O produtor Geomar Joslin, de Araucária, no Paraná, está preparando a área de aproximadamente 3 mil m² na faixa de domínio da rodovia para o plantio de milho. Ele foi um dos primeiros a receber autorização da Via Araucária, concessionária do Grupo Pátria responsável pelo Lote 1 de rodovias do Estado, para o cultivo na área que fica às margens da BR-476, conhecida como Rodovia do Xisto.
Leia também
Estradas vicinais melhores poderiam reduzir custos do agro em R$ 6,4 bilhões por ano
O trajeto das barcaças de grãos que tira 150 caminhões das estradas
Para Joslin, que cultiva 55,2 hectares de lavoura na propriedade e em um terreno arrendado, a extensão da plantação por meio da faixa de domínio – área localizada às margens das estradas conforme definição em projetos e leis – é uma contribuição sobretudo para pequenos agricultores com propriedades próximas a centros urbanos.
“Aqui em Araucária, com o crescimento da industrialização, o espaço para plantar é mais restrito. Além de ampliar a área plantada, a permissão favorece o uso do maquinário na lavoura, com mais espaço para manobrar”, avalia.
Ele deu início ao processo de regularização para plantação na faixa de domínio em setembro do ano passado e, de lá para cá, já plantou batata e feijão na área. No inverno, cultivou plantas de cobertura, com um mix de aveia e centeio. No caso do milho, só será possível o cultivo porque se trata de um trecho em linha reta e as plantas não irão atrapalhar a visibilidade dos motoristas.
O projeto da Via Araucária que regulariza o plantio agrícola em faixa de domínio – área de propriedade pública, administrada pela concessionária, que inclui a rodovia e as margens – está sendo desenvolvido em caráter experimental. A iniciativa é autorizada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) por meio do Projeto de Interesse de Terceiros, o PIT, que regulamenta o uso de terrenos à beira da rodovia para a agricultura. A Via Araucária foi a primeira concessionária do país a obter autorização da ANTT para iniciar o projeto.
Segundo a concessionária, foram mapeadas mais de 220 áreas que podem ser utilizadas para essa finalidade nos 473 quilômetros de rodovias que administra. Seis áreas já foram aprovadas pela ANTT e quase 40 processos estão em andamento. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) reforça que o plantio deve considerar questões de segurança, como a visibilidade na rodovia. Por isso, há limite de altura de algumas culturas em determinados trechos.
Plantio em faixa de domínio de rodovia no Paraná
Via Araucária/Divulgação
Autorização
O processo para os interessados em ampliar os limites da propriedade e ganhar mais terra para o cultivo consiste na entrega de documentos pessoais, além da certidão de matrícula do imóvel, planta topográfica, um requerimento do proprietário solicitando a regularização da área, a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) ou documento equivalente. Também é anexada à documentação uma carta da concessionária, que após análise da área por uma equipe técnica, confirma às autoridades competentes, como a ANTT, a liberação para o uso respeitando os limites previstos. Quando o processo está concluído, o local ganha uma placa da concessionária, indicando que o terreno está regularizado para uso agrícola.
Com o intuito de auxiliar na regularização dessas áreas, o Sistema Faep abriu um canal de diálogo com as empresas concessionárias logo após assumirem a gestão das rodovias, em 2024. “Com o início das novas concessões de estradas, recebemos diversas reclamações de produtores que utilizavam essa faixa para atividade agropecuária, mas nunca haviam regularizado a situação. Não se trata de má-fé, apenas desconhecimento. Por isso, estamos levando informações e assessorando os produtores para que possam regularizar a situação”, comenta o presidente interino do Sistema Faep, Ágide Eduardo Meneguette.
O presidente do Sindicato Rural de Irati, Mesaque Kecot Veres, lembra que há muito tempo os produtores vinham cultivando na faixa de domínio e, com o início dos contratos de concessão, foram instaladas cercas, o que prejudicou o acesso e o trânsito de máquinas. “As reuniões com as concessionárias foram importantes, pois os produtores têm conseguido a autorização para poder plantar. Isso é positivo”, acredita.
Nesse âmbito, Luiz Eliezer, técnico do Departamento Técnico e Econômico do Sistema Faep, adverte: “o que não é recomendado é que o produtor tome iniciativas por conta própria, como arrancar cercas das concessionárias. Nesses casos existem punições previstas”.
Contrapartida
O projeto envolve como contrapartidas por parte dos produtores rurais que utilizam essas áreas a manutenção da limpeza do terreno em frente à rodovia e a doação financeira anual para uma instituição social. “É uma via de mão dupla, pois favorece os produtores e a concessionária, que garante que os terrenos fiquem limpos, além do viés social”, completa o produtor Geomar Joslin.
Felipe Dias de Souza, gerente de Engenharia da Via Araucária, destaca que além dos benefícios para o produtor rural, que amplia a área produtiva e a geração de renda, o projeto também promoverá a redução das emissões de CO2.
“Sem o plantio nesses trechos, a concessionária tem que fazer limpeza e roçadas, o que inclui o transporte de equipe e de maquinários. Sem isso, teremos menos emissões”, explica. Souza ainda pontua a promoção de segurança viária, de proteção contra incêndios e de preservação ambiental.
Ainda de acordo com o gerente, o objetivo é oferecer aos interessados opções viáveis para a realização do plantio. “Não há obrigatoriedade de que o plantio ocorra em frente à propriedade do interessado, o que amplia as possibilidades de adesão ao programa”, completa.
Conforme levantamento do Sistema Faep, outras concessionárias que atuam no Paraná, como a CCR PRVias e a EPR Iguaçu também disponibilizam orientações sobre a utilização das faixas de domínio. A concessionária EPR Litoral Pioneiro está identificando os produtores lindeiros para orientar o plantio na área, inicialmente na região de Cambará, no Norte Pioneiro. Os lotes 4 e 5 das rodovias que cortam o Paraná deverão ser leiloadas neste mês.
Em rodovias sem concessão, a faixa de domínio é um bem público que permite a utilização para fins agrícolas mediante a autorização do poder público. A reportagem solicitou à ANTT informações sobre o cenário do plantio em faixas de domínio no restante do país, bem como sobre a fiscalização, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.