Caso ganhe escala suficiente, a agricultura regenerativa poderá responder ao desafio da agropecuária de “produzir mais com menos” e também de contribuir para mitigar os efeitos da crise climática, segundo participantes do painel “Como ganhar escala globalmente e impulsionar o Brasil como celeiro do mundo em produção sustentável”, que fechou a programação do primeiro Summit Agricultura Regenerativa. A Globo Rural realizou o evento hoje, em São Paulo.
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As práticas de agricultura regenerativa ajudam a aumentar a produtividade, tornam as plantas mais resilientes a problemas climáticos e reduzem os custos de produção, diz Eduardo Cerri, professor titular da Esalq/USP e diretor do Centro de Pesquisa em Carbono na Agricultura Tropical (Ccarbon). Segundo ele, esses atributos ratificam a importância de dar escala a essas práticas.
“Todos os nossos estudos apontam que os produtores que adotam os princípios das boas práticas têm clara vantagem. A agricultura regenerativa é, ao mesmo tempo, uma resposta às mudanças climáticas e ao crescimento da demanda por alimentos”, analisou.
Ele raciocina que, com o aumento da população, o mundo precisará de volumes cada vez maiores de alimentos, fibras e combustíveis. Ao mesmo tempo, vários países têm reduzido sua produção desses itens, o que demonstra a importância de fomentar o modelo regenerativo entre os produtores brasileiros.
“Em grande medida, a responsabilidade de produzir de forma sustentável e com volume é do Brasil. A boa notícia é que não só nós sabemos como fazer isso, como já fazemos”, completou.
Marcello Brito, enviado especial da COP30, Conferência do Clima que a Organização das Nações Unidas (ONU) realizará em Belém em novembro, diz que é preciso criar incentivos para dar escala às iniciativas de agricultura regenerativa.
“O agricultor recebe em média 8% do valor que os consumidores pagam pelos alimentos. Outros elos da cadeia ficam com 92%. E é dessa pequena fração que se cobram todas as transformações. Por isso o incentivo é importante”, comentou.
Para ele, o agro precisa de uma rede mais bem estruturada para atender especialmente os médios e pequenos produtores, já que os grandes são capazes de avançar de forma independente.
“Apesar das linhas de financiamento público, a agropecuária brasileira tem paradoxos que impedem justamente o avanço da sustentabilidade. Veja a precariedade do seguro rural ou a resistência da sociedade à produção no campo. Se não mudarmos essa mentalidade, tudo fica mais difícil”, destacou.
Trajetória brasileira
O Brasil ainda precisa dar passos adiante na adoção de boas práticas no campo, mas é igualmente importante apontar a evolução que o país construiu até o momento, avalia Jonathas Moreira Alencar, coordenador-geral de Instrumentos de Mercado e Financiamento do Ministério da Agricultura. É o caso, diz ele do financiamento “verde” do Plano Safra.
“É importante valorizarmos até onde nós já chegamos. Dentro do Plano Safra, o Plano ABC, ou o Renovagro (novo nome da política pública de financiamento da agricultura de baixa emissão de carbono), são políticas de Estado consolidadas há anos. Sem citar o recente Plano Nacional de Recuperação de Áreas Degradadas”, citou.
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Segundo ele, o governo já firmou acordos com o BNDES e avança nas tratativas com parceiros internacionais, como Japão e Emirados Árabes Unidos, para recuperar áreas degradadas. O objetivo das iniciativas é ofertar R$ 32 bilhões em crédito para a recuperação de 40 milhões de hectares que tenham potencial agrícola.
“O governo fará um aporte catalisador de R$ 17 bilhões e visa a obter outros R$ 15 bilhões de parceiros internacionais com esse objetivo. O maior desafio para esse fundo tem sido o câmbio nesse momento, que pode gerar mais risco os produtores”, afirmou.
Financiamento verde
Fabíola Zerbini, diretora da Conexsus, chamou atenção para a relevância de pequenos produtores e assentados nos esforços ambientais e também de aumento da segurança alimentar. Esse público, diz, é justamente o que tem mais dificuldade para acessar o financiamento governamental.
“O potencial desse grupo de produtores é subestimado e até mesmo excluído dos modelos de financiamento verde. É muito importante olhar com carinho para esse grupo para ele não ficar pelo caminho na esteira burocrática do crédito rural”, disse.
A Conexsus é uma organização sem fins lucrativos que ajuda pequenos produtores que buscam acesso a crédito para investir na transição para a economia de baixo carbono. Fabíola observa que produtores que acessam financiamentos na faixa entre R$ 4 mil e R$ 12 mil cultivam em torno de 100 milhões de hectares em todo país.