Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP), e da Universidade de Tübingen, na Alemanha, descobriram um mecanismo sofisticado de ataque da bactéria Xanthomonas citri, causadora do cancro cítrico. O resultado da pesquisa foi divulgado nesta quinta-feira (18/12) no site da revista Science.
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Os resultados da pesquisa abrem caminho para o desenvolvimento de mecanismos mais eficazes de controle da doença, que já causou bilhões de dólares de prejuízos aos países produtores. Além disso, a pesquisa trouxe conhecimentos sobre o processo de controle do amadurecimento de frutos, o que poderá beneficiar o setor de fruticultura como um todo.
O estudo revela que a bactéria usa ao mesmo tempo dois sistemas de secreção, um para desativar as defesas de planta e outro para liberar enzimas que degradam a planta.
Os pesquisadores identificaram que a bactéria causadora do cancro cítrico invade a planta e injeta nela uma proteína chamada PthA4, que estimula a ação do gene CsLOB1, que é associado ao amadurecimento de frutos.
Mario Murakami, diretor do Laboratório Nacional de Biorrenováveis (LNBR) e coordenador das pesquisas do CNPEM, explica que, quando esse gene é “ligado” fora do contexto natural, a planta passa a produzir enzimas que degradam a parede celular da planta, liberando açúcares das paredes celulares, como glicose, frutose e xilose. A bactéria se alimenta desses açúcares e se multiplica, agravando a doença.
Para a planta, um dos impactos é o amadurecimento precoce do fruto. Com isso, os frutos caem antes do tempo e em número maior que em uma planta sadia, reduzindo sua produtividade.
“A grande descoberta que o trabalho mostra é que a bactéria ‘sequestra’ a via de amadurecimento de frutos para promover o seu crescimento. Entender esse mecanismo vai ajudar a desenvolver novas formas de tratamento contra o cancro cítrico”, afirma Murakami.
Os resultados abrem caminho para o desenvolvimento de formas de controle mais eficazes do cancro cítrico. Uma das possibilidades é a criação de versões de citros editados geneticamente, para impedir que a proteína injetada pela bactéria na planta consiga “ligar” o gene CsLOB1.
Outra possibilidade é o desenvolvimento de moléculas (defensivos químicos) capazes de interromper a liberação ou o consumo de açúcares da planta pelas bactérias.
O impacto comercial é de longo prazo. Murakami observa que, como a citricultura é de ciclo longo, as pesquisas de edição genética para desenvolver plantas com resistência ao cancro cítrico podem levar de cinco a sete anos.
Da mesma forma, o desenvolvimento de defensivos agrícolas demora anos até o lançamento comercial dos produtos.
Impacto na fruticultura
Uma outra descoberta do estudo promete ter impactos para toda a fruticultura. A pesquisa revelou que o gene CsLOB1 é naturalmente ativo no amadurecimento de frutos. Foram encontrados indícios de que mecanismos semelhantes operam em tomateiros, o que mostra que esse tipo de controle molecular pode ser conservado em outras espécies.
“Essa descoberta não se limita à citricultura porque o processo de controle de amadurecimento de frutos é conservado em outras plantas. Essa descoberta vale para qualquer planta frutífera, e também para algumas não frutíferas. E pode servir como ferramenta para controlar o ritmo de amadurecimento dos frutos, aumentando a vida de prateleira do fruto naturalmente. Em termos de segurança alimentar isso é muito importante”, afirmou Murakami.
Murakami disse que além do trabalho com tomateiros, os pesquisadores vão realizar estudos com outras plantas frutíferas.
Cancro cítrico
No mundo, o cancro cítrico já exigiu a remoção de 16 milhões de árvores para controle da doença, custando bilhões de dólares aos países produtores. No Brasil, de acordo com levantamento do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), houve aumento da incidência do cancro cítrico neste ano de 34% em relação a 2024. A doença está presente em 32,71% dos talhões de laranjeiras no parque citrícola paulista e do Triângulo Mineiro.
O levantamento também revelou que 25,56% das árvores têm cancro cítrico. Essa incidência corresponde a 53,44 milhões de árvores e é 32,43% maior que a de 2024. O cancro cítrico ataca os frutos, folhas e galhos, causa a queda prematura de frutos e reduz a produtividade das plantas.