
A ação do fenômeno La Niña deixou o clima irregular durante alguns intervalos do mês de outubro em importantes regiões de cultivo de soja, o que foi suficiente para afetar a produtividade da safra brasileira do grão no ciclo 2025/26. A projeção ainda é de colheita recorde, mas a perspectiva de produção diminuiu, o que pode ter efeitos sobre os preços e os resultados financeiros dos produtores.
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A Pine Agronegócios é uma das consultorias que já reduziram sua projeção de colheita da oleaginosa. A empresa estimava produção de 178,5 milhões de toneladas, mas, neste mês, cortou a projeção para 175 milhões de toneladas.
A estimativa já é menor do que a da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Em seu relatório mensal mais recente sobre a oferta de grãos, a estatal projetou que a produção de soja no Brasil em 2025/26 chegará a 177,6 milhões de toneladas. Caso a previsão se confirme, a colheita será 3,6% maior do que a da temporada 2024/25, quando a produção nacional foi de 171,48 milhões de toneladas.
“Podemos dizer que, de Minas Gerais ‘para cima’, o plantio de soja está com atraso. No Paraná, os trabalhos estão praticamente finalizados, com exceção do leste do Estado, onde choveu muito e não foi possível concluir as operações. Já em algumas áreas a oeste de Mato Grosso, temos relatos de problemas com a seca, que provocaram replantio em algumas lavouras”, afirma Ale Delara, diretor da Pine.
Até domingo (23/11), segundo levantamento da Conab, a semeadura de soja no Brasil já havia terminado em 78% da área de cultivo prevista. Nessa mesma época do ano passado, os produtores haviam concluído a semeadura em 83,3% da área.
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A estimativa da consultoria Datagro para a safra é um pouco mais otimista, mas a empresa também reduziu suas projeções. Nos cálculos da consultoria, o Brasil poderá colher 182,9 milhões de toneladas de soja em 2025/26; no mês anterior, a previsão era de 183,2 milhões de toneladas.
“Os problemas com chuvas irregulares são pontuais. Em alguns Estados, como Goiás, o plantio atrasou por causa do La Niña, e, com isso, a produtividade deverá ser menor no ano que vem. Mas vale lembrar que, nesta safra [2024/25], o rendimento foi recorde. Assim, a produtividade em lavouras goianas vai cair dos 4.190 quilos por hectare deste ano para 3.900 quilos na colheita do ano que vem”, diz Flávio Roberto de França Júnior, analista da Datagro.
Segundo ele, o quadro atual sugere que o Rio Grande do Sul poderá ser o “fiel da balança” para o desempenho da safra brasileira em 2025/26. França Júnior classificou com “um desastre” a colheita dos produtores do Estado no ciclo anterior. A produtividade em 2024/25 ficou em 2.250 quilos por hectare, e a previsão para a temporada atual é de média de 3.300 quilos por hectare.
“Se as chuvas vierem dentro da normalidade, mesmo com o La Niña, e não tivermos nenhuma tragédia com o clima em outros Estados, tenho convicção de que a safra de soja pode bater novo recorde, ainda que ocorram alguns ajustes pontuais”, afirma o analista. Em 2024, depois de registrar a pior enchente de sua história, o Rio Grande do Sul enfrentou seca em regiões de cultivo de soja, o que afetou o rendimento das lavouras.
Em anos de ação do La Niña, as águas do Oceano Pacífico se resfriam naturalmente, o que afeta o clima em diversas partes do mundo. No Brasil, o fenômeno costuma reduzir o volume de chuvas no Sul e aumentar a umidade nas regiões Norte e Nordeste.
A meteorologista Ludmila Camparotto, da Rural Clima, reitera o alerta sobre o clima no Rio Grande do Sul. “No Estado, as chuvas ficam muito irregulares durante o mês de dezembro. Essa condição será boa para a colheita de trigo, mas, no caso do plantio de soja, é preciso atenção”, diz.
Existe alguma preocupação com as lavouras do Rio Grande do Sul, mas o cenário de clima para o restante do país é um pouco mais animador, segundo a meteorologista. Isso porque o mês de dezembro deverá ser marcado por chuvas frequentes na maioria das regiões do Centro-Norte do Brasil, que deverão ajudar no desenvolvimento das plantas.
A previsão é de que essa chuva beneficie também áreas de soja no Matopiba (confluência dos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), onde as precipitações irregulares vêm retardando o avanço do plantio. “Esperamos recomeçar o plantio com essa chuva de hoje. Sem isso, a terra vira um cascão e não nasce nada”, disse o produtor Alexsander Rudimar Borghetti, de Alvorada (TO), que, na segunda-feira, comemorava a retorno da chuva após quase 20 dias de tempo seco. (Colaborou Carolina Mainardes, para o Valor, de Ponta Grossa, PR)





