
O Parlamento Europeu aprovou, nesta terça-feira (16/12) salvaguarda adicional que facilita a suspensão temporária de tarifas mais baixas na entrada de produtos agrícolas do Mercosul. A expectativa é de que isso pavimente o terreno para que o acordo birregional seja assinado no sábado em Foz de Iguaçu após 25 anos de negociações.
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‘’Que fique claro, hoje vamos votar o acordo com o Mercosul’’, afirmou o deputado Gabriel Mato, relator do projeto do Parlamento, na abertura da votação hoje ao meio-dia na Europa.
Os eurodeputados votaram por ampla maioria a aprovação de medidas de salvaguarda adicionais para proteger os agricultores europeus. Dos 662 deputados presentes, 431 deputados votaram a favor, 161 contra e 70 se abstiveram.
O texto aprovado na prática sobe o custo de um bloqueio da França no Conselho Europeu ao acordo birregional.
Agora, o texto de salvaguarda agrícola aprovado no Parlamento Europeu segue para negociação acelerada com os governos dos 27 países-membros, na expectativa de que uma regulamentação final esteja pronta nos próximos dias. E com isso superar diferenças e permitir enfim a assinatura do acordo birregional.
Na prática, o que a Europa está fazendo é incluir uma regulamentação com elementos que vão bem além do que está contido no acordo negociado entre os dois blocos. Dependendo da versão final, o Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai simplesmente não conseguirão ampliar suas exportações para a UE.
Isso significa que, mesmo que o acordo Mercosul–UE seja assinado no sábado — ou um pouco mais tarde —, o potencial de conflito já será elevado quando essa salvaguarda vier a ser aplicada.
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O Brasil e o restante do Mercosul deverão copiar a salvaguarda europeia para frear a importação de produtos sensíveis vindos da Europa, como automóveis, por exemplo.
Mas, sobretudo, o que poderá ocorrer no futuro são medidas retaliatórias por parte do Mercosul, dependendo do uso que os europeus fizerem do instrumento interno que criaram para proteger seus agricultores além do que já tinha sido negociado.
Pelo projeto mais duro aprovado hoje pelo Parlamento Europeu, a Comissão Europeia deverá lançar uma investigação para adoção de medidas de proteção quando as importações de produtos agrícolas sensíveis (como aves ou carne bovina) originárias do Mercosul aumentarem 5% na média trienal — ou seja, reduziu o gatilho de 10% ao ano previsto na proposta original da Comissão Europeia.
A versão agora aprovada da salvaguarda procura reduzir a duração dessas investigações — de seis para três meses em geral, e de quatro para dois meses no caso de produtos sensíveis — a fim de introduzir a proteção mais rapidamente e frear a entrada de produtos do Mercosul.
Outra alteração estabelece que as salvaguardas podem assumir a forma de uma obrigação de reciprocidade, exigindo que os países do Mercosul apliquem normas de produção equivalentes às da UE.
Presunção de dano
O endurecimento da salvaguarda pelo Parlamento apoia-se na presunção de dano para suspender temporariamente tarifas mais baixas para o Mercosul — e não mais na comprovação de dano após a análise de indicadores. Se a UE considerar que há presunção de dano diante de um aumento de 5% na exportação de determinado produto do Mercosul, a barreira é acionada.
Além disso, surgiu a questão da concentração geográfica do aumento de preços e volumes das importações vindas do Mercosul: se houver um aumento de preços acima de 5% na Eslovênia, a Comissão Europeia poderá frear as importações daquele produto proveniente do Mercosul em toda a União Europeia. É o caso de se imaginar algumas toneladas de carne bovina provocando esse efeito em um pequeno mercado como o esloveno, levando à proteção de todo o mercado comunitário.
Tudo isso significa que, na prática, o Mercosul quase não poderá elevar suas exportações agrícolas para os 27 países da União Europeia, quando um acordo preferencial tem justamente esse objetivo. O que era um projeto para atenuar os temores de países mais protecionistas, pode se transformar, na verdade, em uma ameaça de abuso e de conflito.
Antes, a Comissão Europeia calculava que o acordo birregional limitaria as importações agroalimentares preferenciais do Mercosul a uma fração da produção da UE (por exemplo, 1,5 % para a carne de bovino e 1,3 % para as aves.
A cota adicional de carne bovina do Mercosul na UE equivale a aproximadamente 220 gramas por ano por habitante europeu, ou cerca de um bife normal por ano. Agora, poderá ser ainda menos com a salvaguarda.
Bernd Lange, presidente da Comissão de Comércio Internacional, não escondeu que, “embora o acordo comercial em si já contenha cotas cuidadosamente calibradas para produtos sensíveis, nosso acordo de salvaguardas garante um monitoramento ainda mais rigoroso por parte da Comissão e reduz o teto para o início de uma investigação”.
As atenções vão se concentrar agora no que fará o Conselho Europeu, que reúne os governos nacionais. Será necessário negociar o texto final da salvaguarda, levando em conta tanto a versão da Comissão Europeia quanto a agora aprovada pelo Parlamento.






