resgatar o protagonismo que tinha na produção de uvas e vinhos entre as décadas de 1960 e 1980. Um dos caminhos para recuperar esse espaço é aumentar a produção de vinhos finos, uma demanda crescente diante do novo perfil dos turistas que visitam a cidade.
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De olho nessa meta, 18 viticultores locais se reuniram numa instituição , o Sindicato da Indústria do Vinho de São Roque (Sindusvinho) e criaram o Roteiro do Vinho. Agora, trabalham para lançar um novo formato do que já foi a famosa Festa do Vinho da cidade.
“Recebemos um milhão de turistas ao ano, um número excelente. Mas a característica desses turistas está mudando. Antes eram admiradores, sem compromisso. Hoje, em grande parte, são entusiastas, com certo repertório sobre vinho, e até um público maduro, que procura uma singularidade a cada rótulo”, diz Alex Moraes, presidente do Sindusvinho e proprietário da vinícola XV de Novembro.
A recente criação da vinícola Aura Astral, um braço da XV de Novembro, é um exemplo desse movimento. Hoje, a XV de Novembro produz cerca de 900 mil garrafas por ano, sendo 85% em vinhos de mesa e 15% em finos, mas pretende mudar essa proporção, e investiu no novo empreendimento para isso.
A Aura Astral se dedica exclusivamente à criação de vinhos finos autorais, para pequenos lotes exclusivos (às vezes sob demanda), sob a tutela de Alex Moraes e da doutora em enologia e professora do Instituto Federal de São Roque, Maritê Dal’Osto.
Os vinhos são produzidos com uvas cultivadas nos quase 30 hectares da propriedade ou trazidas de Flores da Cunha (RS). Das variedades de verão, as utilizadas são Bordô, IAC Ribas, Niagara Branca e Lavarinho; das uvas de inverno, as usadas são Cabernet franc, Malbec, Syrah e Tempranillo.
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“Nosso objetivo é criar vinhos que sejam capazes de unir tradição e inovação, para promover essa transição junto aos consumidores. Entendemos que é um trabalho de longo prazo construir a imagem de São Roque como produtora de vinhos finos, mas a receptividade tem avançado, à medida que conquistamos prêmios importantes e os turistas compartilham experiências positivas vividas aqui”, afirma Maritê Dal’Osto.
O rótulo Papílio, um Chardonnay Gran Reserva, por exemplo, conquistou medalha de ouro na 22 edição do Concurso de Vinhos e Destilados do Brasil. Já o Aura Astral Tannat Rosé recebeu medalha de prata no 20 Concurso de Vinhos e Destilados do Brasil.
Também em São Roque, a vinícola Góes, uma das maiores do Estado, produz 7 milhões de garrafas ao ano. Hoje, redesenha seus contornos sob o comando de Cláudio Góes e Fábio Góes, que são primos e a quarta geração da família na direção da vinícola. Enquanto Cláudio cuida da gestão, Fábio, que é enólogo, dedica-se à criação de novos rótulos.
Mas, para isso, eles primeiro trouxeram novas práticas de cultivo ao parreiral de 40 hectares da propriedade, incluindo a dupla poda e campos experimentais, a fim de identificar as variedades de uva que mais se adaptam ao terroir e clima de São Roque. São mais de dez variedades cultivadas, incluindo Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Lorena, Bordô, Isabel, Moscato, Chardonnay, Syrah, Carménère, Malbec e Tannat.
O rótulo Philophia foi amplamente premiado. Produzido a partir de uvas Cabernet Franc cultivadas em São Roque, com descanso de 12 meses em barricas novas de carvalho francês, foi ouro no Brazil Wine Challenge, Bronze no Decanter World Wine Awards e Bronze no IWC Londres. “O reconhecimento nos prêmios dá confiança aos turistas, que são nosso primeiro público, a investirem em um rótulo local de preço mais elevado, que ainda é novo para eles”, diz Fábio Goes.
Na sua empresa, o enoturismo também vem crescendo, com atividades distribuídas nas três propriedades da vinícola.
A atividade na vinícola Góes representa hoje em torno de 15% do faturamento da empresa, e os proprietários estimam que possa crescer 5% neste ano.
Ao longo dos 16 quilômetros do Roteiro do Vinho de São Roque as opções de enoturismo são diversificadas. No total, são 57 empreendimentos, entre vinícolas, restaurantes, cafés e lojas.
Para os que buscam uma experiência personalizada, a vinícola Casa da Árvore oferece a possibilidade de o visitante produzir o seu próprio espumante. Além disso, é possível experimentar pratos típicos da gastronomia da Eslovênia, já que a vinícola pertence a uma família originária daquele país.
A direção das atividades fica por conta do proprietário Maximiliano Slivnik, enquanto a criação dos rótulos e as harmonizações são feitas pelo enólogo Tiago Duarte. “Os vinhos são criações novas, a partir de uvas colhidas aqui e combinações autorais”, explica Slivnik.
Outra pequena vinícola que tem atraído turistas é a Bella Quinta, que fica dentro do complexo da Góes e prioriza toques autorais. Gustavo Borges, enólogo e proprietário da casa, usa leveduras selvagens do próprio vinhedo em suas criações, que levam tanto uvas da cidade quanto algumas trazidas do Sul do país. Os microlotes produzidos são compostos por 600 garrafas, em média.
Na vinícola Bella Quinta há uma curiosidade: a degustação conta com “harmonização musical”. Borges estudou várias possibilidades e chegou a composições com timbres que, segundo ele, são mais apropriados tanto para a degustação quanto para evolução dos vinhos durante seu descanso.
São três os rótulos que descansam duas horas por dia ao som de melodias e que são degustados com as mesmas canções. Na lista, há músicas de Almir Sater e da dupla Sá e Guarabyra.
A repórter viajou a convite do SEBRAE e do Consevitis