Associação investe R$ 500 mil em campanhas para atrair o consumidor brasileiro Marcos Boschini é produtor de batata há 33 anos em Goiás. Leilson Aparecido da Silva, 36 anos, começou a trabalhar aos 13 anos ajudando o pai no cultivo da batata em Minas Gerais. Leandro Belleboni é produtor com o pai desde 1974 no Rio Grande do Sul. O ex-bancário Osmar Kloster Oliveira planta batata no Paraná desde 1992.
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Os quatro agricultores iniciaram com plantios pequenos e hoje cultivam pelo menos 300 hectares de batata, produto que é o carro-chefe de suas lavouras. Produzida atualmente por cerca de 5.000 agricultores em todo o país, com destaque para Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Goiás e Bahia, a batata tem uma área plantada estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 120 mil hectares para uma produção de 4 milhões de toneladas por ano.
Boschini, Silva, Belleboni e Oliveira têm em comum a opção pelo cultivo exclusivo de batata para consumo in natura. Eles se juntaram a outros produtores na recém-criada Associação Brasileira da Batata In Natura (Abbin) com o objetivo de aumentar o consumo no país e desmistificar a crença de que batata é um alimento que engorda. A cultura também é representada pela Associação Brasileira da Batata (Abba), que engloba toda a cadeia.
Lincoln Ricardo Carrenho da Silva, diretor da Abbin, diz que o consumo de batata no Brasil, que já foi de 13 kg ou 14 kg per capita, caiu nos últimos anos para 11 kg _número oito vezes menor do que o consumo anual de argentinos e europeus. Na análise de calorias, Carrenho cita que, segundo a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos da Unicamp, 100 g de batata cozida sem óleo, além de ser boa fonte de potássio, tem 86 kcal ante 130 kcal da mesma porção de arroz branco, 111 kcal do arroz integral e 125 kcal da mandioca.
Segundo o diretor, as gerações mais jovens têm apostado mais no consumo da batata como opção de alimento equilibrado. Ele diz que não há interesse em rivalizar com o arroz e feijão e sim em complementar a dieta, mas ressalta que o tubérculo produz mais que o arroz e feijão em menor área. A produtividade média da batata no Brasil é de 33 toneladas por hectare, enquanto a do arroz é de 6,5 toneladas por hectare e a do feijão, 4 toneladas.
A associação criada em outubro de 2024 tem cerca de cem associados, que representam de 30% a 40% da cadeia e inclui produtores, sementeiros, transportadores e distribuidores. O investimento da Abbin em campanhas para divulgar a “batata brasileira”, diz Carrenho, já soma cerca de R$ 500 mil.
“O nome batata inglesa foi dado pela trajetória do alimento que era originário dos Andes, foi levado para a Europa e voltou ao Brasil. Mas a batata é brasileira: nosso solo, nosso clima, nossas variedades.”
Marcos Boschini, o produtor goiano, é também presidente da Abbin. Ele diz que a associação pretende levar ao consumidor o conhecimento nutricional da batata in natura para diferenciar da batata frita.
“Na época da pandemia, o consumo da batata in natura aumentou bastante porque as pessoas ficaram mais tempo em casa e se preocuparam com a alimentação. Queremos resgatar isso trabalhando com endocrinologistas, nutricionistas e cozinheiros do Masterchef.”
Batatas são lavadas para serem destinadas ao consumo in natura
Arquivo pessoal
Agrônomo formado na Universidade Federal de Viçosa, Boschini foi para Brasília trabalhar com a Cooperativa Agrícola de Cotia e acabou se tornando agricultor em Niquelândia (GO). Atualmente, planta 700 hectares de batata dos tipos ágata e orquestra, além de soja, milho, feijão e trigo. Na sua região, a safra vai de junho até o início de novembro.
Ele conta que prefere cultivar a batata para consumo in natura porque seu plantio a 1.1180 metros de altitude garante uma vantagem competitiva em qualidade para o mercado in natura, que exige uma batata clara de melhor aparência do que o tubérculo destinado à indústria.
“No mercado in natura, o produtor fica sujeito às oscilações de preço, mas geralmente ganha mais. A indústria exige uma produtividade maior e oferece mais segurança com contrato anual, mas preço menor.”
Leandro Belleboni cultiva 500 hectares de batatas com cinco sócios em São Francisco de Paula (RS), além de plantar milho e soja. Com uma produtividade média de 45 toneladas por hectare, ele adotou o plantio mecanizado, mas a colheita é manual. O plantio é feito no final de agosto e a colheita segue até o final de janeiro. Além de plantar a batata para mesa, ele trabalha também no comércio de batata, comprando de outros produtores.
“A cultura tem um ciclo de anos ruins, anos bons e às vezes só empata. Este ano, o preço está ruim, mas no ano passado foi muito bom, o que levou muitos aventureiros a plantar batata e derrubar o preço.”
Leandro Belleboni, produtor e comerciante de batatas em São Francisco de Paula, no RS
Arquivo pessoal
Leilson Aparecido da Silva cultiva batata em Araxá (MG) com o pai, Jair, o irmão Leandro e os primos Luiz Antônio e Flávio, bem perto das instalações da Bem Brasil, indústria da família Rocheto que produz e até exporta batatas pré-fritas e congeladas, mas o foco do produtor mineiro é o mercado in natura mesmo.
“Meu pai sempre produziu batata para mesa e teve mercado. Toda vida vale a pena ser produtor agrícola, mas não acho viável mudar para a indústria, mesmo com as oscilações de preço e de rentabilidade.”
A família começou o cultivo em terras arrendadas em Camanducaia e em 2010 migrou para Araxá, onde arrendou inicialmente 20 hectares. Hoje tem 500 hectares de batata entre terras próprias e arrendadas e 60 funcionários. Cerca de 85% da área é irrigada e toda a família trabalha na cultura.
Leilson Aparecido da Silva, produtor de batatas em Araxá (MG)
Arquivo pessoal
Osmar Kloster Oliveira deixou um emprego em um banco em 1992 e começou plantando 5 hectares em Guarapuava (PR). Hoje tem 300 hectares de batata do tipo ágata, além de soja, milho, feijão e cebola e administra a fazenda com três filhos. Ele diz que sempre apostou no cultivo para o consumo in natura.
“É o mercado mais dinâmico. Fazer um contrato pré-fixado com a indústria tira do produtor a chance de ganhar mais quando o preço está melhor.”
Nos dois últimos anos, ele diz que o produtor de batata ganhou dinheiro, mas neste ano, o preço só começou a melhorar a partir de abril e não foi o suficiente para cobrir todos os custos. Com sementes, fertilizantes e defensivos, ele estima o custo de produção na sua região em R$ 60 mil por hectare. O plantio por lá ocorre no final de agosto e a colheita se estende até fevereiro.
Oliveira também tem beneficiadora de batata, presta serviço para outros agricultores e produz sementes na fazenda com a compra do minitubérculo para reprodução e manutenção em câmara fria. Ele conta que a produtividade neste ano foi ruim, com muitas chuvas pesadas e a média da sua colheita caiu de 45 toneladas por hectare para 31,2 toneladas na fase final.
Osmar Kloster Oliveira , produtor de batata em Guarapuava (PR)
Arquivo pessoal
Neste mês, a saca de 25 kg está sendo vendida no atacado por preços que variam de R$ 68 a R$ 90. No ano passado, a saca chegou a R$ 167 em julho, segundo dados da Hortifruti/Cepea).
Embrapa
Arione da Silva Pereira, da Embrapa Clima Temperado, pesquisa a batata há 33 anos. Ele diz que a cultura gosta de frio e seu cultivo ocorre em todas as regiões do país, com destaque para Minas Gerais, especialmente no Alto Paranaíba e Triângulo Mineiro. A cultura tem pequenos, médios e grandes produtores, que plantam com pivô central.
A principal diferença entre a batata de mesa e a que vai para indústria, segundo o pesquisador, é o ciclo da cultura. Na batata para o consumo in natura, o ciclo é interrompido em torno de 90 dias para que o tubérculo atenda às exigências do mercado, especialmente quanto à aparência. No caso da indústria, o ciclo vai de 120 até 130 dias. Das 4 milhões de toneladas produzidas no país, um terço vai para a indústria.
Pereira destaca que a área plantada caiu no país, mas foi compensada pelo aumento de produtividade proporcionado por novas cultivares, tecnologia de irrigação e uso de sementes melhoradas. A Embrapa desenvolveu nos últimos dez anos quatro variedades de batatas mais indicadas para o clima tropical, mas a maioria das cultivares para o consumo in natura ainda vem da Europa.
No ano passado, a Europa reduziu a produção de sementes e afetou a produtividade no Brasil, que importa de 6 mil a 7 mil toneladas de sementes por ano da Holanda. As sementes dos tipos Ágata e Asterix, cujas patentes já caíram no domínio público, são reproduzidas no Brasil por sementeiros e produtores mais tecnificados que mantêm laboratórios e câmaras frias em suas fazendas.
Área plantada com batata caiu no Brasil, mas foi compensada pelo aumento de produtividade
Gilson Abreu/AEN
O pesquisador ressalta que o consumo in natura poderia aumentar se houvesse informação na gôndola para o consumidor sobre a aptidão da batata. “Nem toda batata é boa para fritar ou cozinhar. A ágata, por exemplo, que é a mais plantada no país, não é indicada para frituras.”
O alto número de produtores que cultivam batata no país se deve, segundo Pereira, à alta lucratividade da cultura, mas é preciso saber estimar a produção de acordo com a demanda.
“Batata é uma oportunidade de sucesso, mas também de fracasso se o produtor não tiver planejamento, já que tem custo de produção alto devido ao valor das sementes e à necessidade de muitas intervenções por conta das pragas e doenças.”
Além das viroses que reduzem o potencial produtivo das sementes, a cultura é suscetível à requeima, doença fúngica (Phytophthora infestans) que ataca as folhas, caules e tubérculos da batata. Essa doença devastou plantações de batata na Irlanda na década de 1840, causando fome e migração em massa. São fatores limitantes da produtividade também a pinta preta, os nematóides das galhas e pintas e a canela-preta, causada por bactéria. As pragas mais comuns são traça, pulgões e mosca branca.