A área técnica do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) deve procurar o Departamento de Justiça (DoJ) dos Estados Unidos para analisar no Brasil possível caso de cartel no setor de frigoríficos, apurou o Valor. A Superintendência-Geral (SG) do Cade recebeu ofício do senador Izalci Lucas (PL-DF) pedindo a investigação de “potenciais reflexos na economia brasileira de condutas anticompetitivas praticadas no exterior por agentes econômicos no setor de frigoríficos”.
Leia também
Trump pede que Departamento de Justiça investigue frigoríficos nos EUA por alta da carne
Vietnã habilita dois frigoríficos brasileiros para exportação de carne bovina
A partir do pedido, segundo uma fonte, os técnicos deverão perguntar ao DoJ o que está sendo investigado nos EUA para prosseguir com a análise no Brasil.
O ofício, ao qual o Valor teve acesso, diz que o presidente Donald Trump determinou ao DoJ que iniciasse investigações sobre potenciais condutas anticompetitivas perpetradas por empresas detidas por pessoas estrangeiras. Entre as condutas, estavam possível cartelização, acordo de preço e manipulação de preços.
Trump solicitou ao DoJ investigação sobre empresas processadoras de carne, alegando que os frigoríficos, muitos deles controlados por estrangeiros, estariam inflacionando artificialmente o preço da carne. Para Trump, seria suspeito os preços do gado terem caído e o da carne seguir alto.
Na época das acusações, o Instituto da Carne dos Estados Unidos (Meat Institute), que reúne mais de 350 empresas na América do Norte, afirmou que os frigoríficos operam com prejuízo há mais de um ano e que as transações do mercado são transparentes. Segundo o instituto, apesar dos preços elevados da carne, os produtores estariam perdendo dinheiro por causa da cotação recorde do gado. A expectativa do setor é que esse cenário continue em 2026.
Saiba-mais taboola
“Como se sabe, empresas brasileiras possuem papel de protagonismo no mercado de proteína”, afirma o senador, em seu pedido. Ele cita que a JBS é a maior produtora de carne dos EUA, enquanto a National Beef, detida pela Marfrig (agora MBRF), é a quarta maior e com maior margem de lucros.
O senador lembra ainda que o Cade aprovou em 2024 a aquisição de ativos da Marfrig pela Minerva, mas impôs condições, “demonstrando as preocupações concorrenciais advindas do setor”. A operação envolveu a venda de 11 unidades de abate e desossa de bovinos no Brasil.
Mas o órgão impôs algumas condições à aprovação, como o ajuste na cláusula de não competição. Também determinou que a Marfrig poderia aumentar sua capacidade de abate e desossa em uma fábrica em Mato Grosso e que a Minerva deveria alienar uma unidade em Goiás.
Segundo Eric Hadmann Jasper, sócio da HD Advogados e professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), um ofício de membro do Congresso é sempre analisado com mais peso pelo Cade, mas a Lei de Defesa da Concorrência determina que são as representações de comissões do Congresso que devem passar diretamente à fase de inquérito administrativo.
O advogado lembra que não é a primeira vez que o setor é objeto de denúncia do Congresso. Em meados de 2005, a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) e a Comissão de Agricultura, Pecuária e Abastecimento da Câmara dos Deputados apresentaram denúncia contra o setor, que resultou em um dos primeiros termos de compromisso de cessação da história do Cade.
Procurados, JBS, MBRF (Marfrig) e Cade disseram que não comentariam. Izalci não foi localizado.