A concessão de crédito rural pelas linhas tradicionais do Plano Safra recuou 15% de julho a novembro de 2025 na comparação com o mesmo período do ano passado. Foram R$ 161,5 bilhões em operações de custeio, investimento, comercialização e industrialização nos cinco primeiros meses da temporada 2025/26. No mesmo intervalo, um ano atrás, foram R$ 190,3 bilhões.
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O principal recuo é dos investimentos, que saíram de R$ 49,3 bilhões para R$ 36,1 bilhões, queda de quase 27%. No custeio, o desembolso caiu 14%, de R$ 112,6 bilhões para R$ 95,1 bilhões. A comercialização diminuiu de R$ 17,1 bilhões para R$ 14,7 bilhões. Já a industrialização foi a única modalidade que registrou alta, de quase 40%, com R$ 15,4 bilhões desembolsados em cinco meses.
Os números constam na base de dados do Banco Central, atualizados até 23 de dezembro. Podem mudar conforme a data de consulta.
Ao somar os valores acessados via Cédulas de Produto Rural (CPRs) emitidas por produtores em favor das instituições financeiras, o montante total vai a R$ 262,9 bilhões, mas ainda abaixo dos R$ 268,4 bilhões de linhas e títulos de julho a novembro de 2024.
No Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) houve uma diminuição de R$ 34,2 bilhões em 2024 para R$ 33,7 bilhões em 2025. No Programa Nacional de Apoio aos Médios Produtores (Pronamp) a queda foi de R$ 38,3 bilhões para R$ 36,3 bilhões.
A redução mais acentuada na contratação do crédito rural continua na agricultura empresarial, principalmente nos investimentos. Ao todo, grandes produtores acessaram R$ 91,5 bilhões nas linhas do Plano Safra contra R$ 117,8 bilhões nos cinco primeiros meses da temporada 2024/25, quando já havia um deslocamento dos financiamentos para as CPRs.
A concessão de crédito por meio dos títulos chegou a R$ 101,4 bilhões entre julho e novembro, de acordo com balanço realizado pelo Ministério da Agricultura e compartilhado com a reportagem. No mesmo período em 2024 haviam sido desembolsados R$ 78 bilhões por meio desses títulos.
O recorte da Pasta apenas para médios e grandes produtores mostra recuos de 20% nos valores concedidos para custeio até novembro, de 43% para investimentos e 16% para comercialização.
As Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) são a principal fonte de recursos para os financiamentos da safra, com desembolso até agora de R$ 26,9 bilhões a taxas livres (12% do total para médios e grandes produtores) e R$ 20,7 bilhões a juros controlados (9%). Mesmo assim, é a poupança rural livre que cresceu na comparação com o mesmo período de 2024, com concessão de R$ 19,5 bilhões.
Nos investimentos para médios e grandes produtores, há recuos em quase todas as linhas com juros subsidiados. No Moderfrota, as contratações estão 59% menores em 2025, com apenas R$ 2 bilhões aplicados dos R$ 12,5 bilhões programados até junho de 2026. No Proirriga, destinado à irrigação, foram desembolsados apenas R$ 285 milhões dos mais de R$ 2,7 bilhões previstos.
O número de contratos de médios e grandes produtores nas linhas de crédito rural caiu 32% até novembro, para 123,3 mil.
Dos R$ 113,3 bilhões programados em linhas com recursos equalizados de custeio, comercialização e investimentos, apenas 33% do saldo (R$ 37,2 bilhões) foram utilizados até o fim de novembro. No caso dos investimentos, quase 80% dos valores ainda estavam disponíveis até o início de dezembro.
Cenário de retração
Rogério Boueri, consultor da Sapeba Agroambiental, avalia que os números de concessão de crédito abaixo dos patamares observados em 2024 mostram um cenário apertado e de retração para 2026.
“Os bancos estão muito preocupados com a inadimplência, principalmente de pessoa física a taxas livres, que chegou a 11,4% em outubro e está puxando a carteira total da pessoa para mais de 6% de inadimplência”, afirmou.
O impacto de eventual redução dos juros para reversão desse quadro para o agronegócio deve ser “lento e ainda com muita fricção”, disse o consultor, que é ex-secretário de Política Agrícola e Negócios Agroambientais do Ministério da Fazenda. “Mesmo que reduza juros em 2026, não vai melhorar o panorama do crédito rural especialmente porque a outra solução seria ter mais dinheiro do governo para renegociação”, apontou.
Segundo ele, a vida do governo poderá ser ainda mais difícil na formulação do próximo Plano Safra, que valerá a partir de julho de 2025. Com mais pressão para fortalecer o seguro rural, ele vê espaço para reduzir valores gastos na equalização de juros. A conta ficará ainda mais apertada porque boa parte do orçamento atual tem sido gasto para prorrogar ou renegociar operações, sem gerar financiamento novo.
“O fluxo é prejudicado, pois as operações prorrogadas ficam comendo equalização durante o período da renegociação. Todos os aspectos levam para um Plano Safra mais duro”, opinou.
Com índices de exigibilidades altos, haverá mais dificuldades para “gerar dinheiro novo”, disse Boueri. “Se a Selic cair, o governo pode optar por cortar os juros do Plano Safra em proporção menor para fazer render mais seu orçamento”, avaliou.
Ele ainda mostra preocupação com ajustes feitos nas regras das LCAs, como alteração no prazo de liquidação e aumento do direcionamento, atualmente em 60%. “Tem algumas barbeiragens que tiram a atratividade”, disse. “Quanto mais aumenta exigibilidade, menos dinheiro volta livre para o banco, menos atrativa fica a operação com LCA. Com exigibilidade maior e prazo mais longo, o mercado também não gosta. Isso pode dificultar o grande motor do crédito rural”, completou.