
Presença brasileira é massiva em companhias e fazendas bem desenvolvidas no país africano O setor agropecuário em Angola tem se estruturado aos poucos. Empresas especializadas começaram a surgir para atender carências específicas dos agricultores e pecuaristas locais, como a importação de fertilizantes e defensivos e o financiamento da produção. Também há revendas de insumos agrícolas e representações das fabricantes de máquinas. Nessas companhias e nas fazendas que produzem em escala comercial, majoritariamente, há brasileiros.
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A Carrinho Agri foi pioneira na concessão de financiamento via barter, operação de troca na qual antecipa a entrega de insumos aos produtores para o plantio e recebe a produção das lavouras no fim da colheita. A companhia atua também na indústria e no comércio angolano. Os produtos negociados com os agricultores são processados em 17 fábricas no país e vendidos em mais de 80 lojas.
“Produtos da cesta básica têm maior demanda. O carro-chefe é o milho para fubá, além de arroz e óleo de soja. O foco é produzir internamente por conta da alta demanda”, afirma a gaúcha Paula Saengers, coordenadora de Larga Escala de Fomento da Carrinho Agri.
A empresa fomenta a produção em 78 mil hectares da agricultura familiar e 26 mil hectares de produção comercial, como a Fazenda Pipe, em Cacuso.
Na capital, o brasileiro Eduardo Aquino comanda as operações da Grandes Moagens de Angola (GMA), empresa do Grupo Webcor. A companhia tem unidade de recebimento e processamento de trigo no Porto de Luanda. O cereal é quase todo importado da Argentina e vira farinha para as padarias e empresas de massas e preparações.
O grupo também tem terras e busca parceiros para o plantio. Recentemente, estreou nas operações de barter, com repasse de fertilizantes e defensivos no valor de US$ 10 milhões a um produtor em troca do recebimento de açúcar. Há interesse em fazer o mesmo com arroz, feijão e trigo, diz Aquino.
Rodrigo Monteiro está desde 2013 em Angola. Ele trabalha na Brasáfrica, empresa fundada por Silvio de Castro Junior, pecuarista do Triângulo Mineiro, que já foi o maior exportador de gado vivo para o país africano. A companhia vende insumos — a maior parte oriunda do Brasil — , como sementes, implementos e medicamentos. Também presta serviços, como a construção de currais e montagem de fábricas de ração e comercializa suplementos minerais de produção própria.
Outros nove brasileiros trabalham na empresa que tem três unidades e várias revendedoras no país. “Angola é a nossa segunda casa”, afirma Monteiro. Questionado se pretende voltar ao Brasil, ele revela o receio com a instabilidade do país, ponto que pesa também na decisão de quem avalia investir na produção agropecuária em Angola. “Aqui planejamos ano a ano”.
Há um ano no país africano e à frente da produção de açúcar da Biocom, o paulista Paulo Kronka aposta na introdução de novas variedades para aumentar a produtividade dos canaviais a curto e médio prazos. “O diferencial é que a produção está toda em volta da usina, algo que não se encontra no Brasil”, diz. Ele trabalha há 40 anos no segmento sucroalcooleiro e tem passagens pelas usinas Coruripe, Nobo e Guarani, atual Tereos.
A Biocom vai processar 1,3 milhão de toneladas de cana e produzir 130 mil toneladas de açúcar nesta safra e tem capacidade para ampliar a produção para 2,2 milhões de toneladas e 240 mil toneladas de produto final, segundo Kronka. Para isso, a empresa pretende aumentar a produtividade de 55 toneladas para 80 toneladas por hectare e prospecta parceiros brasileiros para iniciar o plantio de cana em 12,5 mil hectares de áreas próprias que ainda podem ser abertas.
Se mais brasileiros toparem o desafio e assumirem módulos de 2,5 mil hectares para plantio de cana, a Biocom esperar “acelerar a maturidade da empresa e atingir a capacidade máxima da indústria em menos tempo”, diz Kronka.
Na Fazenda Terras de Koló, no município de Cacuso, o foco é a pecuária de corte. Rodrigo Camargo é o gerente e “Branco”, um boiadeiro de Santo Antônio do Leste (MT), é o responsável pelo manejo do rebanho de 6,2 mil animais, que vai crescer e chegar a 10 mil no fim deste ano com a importação de um navio do Brasil em breve.
O abate é feito em um matadouro na fazenda e a carne é vendida a comércios em Luanda. O próximo passo é criar a própria marca de carne. A ideia é intensificar a pecuária com a instalação de um pivô para irrigar culturas destinadas à silagem e investir em genética.
“Existem coisas que fazemos aqui que não faríamos no Brasil e outras que sabemos que não é o perfeito, mas estamos caminhando a passos largos em tecnologia”, diz Camargo.
No ano passado, a fazenda iniciou o cultivo de girassol em 900 dos 20 mil hectares. Uma empresa italiana financia todo o processo, com remuneração até pela operação com as máquinas da propriedade, pelo sistema de barter. A produção é vendida por US$ 100 a tonelada.
Já o gaúcho Fernando Hoffmann é o agrônomo responsável pela Fazenda Pungo Andongo, em município homônimo e situada no Polo Agroindustrial de Capanga. Em fase de expansão, a propriedade tem níveis de minerais no solo melhores que os encontrados no Centro-Oeste do Brasil, segundo ele.
Cézar Rizzi, paranaense radicado em Brasília e estudioso da África, é consultor da fazenda. Ele já morou na região e aposta no potencial local. “É o país que tem maior potencial de produção agrícola na África”, afirma. (RW)
O jornalista viajou a convite do Ministério da Agricultura