Fazenda Roncador – 1º lugar Grandes Propriedades
Antes das 5h da manhã, Pelerson Penido Dalla Vecchia, de 50 anos, já está de pé e na água. Sobre uma prancha de stand-up paddle, ele começa o dia remando em uma represa construída na porta de casa. A essa hora, uma ave solta um canto esquisito, alto e intermitente, que funciona como um despertador natural e tira da cama os visitantes hospedados na sede da fazenda.
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Estamos em uma das propriedades rurais mais famosas do mundo. Localizada no município de Querência, no coração de Mato Grosso, e vizinha da maior reserva indígena do Brasil, o Parque do Xingu, a Roncador é um dos locais de trabalho de Pelerson desde quando ele ainda era moleque e vivia seguindo o avô para cima e para baixo. Ele tem o mesmo nome do patriarca, mas só atende pelo apelido: Peleco.
Com 53 mil hectares, dos quais 47% são preservados, a Roncador forma um mosaico de lavouras, pastagens, florestas, biofábrica, escritórios, pista de pouso, estruturas de armazenamento e expedição e também uma pequena cidade, com mais de 25 casas, 300 habitantes, igreja, escola, academia, quadra poliesportiva, alojamentos e posto médico. Toda essa infraestrutura é cercada por uma selva, onde vivem inúmeras espécies da fauna local, e tem vista privilegiada para a represa.
Além de um local de produção de soja, milho, capim e carne bovina, a Roncador é um imenso centro de pesquisa e inovação. Não é raro encontrar estudantes de diversas universidades de referência do Brasil e do exterior visitando a propriedade.
Fazenda Roncador
Globo Rural
Quando o mundo ainda balbuciava “mercado de carbono”, Peleco já tinha técnicos medindo as emissões da fazenda. “Em 2017, estávamos bem em tudo, mas eu queria medir, e quero medir sempre. Se possível, auditar todas as medições. Tenho filhos e quero deixar o mundo melhor para eles”, diz.
O produtor afirma que sua inquietude e conhecimento profundo sobre cada talhão da Roncador devem-se às grandes proporções da fazenda e ao senso de responsabilidade que ele tem ao administrar esse território.
“Minha decisão aqui dentro causa um impacto direto na região e influencia o planeta de alguma forma. E um dos nossos compromissos é deixar um planeta melhor do que o que encontramos”, resume.
Entre as medições em andamento na fazenda e as já auditadas está a de sequestro e retenção de carbono no solo. Os protocolos internacionais fazem os cálculos do balanço de gases de efeito estufa em 30 centímetros de profundidade.
Fazenda Roncador – Querência (MT)
Na Roncador, as medições já passaram de dois metros e foram auditadas por consultorias respeitadas por alguns anos seguidos.
“Nos primeiros 30 centímetros é onde há mais adensamento e tem muito carbono, em torno de 173 toneladas equivalentes por hectare. Mas daqui para baixo tem mais 190 toneladas, e isso não está na contabilidade do balanço de gases”, diz o produtor, a mais de dois metros da superfície, dentro da trincheira aberta para provar o que diz.
Segundo as medições da Roncador, a fazenda tem saldo negativo de emissões quando o balanço leva em consideração a produção de alimentos em toneladas por hectare.
Nada escapa ao olhar atento de Peleco: a qualidade das sementes armazenadas em silos com refrigeração (em teste), a aplicação e desenvolvimento de bioinsumos, os dejetos do gado de corte. Até a garantia de alimento para as onças-pintadas ele dá –no último ano, elas devoraram 850 bezerros. Tudo normal, em equilíbrio, diz.
Em um laboratório construído ao lado da biofábrica passam todos os produtos comprados fora ou que estão em testes de campo.
A produção e aplicação de bioinsumos foi crucial para os resultados da Roncador. Nas lavouras, Peleco criou o que ele chama de soja inteligente. “É a que usa o máximo de produtos biológicos e 86% menos fungicidas e 14% menos inseticidas”, explica. Com a estratégia, ele reduziu em 65% o uso de ingredientes ativos – e os custos caíram 16%.
Além da rentabilidade própria, gado também produz insumos para a Fazenda Roncador
Thiago de Jesus
Na última safra, o produtor colheu 72 sacas de soja por hectare, sete a mais do que a média da região e 12 acima da média nacional. Na pecuária, a produtividade da fazenda é de 58 arrobas por hectare. A média nacional é inferior a 20 arrobas.
A pecuária, aliás, é fundamental para os resultados, já que ela garante um insumo precioso para as lavouras. Com um rebanho de 70 mil cabeças, a fazenda produz mais de 20 mil toneladas de esterco, que vira adubo e puxa o rendimento da soja para cima.
“Se a pecuária não me desse margem, só de esterco ela me geraria R$ 200 por cabeça”, afirma Peleco, em referência ao ganho nas lavouras adubadas com o dejeto animal.
Pessoas
Se tem um assunto que emociona Peleco tanto quanto seus experimentos de campo são as pessoas. Nos últimos anos, o empresário decidiu fazer uma reforma estrutural e apostou intensamente no pilar social do Grupo Roncador, que inclui áreas de mineração. “Gente e gestão são coisas de presidente”, defende.
Com cerca de 500 funcionários, a Roncador tem hoje um grupo de influenciadores internos para disseminar os valores da empresa de ponta a ponta. Do escritório administrativo aos currais, todos precisam ter a mesma oportunidade de se desenvolver profissionalmente.
Vila de funcionários da Roncador entre a represa e a floresta
Thiago de Jesus
“O Peleco faz a gente pensar fora da caixa e olhar para fora da porteira. No último ano, decidimos abrir oportunidades para menores aprendizes e fizemos um convênio com a Apae, para dar oportunidade a jovens com dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Entre os novos contratados está um jovem com síndrome de down”, conta Sandra Maria Silva, gerente de gestão de pessoas do grupo. O objetivo de Peleco é ajudar as pessoas em suas próprias remadas.