Na quarta-feira (13/8), a Raízen – que tem como sócias a brasileira Cosan e a anglo-holandesa Shell – que é a maior produtora de açúcar e etanol do mundo e uma das maiores distribuidoras de combustíveis do Brasil, divulgou seus resultados financeiros do primeiro trimestre do exercício de 2025/26, de abril a junho. Os dados reforçaram a indicação de que a empresa vive uma crise financeira, após um ciclo de forte crescimento orgânico e inorgânico, interrompido pela elevação dos juros no Brasil.
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Na quinta-feira (14/8), as ações preferenciais da Raízen negociadas na B3 sofreram um tombo de 12,5%. A companhia já vem apresentando um desempenho financeiro mais fraco desde novembro do ano passado. Os controladores decidiram mudar o pessoal-chave em sua gestão. Porém, a situação continuou se agravando.
A empresa informou em seu último balanço um prejuízo líquido de R$ 1,8 bilhão, uma receita líquida de R$ 54 bilhões, e uma dívida líquida de R$ 49 bilhões, que representava 4,5 vezes o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) em 12 meses – um índice acima do que o mercado considera como “saudável”, de até 3 vezes.
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No relatório de resultados, a empresa publicou que estava buscando uma alternativa de atração de capital, o que poderia incluir a capitalização por parte dos sócios controladores ou ainda a entrada de um terceiro sócio, como informou a Globo Rural. Atualmente, a Cosan, do empresário Rubens Ometto, tem 44% da Raízen, mesma participação da Shell, enquanto os demais 12% de participação estão na mão dos acionistas minoritários.
Nesta sexta-feira (15/8), o CEO da Cosan, Marcelo Martins, descartou a possibilidade de um aporte na Raizen, e disse que o foco é atrair um novo sócio estratégico para o negócio. Segundo o Valor Econômico, a empresa contratou o Itaú para assessorá-la no processo, enquanto a Shell contratou o Lazard.
Movimentos de expansão
A companhia começou a investir na diversificação de seus negócios em 2019, sob a batuta do então CEO Ricardo Mussa. Naquele ano, começou a construir uma planta de biogás e inaugurou outra, solar fotovoltaica. No mesmo ano, criou o Grupo Nós, uma joint venture com a Femsa para operar a rede de minimercados Oxxo, cum plano agressivo de expanão, abrindo uma loja por dia.
Em 2021, a Raízen iniciou um investimento de R$ 1,2 bilhão em sua segunda planta de etanol de segunda geração (E2G), feito do bagaço e da palha da cana. A empresa já operava há anos de forma piloto sua primeira planta, em Piracicaba (SP), e havia, então, conseguido a patente de processos industriais que desenvolveu por conta para destravar gargalos tecnológicos do E2G.
Na mesma época, a companhia já testava projetos de pelletização da biomassa da cana. Dois anos depois, anunciou novas construções de plantas de E2G, que acabaram resultando em um investimento total de R$ 6 bilhões apenas nessa tecnologia.
Também em 2021, a Raízen, que já liderava no mercado sucroalcooleiro, comprou a segunda maior empresa do ramo, a Biosev, que era controlada pela Louis Dreyfus Company (LDC). A companhia gastou R$ 3,6 bilhões, sem contar uma operação de troca de ações com os então minoritários.
Nova planta de Etanol de Segunda Geração (E2G) da Raízen no Parque de Bioenergia Bonfim, em Guariba (SP)
Raízen / Divulgação
Além desses casos de crescimento orgânico e inorgânico, a Raízen também tomou outras decisões estratégicas de atuação em novos negócios, como a decisão de deixar de vender açúcar através de tradings e negociar diretamente com os clientes globais. A empresa passou também a realizar operações de trading de açúcar de outras usinas do Brasil.
Para dar conta dos investimentos, a Raízen buscou uma capitalização via mercado, com um IPO que levantou R$ 7,78 bilhões. Porém, também teve que recorrer a instrumentos de financiamento, que acabaram aumentando o valor de sua dívida.
Isso não foi um problema até 2024. Naquele ano, porém, o Banco Central (BC) começou a aumentar de forma agressiva a taxa Selic para controlar a inflação, o que elevou o custo financeiro do endividamento da companhia.
Incêndios
Além disso, na safra 2024/25, a companhia viu-se no meio do fogo, literalmente. Seus canaviais focaram entre os mais afetados pela onda de incêndios entre agosto e setembro de 2024. No fim daquela temporada, a empresa informou que perdeu 6 milhões de tonelada de cana de lavouras próprias e de fornecedores. Porém, a estiagem do ano passado e as queimadas continuam gerando danos até agora, já que comprometeram a capacidade de crescimento das plantas para esta safra.
No primeiro trimestre da safra atual (2025/26), a moagem de cana da companhia ficou 21% abaixo do registrado um ano antes, enquanto a concentração de sacarose diminuiu 2,7%, o que fez a companhia produzir menos açúcar, menos etanol e gerar menos energia do que um ano atrás.
Venda de ativos
Para gerar caixa mais rapidamente, a companhia vem vendendo alguns ativos. A Raízen já vendeu lavouras de cana das usinas MB e da Santa Elisa para indústrias concorrentes, além de ativos de energia, mas os valores ainda não entraram em caixa. Até o fim desta safra, a companhia espera receber R$ 2,6 bilhões das vendas realizadas.
A companhia também decidiu parar de realizar atividades de trading de açúcar e etanol para simplificar suas operações.