A erva-mate já foi conhecida como “ouro verde do Paraná”, devido à importância econômica do início do século 19 até 1930. E, agora, pode entrar em um novo ciclo de desenvolvimento no Estado, principal produtor nacional. Projetos para reposicionar o produto, consolidar presença – inclusive internacional -, e impulsionar inovações na cadeia produtiva estão em andamento para ampliar a rentabilidade de quem cultiva. Em 2024, a produção da erva-mate gerou um Valor Bruto de Produção de R$ 1,3 bilhão.
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As irmãs Ângela e Ana Cláudia Zampier são produtoras de erva-mate há 30 anos em São Mateus do Sul e Rebouças – municípios do Centro-Sul do Estado que integram a área com Identificação Geográfica (IG) do produto. Cultivam mais de 80 hectares, com produção de aproximadamente 120 toneladas anuais. Para Ângela, ainda há muito trabalho a ser feito para a conquista de um reconhecimento maior.
“A IG foi um degrau, pois valoriza nossa história e tradição. Mas ainda temos que conquistar mercado, mostrar os diferenciais do nosso produto e, com isso, melhorar a rentabilidade”, afirma. Aumentar a lucratividade aos produtores é um dos objetivos de uma parceria estratégica iniciada entre a Invest Paraná – agência de promoção e atração de investimentos do governo estadual – e as universidades estaduais de Londrina (UEL) e do Paraná (Unespar).
O projeto, que visa dinamizar a cadeia produtiva da erva-mate paranaense, tem financiamento de R$ 500 mil do Fundo Paraná de fomento científico e tecnológico. Entre as metas, prevê o aprimoramento de boas práticas agrícolas e de rastreabilidade da cadeia produtiva da erva-mate paranaense.
Outra ação é o Novo Arranjo de Pesquisa e Inovação (Napi) Erva-Mate: Inovação e Valorização, lançado em novembro. A iniciativa reúne universidades, centros de pesquisa e representantes do setor produtivo em torno de ações voltadas à adoção de sistemas de cultivo mais sustentáveis e eficientes, à otimização de processos industriais e à diversificação dos usos da matéria-prima. O Napi Erva-Mate tem investimento de R$ 3,9 milhões da estatal Fundação Araucária.
Segundo a professora Vânia de Cássia Fonseca Burgardt, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e articuladora do Napi, o projeto busca integrar toda a cadeia produtiva, da produção primária ao consumo final, promovendo inovação e maior competitividade.
“Queremos desenvolver formas de produção mais rentáveis, que permitam ao pequeno produtor obter um ganho maior. Além disso, buscamos reduzir contaminantes que dificultam a exportação, garantindo um produto de maior qualidade e valor agregado”, explica.
Rentabilidade
Segundo Bruno Banzato, gerente de Desenvolvimento Econômico da Invest Paraná, um dos resultados esperados da parceria com as universidades é dobrar o valor pago pelo quilo da erva-mate produzida no cultivo sombreado, sistema que corresponde a perto de 70% da produção estadual. “Essa iniciativa deve gerar um adicional aproximado de R$ 230 milhões em renda aos produtores”, projeta.
Atualmente, a agência calcula que o Paraná conta com cerca de 30 mil produtores de erva-mate, que adotam os sistemas de cultivo sombreado na mata nativa e a pleno sol. A produção chegou a aproximadamente 900 mil toneladas em 2024, segundo o Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento.
Os outros estados produtores são Rio Grande do Sul, com produção de 283,6 mil toneladas em 2024; Santa Catarina, com 104,6 mil toneladas; e Mato Grosso do Sul, com 760 toneladas, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A IG foi um degrau, pois valoriza nossa história e tradição. Mas ainda temos que conquistar mercado, mostrar os diferenciais do nosso produto e, com isso, melhorar a rentabilidade
Além da produção maior, o Paraná registrou crescimento mais acelerado na cultura, em relação à safra anterior, do que os demais estados produtores. Enquanto a produção paranaense teve aumento de 5,2%, o Rio Grande do Sul registrou 4,6% e Santa Catarina 2,5% de crescimento.
Os gaúchos são os principais exportadores. De acordo com dados do Comexstat, sistema de estatísticas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), o Rio Grande do Sul movimentou US$ 79,98 milhões com vendas externas de erva-mate em 2024 (mais de 80% do volume exportado pelo país).
O Paraná, por sua vez, exportou US$ 12 milhões – crescimento de US$ 4,34 milhões em relação ao ano anterior, quando o Estado ocupava a terceira colocação nacional. Com esse resultado, o Paraná ultrapassou Santa Catarina e passou a figurar como segundo maior exportador do país. Os dados catarinenses ainda não foram confirmados. Os principais destinos da erva-mate brasileira em 2024 foram Uruguai, Argentina e Síria.
Guilherme Gonçalves de Albuquerque, economista do Deral, destaca que a taxa de crescimento da produção de erva-mate no Paraná mostra o fortalecimento e o potencial da atividade no Estado. Albuquerque comenta que, mesmo ficando bem abaixo da representatividade econômica de commodities como soja e milho no Paraná, a erva-mate ganha muita relevância na região produtora.
“Se colocarmos uma lupa, para alguns municípios como Cruz Machado, o primeiro do ranking estadual em VBP da cultura, a produção de erva-mate representa 1/4 das riquezas geradas pela agricultura”.
Uma das empresas que absorvem a produção paranaense é a Leão. Subsidiária da Coca-Cola, a empresa tem participação de 85% no mercado de erva-mate tostada. Em 2024 a empresa comprou 7,2 mil toneladas e produziu 1,3 tonelada de extrato de mate na unidade de Fernandes Pinheiro, a 150 km de Curitiba. Atualmente, tem 12 ervateiras como fornecedores diretos, com um número de produtores vinculados ficando entre 100 e 300 produtores por fornecedor.
Com share de 55% no mercado de chás e bebidas para infusão no Brasil, a empresa está apostando na erva-mate verde, com o lançamento dos novos produtos chimarrão e tereré. “Ao entrar nesse segmento, ampliamos ainda mais a nossa presença no setor de erva-mate em um movimento estratégico para a expansão da marca, já que a categoria de mate verde tem grande representatividade no volume do mercado brasileiro”, avalia Marcelo Correa, CEO da Leão.
Padrão de qualidade
Para chegar ao patamar esperado no Paraná, incluindo a ampliação das exportações, uma das frentes de atuação da parceria entre o Estado e as universidades pretende identificar o padrão de qualidade da erva-mate produzida no Estado, por meio de análises químicas e sensoriais. Em paralelo, os parceiros vão promover a adoção de um software desenvolvido especificamente para o setor para concentrar as informações de rastreabilidade da cadeia.
Banzato ainda acrescenta que o trabalho envolverá um reposicionamento de marketing, com base na qualidade e na tradição do produto, para mostrar os diferenciais da erva-mate paranaense. Atualmente, a erva-mate do Estado está presente em países como Uruguai, Argentina, Alemanha e Estados Unidos, conforme levantamento do Deral. “Ainda temos muito espaço para crescer”, avalia.
Além do chimarrão e do tereré. Parceria entre governo do Estado e universidade prevê diversificação de uso da erva-mate
Invest Paraná
Integrante do Napi Erva-Mate, a Embrapa Florestas atua na validação de genótipos com características químicas e sensoriais diferenciadas, além da implantação de sistemas de cultivo inovadores e estudo de viabilidade econômica. “A erva-mate tem tudo para se expandir. No programa de melhoramento genético, o foco são novas aplicações, uma vez que o chimarrão já tem uma cadeia bem estabelecida”, explica Ivar Wendling, pesquisador da Embrapa Florestas.
Entre as principais características de variedades já disponíveis ou ainda previstas para chegar ao mercado, estão aumento de produtividade, sabor mais suave e menores teores de cafeína. Dessa maneira, a erva-mate ganha espaço além do chimarrão, do tererê e do chá. Aparece também como ingrediente de energéticos, chocolates, farinhas, sucos e até cerveja, assim como para as áreas farmacêutica e de cosméticos. “O resultado será um melhor rendimento para o produtor”, acredita.
*Colaborou Maria Emília Zampieri, de Vinhedo (SP)