
Exportações aquecidas, diversificação e safra de grãos “cheia”. Esses foram os fatores que garantiram lucro à maioria das empresas do agronegócio que divulgaram balanços do segundo trimestre deste ano. Além disso, eficiência operacional e estratégias de hedge ajudaram a suavizar os impactos da volatilidade de preços agrícolas e do câmbio, segundo analistas.
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Olhando para o futuro, a avaliação é de que o tarifaço dos EUA tende a influenciar os próximos resultados trimestrais de diferentes formas. Os frigoríficos de carne bovina podem limitar os danos com a ajuda de suas operações em outros países; as usinas que vendem açúcar orgânico aos EUA serão as mais prejudicadas; enquanto as empresas de grãos podem ser beneficiadas por eventual incremento da demanda da China por soja.
Levantamento do Valor Data mostra que, entre as 24 companhias analisadas, somente quatro tiveram prejuízo entre abril e junho. As empresas com resultado líquido negativo foram Heringer, Vittia, Jalles Machado e Raízen. Todas as demais ficaram no positivo e apenas cinco lucraram menos do que no mesmo período de 2024.
As maiores altas foram da FS, que saiu de prejuízo de R$ 40,3 milhões entre abril e junho de 2024, para lucro de R$ 256 milhões; e da Agribrasil, cujo lucro subiu 715% para R$ 16 milhões, apoiado pela safra recorde de soja e milho.
“O setor se beneficia da posição estrutural do Brasil como player competitivo global em grãos, carnes e açúcar, o que sustenta demanda mesmo em cenários adversos. Esses fatores explicam por que poucas companhias reportaram prejuízo, reforçando a resiliência do agro brasileiro”, diz Régis Chinchila, analista de Research da Terra Investimentos.
Para ele, as exportações fortes para mercados estratégicos como China e EUA foram destaque, e a diversificação de portfólio ajudou a fazer a diferença nos resultados, caso do etanol de milho para a São Martinho e do algodão para a SLC.
A análise do Valor Data indica que a São Martinho foi uma das poucas usinas que tiveram lucro de abril a junho, mesmo que abaixo de igual período de 2024, com o setor prejudicado pela quebra na safra de cana-de-açúcar. O resultado líquido caiu 40,9%, mas ficou positivo em R$ 62,8 milhões.
No caso da SLC Agrícola, o lucro ficou em R$ 139,8 milhões, queda de 56,5% na comparação com o mesmo intervalo de 2024, pressionado por efeitos não recorrentes, enquanto o lucro ajustado antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) cresceu 115,6%, com recorde nas vendas de commodities.
Para Guilherme Palhares, analista do Santander, o mercado de bovinos no Brasil foi um dos destaques das empresas do segmento de carnes, ao mostrar força nas exportações, mesmo diante de altas nos preços do gado e uma tarifa adicional de 10% nos embarques aos americanos, desde abril.
“No frango, começamos a ver os impactos da gripe aviária. Houve embargos devido a um caso da doença em uma granja comercial do Brasil (em maio), e as exportações começaram a retomar ainda no segundo trimestre. Ficam em aberto China e Europa”, diz Palhares.
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Ele observa, porém, que a queda das despesas com os grãos usados na ração ajudou a amenizar o efeito da gripe aviária nos resultados das empresas no trimestre.
A BRF fechou o período com um lucro líquido de R$ 735 milhões, recuo de 32,8% em relação ao mesmo intervalo de 2024.
A Seara, operação brasileira de frango e suínos da JBS, viu um impacto de 2,5% sobre a receita líquida, que caiu para US$ 2,16 bilhões, porém seu Ebitda ajustado aumentou 1,2% para US$ 391,8 milhões. Ao todo, e também apoiada por sua controlada Pilgrim’s Pride que produz frango nos EUA, a JBS lucrou US$ 528,1 milhões, alta de 60,6% no comparativo anual.
Na visão de Renata Cabral, analista do Citi, essa conjuntura favorável ao frango deve persistir no terceiro trimestre. “Para a JBS, esperamos resultados resilientes com destaque para negócio de frango — tanto Pilgrim’s quanto Seara — porém, ainda com alguma pressão negativa de gripe aviária”, diz. Já o segmento de bovinos nos EUA deve ter melhora significativa apenas em 2027, segundo ela.
A tarifa de 50% dos EUA a produtos do Brasil, que levou o imposto sobre a carne bovina brasileira a 76,4%, naturalmente traz pressões para o setor, como mudanças na rotas de produção e exportação.
“Entretanto, no caso específico dos players listados — como JBS e Minerva — o fato de possuírem uma plataforma internacional lhes dá flexibilidade e a oportunidade de mitigar os efeitos negativos e, por vezes, conseguir efeito positivo em seus resultados”, acrescenta Renata Cabral.
Mas a queda nos preços da carne bovina no mercado doméstico não está descartada, observa o estrategista-chefe da RB investimentos, Gustavo Cruz. Isso porque nem todo o volume não exportado aos EUA será redirecionado a outros mercados e há dúvidas sobre quanto pode ser absorvido pelo mercado brasileiro.
No segmento de cana, o efeito do tarifaço é mais deletério. A Jalles Machado estima que deixará de ganhar entre R$ 20 milhões e R$ 25 milhões com a perda de competitividade de seu açúcar orgânico que é vendido aos EUA. “Ainda vemos uma temporada de moagem (de cana) desafiadora e com preços de açúcar mais fracos, devido à expectativa de um maior volume de produção global”, acrescenta Gabriel Barra, analista do Citi.
Do lado das distribuidoras de insumos e produtoras de grãos, Barra prevê melhora nos resultados, com um possível plantio da soja precoce, devido ao clima mais regular. Haverá também a venda de algodão e milho segunda safra.
Igor Guedes, analista da Genial Investimentos, ressalta ainda que as empresas de grãos tendem a ser beneficiadas pela guerra tarifária entre EUA e China, já que a soja brasileira pode ocupar espaço da americana no mercado chinês.