
Preço da amêndoa deve se manter entre US$ 7,5 mil e US$ 8 mil na bolsa, estimam analistas Os preços internacionais do cacau — que fizeram o chocolate virar quase artigo de luxo — mudaram de patamar. Após três temporadas de queda na produção no oeste da África, maior região fornecedora do mundo, nem a expectativa de recuperação no ciclo atual e de superávit deve alterar esse cenário, segundo especialistas.
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Até meados de 2023, o cacau era negociado na casa dos US$ 3 mil a tonelada na bolsa de Nova York, mas no fim daquele ano os problemas climáticos que afetaram a produção de Gana e Costa do Marfim alteraram as expectativas, o que levou a um movimento de alta. O pico foi no fim de 2024, quando a tonelada superou US$ 12,5 mil na bolsa.
A disparada afetou a demanda das indústrias pelo mundo e os preços estão hoje na casa dos US$ 8 mil. Os sinais de recuperação nas lavouras africanas, que concentram 70% da produção global, também contribuíram para a queda.
Embora tenha recuado, esse valor é quase 170% superior ao que se via há dois anos. Para analistas, os picos do último ano não devem se repetir, mas a faixa entre US$ 7.500 e US$ 8.500 mil deve ser o novo normal para a amêndoa. Isso significa que a pressão sobre a indústria de chocolates e sobre o consumidor deve persistir. E que a próxima Páscoa também deve ser de ovos caros.
Na atual safra 2024/25, a melhora nas condições climáticas e os investimentos do setor levaram a uma recuperação na colheita da Costa do Marfim e de Gana, que devem produzir 1,8 milhão e 700 mil toneladas, respectivamente, conforme dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).
Embora o crescimento seja positivo, o cenário de desequilíbrio entre oferta e demanda, que sustentou a alta dos preços no ano passado, ainda se mantém, observa Ricardo Gomes, gerente de Desenvolvimento Territorial do Instituto Arapyaú, organização que fomenta a produção sustentável.
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Isso porque a produção continua bem abaixo dos resultados da safra 2021/22, anteriores à crise de oferta, quando a Costa do Marfim produziu 2,12 milhões de toneladas de amêndoas, e Gana, 1,4 milhão de toneladas. “O mercado está estabilizando em um novo patamar, longe do que estávamos acostumados. E ainda continua atípico e hipervalorizado. Mesmo com essa recuperação, a oferta deve ficar longe das 5 milhões de toneladas. Ou seja, a demanda é maior do que o cacau disponível”, afirma.
Para Rafael Borges Machado, analista de inteligência de mercado da StoneX, as cotações só não subiram mais nos últimos meses porque a demanda perdeu força em decorrência dos preços mais elevados para a amêndoa.
Na safra 2024/25, a procura deve recuar 235 mil toneladas em comparação ao ciclo anterior, segundo projeções da Organização Internacional do Cacau (ICCO).
A retração na demanda das indústrias por causa da alta dos preços fez fundos de investimentos desmontarem posições de compra de contratos futuros da amêndoa na bolsa de Nova York, segundo Adilson Reis, analista especializado no mercado de cacau. Por esse motivo, diz, as cotações se distanciaram dos valores recorde do ano passado.
Análise realizada pela consultoria StoneX, a pedido da Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), afirma que o mercado futuro de cacau deve continuar volátil, com preços sustentados ao longo deste ano, mas com potencial de desvalorização a partir do último trimestre, dependendo da melhora climática e das perspectivas para a safra 2025/26.
De acordo com a análise, o clima mais seco no oeste da África durante abril e setembro (na safra intermediária) deve manter o mercado estável no patamar atual. Por outro lado, a preocupação com a demanda limita movimentos de alta.
Para Adilson Reis, enquanto o mercado não tiver certeza de melhora nos fundamentos para o cacau, será “impossível” voltar aos valores do passado. “Ainda existe um suporte para os futuros olhando para a safra intermediária na Costa do Marfim, que deve ter números piores que os do ano passado. As projeções indicam uma produção de 300 mil toneladas, enquanto a expectativa inicial era de 500 mil”, diz.
Na avaliação de Igor Mota, gerente de Agricultura de Cacau da Nestlé Brasil, a alta da commodity favorece os produtores e a própria cacauicultura. “O preço vai continuar estimulando, porque a atividade tem se mostrado rentável quando a gente compara com o custo de produção”, afirma.
Produção de cacau no Brasil
O Brasil chegou a ser um dos maiores produtores mundiais de cacau nos anos 1980. Produziu 458 mil toneladas de amêndoas em 1986, até que, em 1989, a vassoura-de-bruxa derrubou a produção para menos de 200 mil toneladas. Em 2024, a safra brasileira somou 179 mil toneladas.
Ricardo Gomes, do Arapyaú, que também é produtor de cacau em Itabuna (BA), concorda que há um interesse maior pelo cacau no Brasil, inclusive em regiões tradicionalmente conhecidas pelo cultivo de soja e milho. “Parte da motivação é uma resposta à alta [dos preços], e pela correria da própria indústria chocolateira para regular a oferta. Mas também tem ficado mais clara a oportunidade que o cacau oferece”, afirma.
O Ministério da Agricultura lançou um plano para incentivar a produção no Brasil. A meta do Inova Cacau é dobrar a produção nacional para cerca de 400 mil até 2030, para recolocar o país entre as referências de produção sustentável da amêndoa.