A COP 30, Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, é uma oportunidade para o Brasil fortalecer sua posição na agenda climática e ampliar o debate sobre questões ambientais. A avaliação é de especialistas ouvidos pela reportagem. O evento começa, oficialmente, na segunda-feira (10/11), com a participação de representantes de mais de 180 países, em Belém, capital do Pará.
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“Nesse enfrentamento que estamos vendo no mundo, as COPs sempre trazem um fruto importante, que é ampliar o debate em várias cadeias. A gente sai como uma sociedade mais evoluída com a realização dessa COP”, avalia o secretário-executivo do Consórcio dos Estados da Amazônia Legal, Marcello Brito.
Brito menciona como exemplo o debate sobre sistemas alimentares, que ganhou evidência, na COP 27, em Sharm-el-Sheik, no Egito, e prosseguiu, tratando de como tornar a produção de alimentos mais resiliente aos efeitos das mudanças climáticas, enquanto abastece a população global.
“Se não tivesse lançado esse debate [sobre sistemas alimentares] no Egito, não estaríamos discutindo tão fortemente”, afirma, em entrevista à Globo Rural.
Na quinta e sexta-feira passadas, o Brasil sediou a Cúpula do Clima, que antecede a COP. E o governo brasileiro procurou marcar sua posição nos debates da Conferência, que vai até 21 de novembro. Em mais de um pronunciamento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou em transição justa, combate ao desmatamento e ações concretas para combater o aquecimento global.
O ano de 2025 marca uma década do Acordo de Paris. Na avaliação do presidente brasileiro, o mundo continua longe de atingir os objetivos do tratado. Afirmou que há necessidade não apenas de aplicar o que já foi assinado, mas adotar medidas adicionais. E prometeu que a COP 30, em Belém, será o lugar da renovação do compromisso que os líderes internacionais firmaram dez anos atrás.
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A transição energética foi um dos principais assuntos da Cúpula do Clima, reafirmando a necessidade de substituir os combustíveis fósseis por fontes renováveis e menos poluentes de energia. Veio do secretário-geral das Nações Unidas, Antônio Guterres, o argumento de que apostar nos fósseis é ir contra a humanidade e suas próprias economias. “É autodestrutivo”, disse ele.
Petróleo x Transição energética
Sede da Cúpula e da COP 30, o Brasil deve ampliar a exploração de petróleo, enquanto defende a limpeza da matriz energética. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedeu à Petrobras uma licença de perfuração de um poço na margem Equatorial do Rio Amazonas, decisão que recebeu críticas de ambientalistas.
Ainda assim, em um novo pronunciamento na Cúpula, Lula defendeu que o mundo reduza a dependência do petróleo, e sugeriu o direcionamento de parte dos lucros com sua exploração para projetos de limpeza da matriz energética, especialmente nos países em desenvolvimento. E disse que o mundo precisa do que chamou de “caminho claro” para abandonar as fontes fósseis de energia.
Para Marcello Brito, o curto espaço de tempo entre a autorização do Ibama à Petrobras e a COP 30 não é coincidência. Em sua avaliação, foi algo pensado para se “amadurecer” o debate sobre o assunto no Brasil.
“Até o momento, o debate sobre isso foi ‘sou a favor ou contra’. Não tem um diálogo central de saber quais são os prós e contras para a sociedade, o meio ambiente. Tem os ‘torcedores’ dos dois lados”, afirma ele, que também é enviado especial do Brasil à COP 30 para os estados da Amazônia.
Saiba-mais taboola
Especialista em negócios atrelados a questões climáticas, Pedro Plastino considera que esse aparente conflito entre a agenda ambiental e a exploração de petróleo na região amazônica faz parte do cenário de transição enérgica. Ele avalia que o Brasil está em transição, mas pondera que o combustível fóssil ainda tem uma presença marcante na economia.
“Seria burrice o governo brasileiro adotar uma postura negacionista de que não precisa fazer a transição para uma economia de baixo carbono. Estamos em transição e o Brasil faz isso. Mas o velho ainda está presente. O dia que a gente encontrar uma solução para acabar com os combustíveis fósseis, o Brasil, acredito, vai ser o primeiro a adotar”, diz ele, citando iniciativas como a Lei Combustível do Futuro.
Plastino avalia que o Brasil deve sair fortalecido da COP 30, tanto do ponto de vista geopolítico, quanto de liderança na agenda ambiental e climática. Ele destaca que o país, ao sediar o evento, assume uma posição de liderança e tem uma relação mais próxima da União Europeia, enquanto os Estados Unidos, agora sob o governo de Donald Trump, não enviaram representantes a Belém e já anunciaram que estarão fora do Acordo de Paris a partir do ano que vem.
“Agro entende que clima é discussão de negócios”
O especialista tem uma perspectiva otimista da participação do agronegócio na COP 30. Em sua visão, o setor compreendeu que a discussão sobre as mudanças climáticas ultrapassou os ambientes acadêmico e político e está se tornando, cada vez mais, uma discussão de negócios.
“O agro hoje entende que não só pode reduzir impactos como ganhar dinheiro com isso. Tem que participar e já está participando dessa agenda. A maior motriz econômica do Brasil é o agro e, por consequência, a maior motriz da agenda de redução de emissões vai para o agro também”, diz ele.
Ludmila Rattis, professora da Fundação Dom Cabral (FDC) e pesquisadora do Woodwill Climate Research Center, a agropecuária brasileira precisa reconhecer a importância da Conferência do Clima. Ela afirma que, devido a compromissos que o país assumiu em conferência anteriores, a agricultura conseguiu reduzir suas emissões entre 7% e 11% por ano entre 2010 e 2023.
“São ganhos consideráveis que a gente conseguiu com políticas, planos”, avalia, em entrevista à Globo Rural, mencionando entre iniciativas que considera positivas o Plano de Agricultura de Baixo Carbono (ABC), rebatizado de RenovAgro, e a Moratória da Soja.
Em meio às discussões sobre o papel do setor na agenda climática, entidades ligadas ao agro criticam como o Plano Clima situa os impactos ambientais do campo. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, chegou a dizer que pediria ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para adiar o lançamento. Apesar das divergências, o Executivo ainda trabalha com a meta de entregar o documento durante a Conferência da ONU.