Nem toda planta precisa do sol para viver — e algumas parecem ter escolhido a sombra de propósito. Nas florestas úmidas do Japão, há espécies brancas e translúcidas que lembram pequenas esculturas de vidro e crescem em total escuridão.
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Em vez de transformar luz em energia, como a maioria das plantas, elas se alimentam de fungos subterrâneos. Chamadas de flores-fantasma, essas espécies intrigam pesquisadores há décadas. Na Universidade de Kobe, o botânico Kenji Suetsugu se dedica a entender como essas plantas conseguiram abrir mão da fotossíntese e sobreviver em locais onde a luz quase não chega, mantendo uma complexa relação de troca com fungos que vivem no solo.
De acordo com a revista científica Science, Suetsugu é um dos principais especialistas do mundo em plantas micoheterotróficas — grupo formado por espécies que vivem em simbiose com fungos e se conectam indiretamente a árvores e outras plantas para obter energia.
Essas conexões ocorrem por meio das hifas, filamentos microscópicos que formam uma rede subterrânea intrincada. O resultado é uma relação de dependência em que a planta, incapaz de produzir seu próprio alimento, absorve o carbono que os fungos retiram das árvores, em um tipo de parasitismo invisível.
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Atualmente, são conhecidas cerca de 600 espécies que abandonaram completamente a fotossíntese, sendo quase metade delas orquídeas. Outras 33 mil dependem desse tipo de interação apenas em parte do ciclo de vida, especialmente nas fases iniciais.
Acredita-se que essa estratégia de sobrevivência tenha surgido mais de 40 vezes de forma independente ao longo da evolução vegetal, sempre como resposta à escassez de luz em florestas densas.
Entre as descobertas mais conhecidas do pesquisador está a Monotropastrum kirishimense, uma orquídea rosada e translúcida restrita a áreas específicas do oeste do Japão. Por muito tempo, ela foi considerada apenas uma variação da M. humile, mas análises genéticas revelaram diferenças suficientes para classificá-la como uma espécie nova, hoje listada como criticamente ameaçada de extinção.
As pesquisas de Suetsugu também trouxeram novas informações sobre a reprodução e a dispersão das flores-fantasma. Em 2017, ele documentou pela primeira vez que pequenos invertebrados, como grilos-do-mato e tatuzinhos-de-jardim, comem os frutos dessas plantas e espalham suas sementes nas fezes. Outras espécies desenvolveram mecanismos de autopolinização, garantindo a formação de sementes mesmo na ausência de polinizadores.
Além de ampliar o conhecimento sobre um grupo de plantas pouco estudado, o trabalho de Suetsugu ajuda a compreender melhor a dinâmica subterrânea das florestas. As interações entre raízes, fungos e plantas micoheterotróficas revelam que a vida vegetal vai muito além do que é visível na superfície. “A sensação de admiração que elas me inspiraram permanece comigo”, disse o pesquisador à Science.