
A discussão sobre o abate de jumentos voltou ao centro do debate nacional após o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reconhecer a legalidade da atividade. A decisão, divulgada no início de novembro, reforça o entendimento de que os frigoríficos certificados com Serviço de Inspeção Federal (SIF) seguem as normas sanitárias e de bem-estar previstas em lei.
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Na decisão, o TRF1 destaca que não houve comprovação de irregularidades na cadeia de transporte, fiscalização e abate dos animais. Além disso, considera que a interrupção anterior dos abates provocou prejuízos a uma atividade formalmente regulada no estado, responsável pela renda de diversas famílias.
O processo, porém, permanece em movimento. Segundo o advogado Yuri Fernandes Lima, que representa a Frente Nacional de Defesa dos Jumentos, embargos de declaração já foram apresentados, e novas etapas judiciais devem chegar ao STJ e ao STF.
Lima enfatiza que a decisão “não possui definitividade”, e aponta uma série de fatores que, na visão dele, ajudam a sustentar a continuidade das ações contrárias à prática. Entre eles, o caráter extrativista do abate, já que não há cadeia produtiva estruturada, o risco de extinção, estimado em 94%, e o fato do animal ser um símbolo cultural diretamente relacionado ao artigo 216 da Constituição.
“Cabe destacar, ainda, o risco sanitário [da atividade]. A falta de rastreabilidade dos jumentos gera riscos sanitários, especialmente em relação ao mormo, uma zoonose grave, com alta taxa de letalidade. Somado a isso, tal atividade impacta os níveis da biossegurança e da bioeconomia do país, bem como está relacionada ao problema do tráfico de animais silvestres”, alerta.
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Do outro lado da discussão, a decisão foi recebida como uma conquista pelo setor produtivo, que vê no abate uma alternativa para enfrentar o abandono em massa de jumentos nas estradas do semiárido. A expectativa é de que a confirmação jurídica estimule novos negócios e fortaleça uma cadeia que atende, principalmente, à demanda chinesa por carne e pele, matéria-prima usada na produção do ejião, consumido amplamente naquele país.
O zootecnista Alex Bastos argumenta que a atividade abre caminho para transformar um cenário de abandono em política pública. Para ele, é necessário que o debate seja pautado por dados e responsabilidade técnica.
“A questão vai muito além de acabar ou não com o abate. Trata-se de compreender como transformar uma situação de abandono em uma política pública de manejo sustentável, com foco no bem-estar animal, no controle populacional e sanitário, na segurança viária e no desenvolvimento regional”, opina.
Nos últimos anos, diferentes instâncias da Justiça também se posicionaram sobre o tema. O Tribunal de Justiça da Bahia, por exemplo, rejeitou em 2025 a suspensão dos abates, destacando o impacto socioeconômico que isso teria para trabalhadores da região.
“Trata-se de criadores, transportadores, comerciantes, trabalhadores do frigorífico, prestadores de serviços e suas respectivas famílias, cuja fonte de renda está diretamente vinculada à atividade em questão. A paralisação imediata da atividade representaria grave impacto social e econômico para essa população, especialmente considerando que muitas dessas pessoas são de baixa renda e não possuem alternativas imediatas de trabalho”, afirma o Tribunal em trecho da decisão.
Enquanto isso, a Frente Nacional de Defesa dos Jumentos garante que “continuará lutando pela proteção desses animais e pela preservação de sua função ecológica e cultural, garantindo que seus direitos sejam respeitados e que medidas efetivas sejam tomadas em defesa do meio ambiente e da saúde pública.”





