
Não demorou muito para Douglas Ciríaco, de 27 anos, perceber que em Ouro Branco, cidade de 11 mil habitantes no sertão de Alagoas, a relação entre médico e paciente vai muito além das consultas na Unidade Básica de Saúde (UBS) ou nas visitas domiciliares. O clínico geral faz parte do programa Mais Médicos para o Brasil, do Ministério da Saúde, e é presenteado com itens da economia local, baseada na agricultura, como forma de agradecimento pelo carinho com a população.
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O vínculo criado rende ao profissional muitas dúzias de ovos, galinha, feijão de corda, milho, abóbora, acerola, quiabo, entre outras coisas. O resultado disso? Além de encher a despensa da casa da avó com alimentos saudáveis e saborosos, a rotina carregada de afeto e gratidão viralizou nas redes sociais.
As publicações onde ele mostra os “recebidos” inusitados renderam milhares de visualizações, curtidas e comentários elogiando o cuidado e a humildade na profissão que escolheu seguir ainda na adolescência.
“O que mais me chama a atenção é que são as pessoas com menos condições que tentam agradar quando entro naquela casinha bem humilde. Que seja uma simples dúzia de ovos. Não é pelo presente em si, é o gesto. Eu sou médico e olho o outro médico como um ser humano qualquer, nós somos iguais. Só que para aquele pessoal do sertão, é Deus no céu e o médico na terra. Eles têm respeito e admiração”, conta à Globo Rural.
Para o médico, as pessoas podem até esquecer o remédio receitado ou a forma como ele indicou o tratamento para curar alguma doença, mas o fato de ser colocado como prioridade por alguns minutos cria um laço com valor inestimável.
“Quando você pega um médico que olha a pessoa como um ser humano de verdade e que não está ali apenas pelo sintoma, ela percebe e fica grata. Me chama a atenção quando eles querem me presentear. É sinal de que estou fazendo um bom trabalho”.
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Natural de Alagoas, Douglas morava em Arapiraca quando decidiu se inscrever no programa do Sistema Único de Saúde (SUS) e tentar a vaga disponível em Ouro Branco. O momento coincidiu com a morte do avô, que morava na cidade.
“Quando abriu o edital, cada médico poderia escolher dois locais. Eu fiquei em segundo lugar na seleção, mas o primeiro colocado desistiu, o que fez com que me chamassem. Depois de 1 ano e 5 meses, sinto que minha escolha deu certo e que estou no caminho certo. Ninguém dá presentes para um médico ruim. Você não vai ver médico ruim recebendo galinhas, ovos e verduras. Eu brinco com os meus amigos que posso não ser o melhor médico do mundo ou o mais rico e mais inteligente, mas duvido algum ganhar mais galinhas do que eu”, diz.
Presentes inusitados demonstram gratidão de agricultores pelo trabalho do profissional
Arquivo Pessoal
Os planos para o futuro
Como o contrato do programa Mais Médicos pelo Brasil dura quatro anos, Douglas ainda tem pela frente muitos meses de trabalho em Ouro Branco. O desejo é seguir atendendo no sertão de Alagoas e, por isso, iniciou o curso de especialização em Medicina da Família na Comunidade.
“Eu estou ganhando nome na região, as pessoas me conhecem já. Penso que no futuro posso continuar na UBS e fazer plantões em cidades vizinhas atendendo os mais necessitados”.
Se o planejamento for cumprido, a tendência, além de cativar os pacientes, é receber cada vez mais ovos, galinhas, quiabo, feijão, abóbora, acerola, milho para encher a avó de orgulho.
“Ela é a primeira pessoa que experimenta as coisas. Às vezes, o paciente dá uma galinha e diz para fazer um pirão. Eu faço mesmo. É muito bom esse carinho, você não tem ideia. E a minha avó adora, né? Ela mora há 50 anos aqui, todo mundo a conhece. Ela é reconhecida como ‘avó do médico’. Então, quando o pessoal chega falando bem de mim e eu chego com presentes, ela fica toda orgulhosa”, finaliza.