
A menos de um mês do início do plantio da safra de soja 2025/26 no Brasil, as projeções de consultorias e analistas são de que a área de cultivo crescerá no país, mas num ritmo mais lento que em ciclos anteriores. Isso porque o aumento nos custos de produção e as incertezas na arena geopolítica têm gerado um sentimento de cautela entre os produtores, que devem ver suas margens mais apertadas.
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Levantamento da Pátria Agronegócios é um dos que mostram a postura menos otimista para o novo ciclo. A consultoria estima que o país deverá plantar 48,13 milhões de hectares de soja a partir de setembro. Apesar de um incremento de 1,43% em relação à área cultivada na temporada passada, esse é o menor crescimento desde 2006/07.
“Há um desânimo dos produtores por conta de um cenário que é formado por baixa nos preços das commodities, alta do custo e incertezas na economia. No ano passado, o Brasil foi o país que mais perdeu capital estrangeiro no mundo. O investidor olha para esse cenário e decide tirar o pé do acelerador para expandir o próprio negócio, e no agro não é diferente”, avalia Matheus Pereira, diretor da Pátria Agronegócios.
Rodolfo Prante é diretor operacional da Flora Agronegócio, que produz grãos e fibras em Goiás e Mato Grosso. Ele afirma que neste ano vai manter a mesma área destinada à soja em 2024. “Estamos mais cautelosos com a safra. Tínhamos área para expandir a soja, mas não fizemos por causa da incerteza em torno da política e do crédito rural. Além disso, tivemos uma baixa [no preço] dos químicos, mas que foi compensada pela elevação do adubo”, afirma.
De acordo com Prante, inicialmente, a expectativa de margem com a soja nas áreas da Flora é de ficar no “zero a zero”.
“Nosso desafio é trabalhar nossa margem com a melhora nos resultados de colheita. Acredito que isso não deve acontecer só no Brasil, porque o mundo vem de safras boas, e os estoques estão altos. Isso sempre traz reflexo negativo para o preço”, observa.
Flávio Roberto de França Júnior, analista da consultoria Datagro, cita o aumento das despesas com fertilizantes como um dos fatores para a cautela dos produtores. Ele projeta um gasto até 10% maior para os sojicultores. Ainda vê margens positivas para 2025/26, porém condicionadas ao desempenho no campo.
“Ainda há muitas variáveis que podem impactar a renda do produtor em 2025/26. A renda cresceu 20% este ano, mas muito em função de um preço melhor e redução dos gastos que o produtor teve para plantar no ano passado. Ele pode ter lucro nessa nova safra, mas precisa torcer para repetir o desempenho de produtividade desta safra [2024/25]”.
Segundo projeções da Datagro, o Brasil irá registrar o 19º ano consecutivo de expansão na área de soja. Os produtores devem semear 49,10 milhões de hectares, 2% a mais que em 2024/25.
Clima também gera apreensão
O clima também pesa na decisão do produtor de ampliar a área ou não. No caso de Donato Hugo Beltramim, sojicultor de Francisco Alves, no oeste do Paraná, a estiagem e a irregularidade das chuvas nas últimas três temporadas o fizeram mudar a estratégia de cultivo.
“Tivemos muitas frustrações de safra nos últimos anos, que diminuíram minha produtividade e também a lucratividade. Estou mais cauteloso e este ano investi menos, pois também o preço não está bom e ainda vejo muita incerteza com a questão das tarifas”, relata Beltramim, acrescentando que vai manter a mesma área plantada, de 400 hectares.
Lavoura de soja do produtor Donato Hugo Beltramim em 2024. Este ano, ele deverá manter os mesmos 400 hectares plantados no último ano
Arquivo pessoal
Ele conta que reduziu em 15% as despesas com insumos em geral. Mas pondera que não vai abrir mão do investimento em adubos, que deverão auxiliar na correção e cobertura de solos para resguardar a lavoura no caso de adversidades climáticas.
“A gente tenta reduzir o custo ao máximo, para conseguir aumentar o lucro, mas em adubos e sementes não há como cortar muito o gasto, pois se houver uma seca forte, eu ainda consigo reduzir o prejuízo”, diz.
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O consultor Carlos Cogo, da Cogo Inteligência em Agronegócio, também prevê aperto nas margens na nova temporada. Mas essa projeção pode mudar, a partir dos desdobramentos da guerra comercial entre EUA e China.
“As margens estão bem achatadas este ano, e correm o risco de ficar negativas caso a China direcione suas compras de soja para os EUA. Isso deve mexer com o mercado interno, pois são as importações chinesas de soja brasileira que estão mantendo os prêmios positivos e ajudando na formação para o preço ao produtor”, frisa Cogo.
O consultor estima crescimento de 1,9% na área plantada com soja no Brasil em 2025/26, que deve atingir 48,6 milhões de hectares nesta safra. Ele ressalta que o incremento da área deverá se consolidar em Estados como Maranhão e Piauí, e ainda no Norte do Brasil, em Rondônia e Acre.
Insumos são termômetro da nova safra
A maior cautela dos produtores se observa no ritmo de encomendas de insumos. “O produtor está mais lento nas compras. Estimamos que deve ter redução do uso de tecnologia em função dos custos e dos preços das commodities.”, diz Paulo Pinto, presidente da Associação Brasileiras de Sementes de Mudas (Abrasem). Ele estima que deve haver um incremento na área plantada de soja de 1% a 1,5%.
“Por conta dos juros altos do Plano Safra, a busca por crédito de custeio está mais lenta e isso tem dificultado para o produtor fechar as compras”, diz Pinto.
De acordo com levantamento da Céleres encomendado pela Associação Brasileira de Semente de Soja (Abrass), em julho, as negociações de sementes somavam 94% da área prevista para ser plantada na região do Cerrado — um ano antes estava em 98%. Na região do Matopiba, que reúne Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, as vendas chegavam a 81% da área a ser plantada, ante 84% em junho de 2024. No Sul, o índice era de 72%, contra 75% um ano antes. A média no Brasil, no entanto, apresenta taxa de 85%, ante 82% em julho de 2024.
O Grupo Don Mario (GDM), líder no mercado de germoplasma com 80% de participação, trabalha com expectativa de aumento na área plantada de soja no Brasil entre 500 mil e 1 milhão de hectares na safra 2025/26. “Estimamos que cerca de 90% da comercialização esteja concluída no Brasil, com destaque para Paraná e Rio Grande do Sul, onde há um percentual maior negociado”, diz Julio César Poletto, líder de negócios soja e trigo da GDM.
Marino Colpo, CEO e co-fundador da Boa Safra Sementes, afirma que os produtores têm buscado sementes de maior produtividade. “Tem crescido muito a nossa venda de novas cultivares e a tendência é que continuem em expansão”, diz Colpo.
Ele estima que a área plantada de soja no Brasil crescerá entre 1,5% e 2%. “Pelas conversas que temos com os produtores, o crescimento vai ser menor por causa do custo de capital mais alto”, diz Colpo.
Renato Gomides, gerente-executivo da CropLife Brasil, associação que reúne os fabricantes de agroquímicos, diz ver aumento das negociações no Cerrado e Matopiba, em relação ao ano passado. “De forma geral, o mercado está um pouco melhor que na safra anterior, mas existe mais planejamento e muita racionalidade”, diz o executivo.