A uma semana do início da COP30, em Belém (PA), o governo federal publicou o decreto, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estabelece a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB). Espécie de “cartilha sustentável”, a iniciativa consiste em um sistema de classificação que definirá, com base em dados científicos, quais atividades econômicas, ativos e projetos são, de fato, sustentáveis na visão do Executivo e que contribuem para o atingimento de objetivos climáticos, ambientais e sociais do país, por meio de critérios específicos.
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Há um caderno específico para agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura. A publicação final manteve as condições de elegibilidade para o imóvel rural adiantadas pela reportagem na semana passada e que foram alvo de críticas do setor agropecuário.

A lista de orientações da TSB não considera sustentável o financiamento do uso de agrotóxicos classificados com o 1A ou 1B, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), nem a aplicação de defensivos enquadrados nas classes toxicológicas 1, 2 e 3 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e nas classes de potencial de periculosidade ambiental (PPA) 1, 2 e 3 pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O setor produtivo diz que isso pode impactar no uso de herbicidas e na prática do plantio direto.

Na lista de orientações da TSB, o governo definiu como não sustentável qualquer tipo de desmatamento nas propriedades rurais. Isso vale também para o desmate legal, que ocorre seguindo os critérios do Código Florestal.

A TSB estipula um “período móvel” para adequação dos imóveis rurais. A partir de 2030, produtores que não tenham feito qualquer tipo de desmatamento nos cinco anos anteriores ao empréstimo estarão aptos a buscar crédito verde.

As orientações contemplam a produção de soja e milho, café e cacau, pecuária bovina de corte e leite, plantação de eucalipto, florestas nativas, pesca de pirarucu e criação de peixes em viveiros escavados.

O governo federal publicou também as listas de salvaguardas mínimas gerais e setoriais para alinhamento à TSB. É um conjunto de requisitos para indicar a conformidade com marcos normativos vigentes no Brasil em temas climáticos, ambientais e econômico-sociais.

Na lista do setor agropecuário estão a necessidade de o imóvel ter o Cadastro Ambiental Rural (CAR) “ativo”, não ter embargos por desmatamento do Ibama ou por órgão ambiental estadual; comprovar ausência de supressão ilegal de vegetação nativa, conforme legislação vigente e critérios; não ter sobreposição com Unidades de Conservação (UC), Terras Indígenas declaradas, homologadas ou regularizadas, Territórios Quilombolas já tituladas ou em processo de titulação – com limites já identificados nem Florestas Públicas Não Destinadas (Tipo B), entre outros.
Nas salvaguardas gerais, aplicadas a todos os setores econômicos, estão itens trabalhistas, como a ausência de trabalho análogo ao escravo, a apresentação de Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas e o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais, e tributários, como exigências de certidões negativas de débitos relativos a tributos federais e estaduais. A lista inclui ainda o licenciamento ambiental da atividade e a ausência de embargos ambientais.

Como será a Taxonomia Sustentável
De acordo com o decreto publicado nesta segunda-feira (3/11), a TSB será um instrumento do Plano de Transformação Ecológica do Poder Executivo federal. O Comitê Interinstitucional da Taxonomia Sustentável Brasileira (CITSB) será responsável pela aprovação, revisão e atualização da proposta.

O decreto afirma que a TSB poderá ser utilizada pela administração pública federal para a rotulagem de produtos financeiros, incluídas as operações de crédito, os investimentos e os títulos da dívida pública; o enquadramento de atividades de empresas emissoras de títulos e valores mobiliários e o aprimoramento da regulação e da supervisão da indústria de seguros e de proteção patrimonial mutualista, observados os riscos climáticos, ambientais e sociais.

A TSB também poderá ser usada pelo governo para definir o “direcionamento, a redução ou extinção de incentivos fiscais e creditícios”, diz o decreto. A iniciativa ainda vai orientar a priorização e a qualificação de processos de compras públicas e contratações governamentais de bens e serviços, o monitoramento dos investimentos e dos fluxos financeiros, com a indicação de seu grau de alinhamento à TSB, a promoção de acordos internacionais na área de finanças sustentáveis alinhados à taxonomia e a rotulagem ou certificação de bens e serviços sustentáveis.

Os objetivos estratégicos da TSB são “mobilizar e orientar o financiamento e os investimentos públicos e privados para as atividades econômicas com impactos climáticos, ambientais e sociais positivos, com vistas ao desenvolvimento sustentável, inclusivo e regenerativo”, “promover a inovação e o adensamento tecnológico voltado à sustentabilidade ambiental, climática, social e econômica, com elevação de produtividade e de competitividade da economia brasileira em bases sustentáveis” e “criar as bases para produção de informações confiáveis sobre os fluxos das finanças sustentáveis, por meio do estímulo à transparência, à integridade e à visão de longo prazo para as atividades econômicas e financeiras”.

Na semana passada, em entrevista à Agência Brasil, a subsecretária de Finanças Sustentáveis do Ministério da Fazenda, Cristina Reis, disse que a expectativa é que a taxonomia seja “um farol para atrair investimentos e incentivar empresas a adotarem práticas mais sustentáveis e inclusivas”.

Segundo ela, a implementação da TSB vai orientar as empresas sobre como relatar, verificar e monitorar suas informações de sustentabilidade. “Para atender aos critérios, elas precisarão adotar rotas tecnológicas mais limpas e descarbonizantes e promover equidade racial e de gênero em toda a cadeia produtiva. A taxonomia também orienta o sistema financeiro na concessão de incentivos, que tendem a ser mais vantajosos para produtos e projetos sustentáveis”, disse na entrevista.

A implementação total da TSB poderá contar com recursos do orçamento do Ministério da Fazenda, fundos públicos e privados e doações.