Estudo defende práticas que protegem insetos polinizadores do fruto Um estudo recém-publicado sugere que práticas agrícolas sustentáveis, que protejam os polinizadores e mitiguem riscos climáticos, podem garantir e até aumentar a produção global de cacau.
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A pesquisa foi divulgada pela revista científica Communications Earth & Environment, da Nature Portfolio, sob o título “A oferta global de chocolate é limitada pela baixa polinização e altas temperaturas”, em livre tradução, realizada pela Universidade de Oxford, do Reino Unido, em colaboração com a Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), no Brasil, a Universidade de Westlake, na China, e a Universidade de Göttingen, na Alemanha.
O estudo foi feito em três dos principais países produtores de cacau: Brasil, Gana e Indonésia, que, juntos, respondem por 33% da produção global. No Brasil, os experimentos foram conduzidos no município de Ilhéus, sul da Bahia.
Como metodologia, os cientistas aplicaram diferentes porcentagens de polinização manual em cacaueiros e compararam os resultados com árvores que mantiveram a polinização natural, realizada principalmente por insetos.
Os dados apontaram que o aumento das taxas de polinização acima dos níveis atuais pode elevar a produtividade em até 20%, o que sugere que muitas plantações sofrem com polinização insuficiente, o que limita seu potencial produtivo.
Além disso, em áreas onde as temperaturas foram até 7ºC mais altas, constatou-se uma redução de 20% a 31% na produção. Isso, segundo a publicação, realça a vulnerabilidade das regiões produtoras aos impactos das mudanças climáticas.
De acordo com o coautor do artigo, Acheampong Atta-Boateng, da Universidade de Oxford, o cacau é polinizado por pequenos insetos, como maruins e tripes. “É surpreendente descobrir que, na maioria das vezes, a polinização natural simplesmente não é suficiente para atingir a produtividade máxima”, afirma.
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O aumento da temperatura do ambiente pode impactar na floração do cacaueiro e nas populações de polinizadores do cacau. Segundo o Manuel Toledo-Hernández, cientista do Instituto Tecnológico Vale, “as altas temperaturas podem alterar o período de floração e encurtar sua duração, causando um descompasso com os polinizadores. Também poderiam desestabilizar as comunidades de visitantes das flores, favorecendo pragas que competem com os polinizadores pelos recursos florais”.
Soluções naturais
Para garantir a sustentabilidade nas lavouras, os pesquisadores recomendam a manutenção da serrapilheira e de biomassa no sub-bosque, preservação da matéria orgânica do solo, fornecimento de sombreamento moderado e redução do uso de produtos químicos agrícolas para conservar a polinização.
Essas práticas também auxiliam a regular a temperatura das lavouras e melhoram a saúde do solo. “Nosso estudo demonstra que métodos agrícolas sustentáveis podem melhorar significativamente a produção de cacau sem necessidade de expansão ou intensificação do cultivo”, destaca a Tonya Lander, primeira autora do estudo.
Conhecida como cabruca, o sistema de produção praticado no sul da Bahia consiste no cultivo de cacaueiros sob a sombra da Mata Atlântica. “Além de favorecer os polinizadores, as cabrucas funcionam como refúgio para a extraordinária biodiversidade da região. Esse modelo é mantido principalmente por agricultores familiares e impulsionado por iniciativas de organizações sem fins lucrativos, como a Tabôa e o Instituto Arapyaú”, destaca Mirco Solé, professor e cientista da UESC.
Mas mesmo com ambiente favorável, as cabrucas registram uma taxa média de polinização natural de apenas 12%. “Existem vários fatores para essas baixas taxas, um deles é sem dúvida a elevação das temperaturas. Mas é muito provável que também tenha a ver com o manejo das cabrucas. Por exemplo, árvores velhas, com pouca floração, e baixa resistência a insetos-pragas que podem estar competindo com os insetos polinizadores”, explica Toledo-Hernández, um dos responsáveis pela aplicação da pesquisa na Bahia.