
Pela primeira vez na história da Expointer, os números de vendas de máquinas e implementos agrícolas deverão não ser divulgados neste ano. Segundo representantes do setor, os negócios na feira estão travados devido aos altos juros, o endividamento dos produtores rurais gaúchos e pela demora na liberação de recursos do Plano Safra 25/26.
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Um dos principais entraves está no travamento das linhas do Moderfrota (Programa de Modernização da Frota de Tratores Agrícolas e Implementos Associados e Colheitadeiras). Em julho, houve queda de 96% nos repasses do programa a bancos, revendedores e produtores segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) compilados pelo Sindicato das Indústrias de Máquinas e Implementos Agrícolas no Rio Grande do Sul (Simers).
Para Claudio Bier, presidente do Simers e da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), o setor enfrenta os efeitos da forte crise que vive o campo gaúcho, com endividamentos rurais se acumulando após sucessivas quebras de safra devido aos problemas climáticos. Além disso, as condições de juros elevados afastam os negócios. “Estamos em uma ‘tempestade perfeita’. Tivemos quatro secas consecutivas e uma enchente. E os juros estão altíssimos, uma taxa Selic a 15% significa financiamentos a, pelo menos, 20% ao ano. A atividade não comporta isso”, afirma
Segundo Bier, a maioria dos 120 expositores do setor de máquinas e implementos agrícolas pediu para que não fossem divulgados os números de vendas da Expointer neste ano, pois estão muito baixos. “Todo ano a gente faz esse acompanhamento, e esse ano não foi realizado a pedido das empresas”, afirmou.
Desta forma, a feira realizada em Esteio (RS) deve seguir o exemplo da Expodireto, de Não-Me-Toque (RS), que também não divulgou os dados de negócios. Na edição de 2024, o setor de máquinas e implementos havia registrado pedidos de R$ 7,393 bilhões na Expointer.
Produtores confirmam dificuldades
Segundo levantamento da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), 65 mil produtores rurais gaúchos somam dívidas de R$ 27,4 bilhões junto às principais instituições financeiras que operam crédito rural no Estado (Banco do Brasil, Sicredi e Banrisul). Essa crise de endividamento tem gerado dificuldades para a aquisição de máquinas pelos produtores rurais.
Jairo Bueno, produtor de Capivari do Sul (RS), negociou colheitadeira da John Deere na feira
John Deere/Divulgação
“O sistema financeiro ficou muito mais exigente. Para ter crédito aprovado junto ao banco, o produtor, que antes poderia fazer garantias de aval ou um penhor da safra futura, hoje tem que apresentar uma garantia real, como área de terras, que às vezes já está usada em outra operação financeira, dificultando acesso a dinheiro novo”, explica Jairo Bueno, produtor de soja e arroz e criador de gado em uma área de 2.300 hectares em Capivari do Sul (RS). “Hoje só compra quem tem extrema necessidade, porque senão não há condições para fazer negócios”, afirma.
Bueno fez um pedido junto à John Deere para a compra de uma colheitadeira para atualizar sua frota com melhores tecnologias. No entanto, esperou a Expointer para fazer negócios devido às melhores condições oferecidas durante a feira. “Como o mercado de grão está retraído, são justamente os estímulos das feiras que nos dão o impulso para suprir as necessidades que a gente tem”, destaca.
O pequeno produtor Nilo Jotz, de Alto Feliz (RS) também esperou a Expointer para negociar um trator com a Valtra. “Estou pesquisando desde janeiro, mas na feira tem preços e condições melhores”, afirmou.
Jodz, que planta milho para silagem em 7,5 hectares, fez o pedido da máquina para a Valtra e quer fechar o negócio até o fim do mês para aproveitar condições mais vantajosas oferecidas na feira. No entanto, mesmo sendo pequeno produtor, não sabe se conseguirá as linhas subsidiadas do Pronaf para a aquisição de máquinas devido às exigências necessárias. “As máquinas estão muito caras e tem muita burocracia para conseguir algo pelo Pronaf. Ainda vamos ver como poderemos fazer a compra”, disse.
Nilo Jotz, de Alto Feliz-RS, esperou a Expointer para negociar um trator da Valtra
Valtra/Divulgação
Expectativas do setor
O presidente do Simers não vê grandes possibilidade de recuperação do setor de máquinas no Rio Grande do Sul até o fim do ano. “Tem muita gente que não quer fazer financiamento neste momento porque está esperando como fica o cenário político e econômico. Mas plantio dos grãos já está começando, então não deverá haver tempo do pessoal comprar máquinas ainda em 2025”, comenta Claudio Bier.
A falta de recursos dos produtores e os juros altos também preocupam Hugo Mário Boff, sócio-administrador da Mepel, fabricante de implementos agrícolas, como distribuidores de adubo, semeadoras e bombas. “Muita gente não vai conseguir entrar na linha de créditos oferecido pelo Plano Safra, especialmente para investimentos”, afirmou.
Sem abrir números, a empresa sediada em Estação (RS) ainda espera um crescimento no faturamento em relação a 2024. No entanto, destaca que, embora a receita cresça, a rentabilidade está mais desafiadora. “Os custos de produção aumentam de 10% a 15% por ano”, afirma
Segundo o empresário, a expectativa de aumento de receita deve-se, especialmente, às vendas para o Centro-Oeste, em especial para segmentos de cana-de-açúcar, área florestal e combate a incêndios. “Nossos equipamentos são de valores menores do que grandes máquinas, transitam de R$ 50 mil a R$ 400 mil, então é mais fácil para o produtor financiar. Mas, para grandes máquinas, haverá mais dificuldades”, destaca.
Hugo Mário Boff, sócio-administrador da Mepel, espera um crescimento no faturamento em 2025
Marcelo Beledeli/Globo Rural
Para a Valtra, o produtor deve adotar uma postura mais cautelosa diante do cenário econômico atual e as incertezas climáticas. Ainda assim, os números mais recentes da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ) mostram que as vendas internas de tratores, segmento onde a marca atua, mantêm um desempenho positivo.
“No mês de julho as vendas internas de tratores e colheitadeiras tiveram um crescimento de 19,3% em relação ao mesmo período de 2024. Só os tratores acumulam alta de quase 20% nas vendas internas no comparativo anual. Esse desempenho reforça nosso otimismo, sempre cauteloso, para o fechamento de 2025”, afirma Claudio Esteves, diretor de vendas da Valtra.
Breno Cavalcanti, diretor de Marketing da Massey Ferguson, espera que os negócios se restabeleçam no Rio Grande do Sul. Apesar das dificuldades, o estande da marca na Expointer estava bastante movimentado. “A gente tenta achar ferramentas para ajudar o produtor a fechar negócios. O consórcio, por exemplo, vai indo muito bem, devemos crescer 20% nesta modalidade em 2025”, destaca.
Segundo o executivo, nas feiras que a Massey esteve presente nos primeiros meses do ano havia um humor melhor do produtor. “Vemos um crescimento de tratores linha leve, mas mais dificuldades em produtos de cavalagens maiores, devido às baixas dos preços das commodities”, explicou.
Breno Cavalcanti, diretor de Marketing da Massey Ferguson
Marcelo Beledeli/Globo Rural