Em estudo, Insper Agro Global avaliou os seis itens agrícolas que chineses mais compram A guerra comercial entre Estados Unidos e China confere ao Brasil uma vantagem competitiva temporária. Mas o governo e o setor produtivo devem ficar atentos porque essa vantagem pode ser usada nas próximas semanas como moeda de troca para por fim à disputa de tarifas entre os dois países. O alerta é do professor Marcos Jank, do Insper Agro Global.
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Um estudo realizado por Jank e pelos pesquisadores Leandro Gilio e Victor Cardoso, do Insper Agro Global, mostra que as tarifas impostas pela China a produtos americanos reduzem a competitividade dos EUA em relação a outros fornecedores, como o Brasil. A pesquisa considerou os seis produtos agropecuários que a China mais importa dos dois países: soja em grão (92% é comprada de EUA e Brasil), milho (66%), algodão (76%), carne bovina (55%), carne suína (31%) e carne de aves (64%).
Em abril, os Estados Unidos e a China intensificaram a escalada tarifária, com o governo americano anunciando tarifas de até 145% e a China respondendo com tarifas de até 125% sobre produtos americanos. Em 12 de maio, os países anunciaram uma trégua de 90 dias, com redução de 115 pontos percentuais sobre as tarifas de abril, o que deveria resultar em tarifas finais de 30% (cobrado da China pelos EUA) e 10% (sobre produtos americanos que vão para a China).
Na prática, no entanto, as tarifas impostas pela China aos produtos americanos continuam acima desse patamar de 10% e acima das tarifas impostas aos produtos brasileiros, aponta Jank. As tarifas chinesas sobre a soja em grão americana são de 23%, contra 3% para o Brasil. Para milho e algodão, as tarifas são de 26% para EUA e 1% para o Brasil. Para a carne bovina, a China cobra 12% do Brasil e 32% dos EUA. O caso mais extremo é da carne suína. Os EUA são taxados em 57%, e o Brasil é tarifado em 12%.
Embora o cenário pareça favorável para o Brasil no curto prazo, é preciso ter cautela, na visão do especialista. “Entendo que essas tarifas que estão sendo praticadas hoje vão ser usadas como instrumento de negociação para pressionar os Estados Unidos a reduzir a tarifa média de 30% que querem aplicar sobre os produtos chineses”, afirma Jank.
O professor observa que a China tem adotado medidas pontuais, atingindo segmentos que são importantes politicamente para o presidente Donald Trump, como os produtores de grãos do meio oeste americano. “A China também tem feito um negócio perigoso, que é escolher a empresa que terá direito de enviar produtos ao país”, diz Jank. No caso do milho, por exemplo, a China tem uma cota de importação de 7,7 milhões de toneladas dos EUA ao ano e concedeu o direito para a chinesa Cofco embarcar 4,4 milhões de toneladas. “Não duvido que, no futuro, o país possa retaliar o embarque de empresas americanas, como Bunge e Cargill”, pondera o professor.
Para o Brasil, a situação no momento é favorável, mas Jank considera relevante tanto o governo quanto o setor produtivo acompanharem as mudanças de perto. “O que é hoje um benefício para o Brasil pode virar moeda de negociação. A China busca negociar tarifas mais baixas para exportar aos EUA. E os Estados Unidos, que têm um déficit comercial de US$ 300 bilhões com a China, também vão tentar construir um acordo para exportar mais ao país”, diz Jank.