
O jambu e suas flores caíram nas graças do povo. Uma hortaliça nativa da Amazônia, item bastante presente na cultura e na gastronomia do Pará, vem ganha cada vez mais novos usos. As sensações de leve dormência e tremor causados pela planta a levaram para a produção de bebidas, cosméticos e virou até em um extrato que seria afrodisíaco, vendidos no Brasil e com clientes internacionais. No campo, surge uma demanda adicional para produtos que serão apresentados na COP 30, a conferência do clima que acontece em novembro em Belém (PA).
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Nascido em uma família de pequenos agricultores de Fortaleza (CE), José Erivaldo Macedo – conhecido como Netinho – trabalha há oito anos cultivando a planta em Castanhal (PA) para vender as flores.
“Nos últimos três anos, foi quando começou a crescer mais a demanda pela flor de jambu. Antes eram os fabricantes de cachaça que compravam mais, mas os produtores de cosméticos entraram com toda força”, conta o agricultor.
No Pará, o clima predominante é o equatorial úmido, com altas temperaturas e elevados índices pluviométricas. Sol demais seca as folhas, chuva demais favorece a proliferação de pragas e doenças.
A solução que Macedo encontrou para lidar com estas condições climáticas foi investir em equipamentos de irrigação. Hoje, ele é dono de uma lavoura de 2 hectares totalmente irrigada, que recebeu mais de R$ 200 mil em investimentos nos três anos mais recentes. Inclusive, foi essa estratégia que salvou os cultivos durante as secas severas que atingiram a região Norte em 2023 e 2024.
Produtor rural José Erivaldo Macedo investiu em irrigação para driblar os períodos de seca na lavoura de jambu
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Tradicionalmente, as hortas paraenses de jambu são cultivadas em pequenas áreas, muitas delas com uma cobertura para proteção do sol. Famílias de produtores se juntam para cuidar das plantas em lotes individuais ou compartilhados no mesmo terreno, próximo das casas.
Além do clima, outro desafio para todo produto amazônico que busca espaço na indústria é ganho de escala para manter o fornecimento. Ciente disso, Macedo não criou uma cooperativa, mas passou a comprar também flores de jambu dos pequenos produtores de Castanhal e outros municípios vizinhos.
“Cerca de 15 a 20 famílias entregam matéria-prima para minha empresa. Neste ano, estamos somando cerca de 5 toneladas de flores mensais, um aumento em torno de 50% comparado ao ano passado”, afirma o agricultor. Do total, 1 tonelada por mês sai da produção própria de Macedo.
Antigamente, ele até chegou a produzir de 2 a 3 toneladas mensais, mas junto com o inverno de cada ano vinha uma proliferação maior de pragas, que levou alguns produtores a desistirem da atividade devido aos prejuízos. A saída foi reduzir a área e começar a comprar a flor de jambu dos vizinhos – e os planos passaram a dar resultados.
“Hoje, atendemos quase todo o Brasil, já mandamos a flor para países da Europa, como Suíça e Espanha”, diz.
O produto in natura é comercializado pelo agricultor localmente e para outros Estados ou países mandamos a flor desidratada, que cumpre as mesmas funções da planta fresca.
A expectativa para 2025 é dobrar o faturamento do ano passado e alcançar R$ 3 milhões. “O mercado já estava bom, agora os clientes todos estão aumentando com pedidos e ideias pensando em produtos para apresentar na COP”, conta Macedo.
Expansão
Na culinária, o jambu está no tacaca e pratos típicos paraenses. Nas bebidas, até o início de agosto, um licor de cacau com jambu deve chegar ao mercado de Belém (PA), novo produto criado por Tatiana Sinimbu, dona da marca Sinimbu. A bebida é uma das apostas da empreendedora para a COP 30, quando muitos fabricantes de produtos feitos de matéria-prima amazônica terão espaços para mostrar as iguarias da região.
Entidades que atuam localmente, como a Fundação Certi e a Associação dos Negócios de sócio-bioeconomia da Amazônia (Assobio), são algumas das facilitadoras que apoiarão a participação de empreendedores na COP.
Tatiana Sinimbu é uma das empreendedoras que vai apresentar produtos na COP 30, em Belém (PA)
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Desde 2016, ela trabalha na produção de cachaça, conservas e nos últimos anos até um extrato líquido de jambu que pode ser usado na gastronomia, em cosméticos ou direto na pele, como afrodisíaco – conhecido como “tremidão”, um dos carros-chefes da empresa. As pesquisas para novos produtos são feitas em um laboratório na área da universidade federal do Pará.
Tatiana demanda de 60 a 80 quilos de jambu por mês para seus produtos e busca a hortaliça de comunidades formadas por pequenos produtores rurais.
“Já recebi um depoimento de uma comunidade dizendo que eu beneficio umas 30 famílias, porque eles vendiam a R$ 0,30 o maço de jambu e agora vendem a R$ 30 o quilo da flor de jambu. Digo que, aqui no Pará, depois do açaí, o jambu vai ser a bola da vez”, afirma.
As vendas dos produtos Sinimbu são feitas localmente e online, com a ajuda de um distribuidor de São Paulo. “Nesses seis meses de 2025, eu já vendi um volume igual ao do ano inteiro de 2024″.
“A ideia é trabalhar mais com o mercado internacional no pós-COP”, acrescenta, citando que já conta com demandas de clientes na Espanha, França, Estados Unidos, México, Chile, entre outros países.
Carol Vilanova, sócia-fundadora da Flor de Jambu, conta com uma loja física em São Paulo, além do comércio online
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A sócia-fundadora da loja Flor de Jambu, Carol Vilanova, comercializa mais de 200 produtos feitos de ingredientes típicos da região amazônica, com vendas online e em uma loja física em São Paulo. Há também produtos que são exportados. Para este ano, ela espera faturar cerca de R$ 800 mil, avanço de 70% comparado a 2024.
“Os produtos vêm sendo muito procurados e a expectativa é que o mercado do jambu se torne cada vez mais conhecido. O jambu vai ser um dos responsáveis para que os produtos da Amazônia sejam conhecidos mundialmente”, vislumbra.
Ela acredita que a versatilidade nos usos do jambu, as sensações características e a experiência que ele proporciona são os segredos que aguçam a curiosidade do consumidor.
*A jornalista viajou a convite do Cubo Itaú