O setor produtivo gaúcho defende que o Conselho Monetário Nacional (CMN) altere os critérios de enquadramento dos municípios aptos à renegociação de dívidas rurais decorrentes de perdas na produção agrícola causadas pelo clima.
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A Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) apresentou uma proposta de ajuste na resolução 5.247/2025, que definiu as regras de elegibilidade, para incluir mais municípios afetados pelas adversidades climáticas. A entidade argumenta que os critérios deixaram dezenas de municípios com produção agrícola importante de fora da renegociação e incluiu outros sem expressividade ou tradição na atividade.
Em ofício encaminhado ao ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, nesta quinta-feira (2/10), a Farsul sugere excluir as safras de inverno, as culturas irrigadas e aquelas que não são financiadas pelo crédito rural, como o fumo, do cômputo de perdas para elegibilidade do município.
Na análise da Farsul, como a regra atual determina a necessidade de perdas acima de 20% em duas das três principais culturas agrícolas do município, locais onde há lavouras de arroz irrigado sem impactos na produção, mas cujas áreas de soja foram afetadas por estiagens, ficaram de fora.
O cenário é parecido com culturas de inverno, como trigo, aveia ou pastagem, que sucedem as áreas de soja e milho. No caso do fumo, que não é financiado pelo crédito rural oficial, as lavouras também foram consideradas para computar as perdas e excluíram municípios com prejuízos em outras culturas, como os grãos.
A sugestão de alteração é para que sejam consideradas as perdas acima de 20% em duas das três principais culturas agrícolas “de verão e de sequeiro” e que as atividades “sejam financiáveis dentro das regras do Manual do Crédito Rural”. A Farsul também propõe que a identificação das principais culturas se dará pelo Valor Bruto da Produção e não pela extensão da área plantada.
“Acreditamos que a adoção de critérios mais realistas permitirá que os recursos alcancem os produtores efetivamente atingidos pelas sucessivas crises climáticas, evitando distorções e assegurando maior efetividade à política pública”, disse Gedeão Pereira, presidente da Farsul, no ofício encaminhado a Fávaro.
À espera de resolução
O tema tem sido tratado pelo senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) em Brasília. Nessa quarta-feira (1/10), ele se reuniu com os secretários de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, e de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Guilherme Campos. “Deve sair uma resolução alterando um pouco os critérios que vai colocar bastante municípios [gaúchos], mais da metade que ficou de fora vai entrar no processo da forma que conversamos”, afirmou o senador à reportagem.
O Rio Grande do Sul teve 403 municípios listados e 94 ficaram de fora. Se os critérios sugeridos agora forem adotados, o número de municípios gaúchos aptos sobe para perto de 470. Em todo o Brasil, a lista pode chegar próxima de 2 mil municípios, disse uma fonte.
Após a divulgação da lista das 1.363 cidades em 23 Estados do país, houve críticas e pedidos do setor produtivo para alterar os critérios de elegibilidade. A Federação da Agricultura e Pecuária do Paraná (Faep) também reclamou. O Estado teve apenas 50 municípios listados.
“Os critérios restritivos prejudicam milhares de produtores que sofreram diretamente os efeitos de secas e outras intempéries desde 2020, mesmo em municípios que não tiveram decretos múltiplos ou perdas em duas culturas simultaneamente”, disse a Faep em nota.
A entidade sugere que o acesso à linha com R$ 12 bilhões de recursos públicos seja garantido com base em laudos técnicos sobre as perdas sem depender de índices “que não captam a dimensão real das perdas”, afirmou. “O cálculo oficial compara a produção atual de cada município com o maior rendimento médio entre 2020 e 2024. Na prática, isso inviabiliza a comprovação de perdas em locais que enfrentaram várias safras ruins, já que suas médias ficaram artificialmente baixas”, completou a Faep.
O Ministério da Agricultura já concordou com a necessidade de mudar os critérios. “Se depender de nossa vontade e atuação, sim [os critérios serão alterados], para calibrar a proposta inicial de enquadramento”, afirmou o secretário Guilherme Campos.
Uma fonte de outra Pasta envolvida nas discussões disse que representantes do setor querem incluir novos municípios que não tiveram perdas. Segundo ela, o assunto demandará mais estudo e debates.
“Os critérios atuais não atendem, pois deixam dezenas de municípios importantíssimos para o agro de fora e colocam para dentro municípios que são balneários, que são praias”, disse o economista-chefe da Farsul, Antônio da Luz.
Segundo ele, a cultura da aveia, tradicional no Rio Grande do Sul, ocupa grandes áreas no Estado, pois é cultivada no inverno após as safras de grãos, como soja ou milho, mas não deveria ser contabilizada para a definição das principais culturas, pois “está tirando vários municípios”.
No caso do fumo, Antônio da Luz ressalta que a cultura não é financiada dentro das regras do Manual do Crédito Rural. “Mas ele está servindo para excluir municípios que são fumageiros e prejudicando produtores de soja, milho, arroz desses municípios, que têm o fumo, mas também têm outras produções”, disse.