Em Araputanga (MT), a produtora Maria da Costa Filho, de 67 anos, costumava produzir 40 litros de leite por dia. O rendimento deu um salto, passando de 150 litros ao dia, depois que a pecuarista participou de um projeto da organização não governamental WWF-Brasil voltado à preservação das áreas de cabeceira do Pantanal.
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Além de receber assistência técnica, a pequena produtora teve acesso a conhecimentos aparentemente simples, mas com os quais ela nunca havia lidado em 16 anos de atuação no ramo.
“Eu já estava para desanimar. Era uma dificuldade porque eu estava sempre comprando alimento para as vacas. Estava pagando para trabalhar”, relata Maria da Costa, ou Dona Fia, como é conhecida.
Na busca por aumento de eficiência em um mercado cada vez mais concorrido, em que cada centavo pode representar a diferença entre lucro e prejuízo no fim do mês, ou da safra, produtores de leite brasileiros têm contribuído de forma indireta para melhorar a sustentabilidade da cadeia.
Dona Fia, produtora de leite de Araputanga (MT)
Divulgação
No campo, tem crescido a adoção de práticas como a reutilização dos dejetos dos animais, com as quais o que antes era um problema se converte em solução para disseminar boas práticas financeiras, sociais e ambientais da pecuária leiteira. Em muitos casos, são produtores da agricultura familiar, como Dona Fia, que estão na dianteira desses esforços.
Das rotinas que mais transformaram sua atividade, a pequena pecuarista destaca a divisão e rotação das pastagens. A medida é relativamente simples, mas, por falta de recursos financeiros e técnicos, acabava ficando inviável. “Eu nunca tive esse conhecimento. Sempre trabalhei sozinha”, afirma a produtora.
A pecuária leiteira é estratégica para o projeto de preservação e recuperação ambiental das áreas de cabeceiras do Pantanal mato-grossense, segundo Laís Cunha, analista de Conservação da WWF. Isso se deve ao fato de a atividade ser bastante pulverizada entre pequenos produtores e de seu peso na economia da região, a principal bacia leiteira do estado.
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Hoje, há cerca de 9.800 hectares em unidades demonstrativas. A meta da WWF é chegar a 50.000 hectares até o fim de 2026. “A pecuária leiteira significa segurança alimentar, nutrição, valorização da tradição e da cultura de famílias que trabalham na região. A gente demonstra que é possível conciliar produção, renda e sustentabilidade”, observa a ambientalista.
Os ganhos de produtividade e eficiência foram a principal ferramenta para a Danone convencer os fornecedores a aderir ao programa de redução de pegada de carbono que a companhia lançou em 2019. No sul de Minas Gerais, a empresa compra leite de 260 famílias.
“No início, a nossa maior dificuldade foi fazer o produtor entender que a sustentabilidade era um bom negócio. E conseguimos fazer isso com muita facilidade quando usamos esses indicadores”, relata o diretor de compras da Danone Brasil, Henrique Borges.
Segundo ele, a margem líquida dos produtores que têm as melhores práticas ambientais chega a ser oito vezes maior em relação aos que têm baixa adesão às boas práticas.
Hoje, o programa de sustentabilidade leiteira da companhia tem 130 participantes – e uma fila de espera de interessados em receber assistência técnica e gerencial. “Nós passamos a fronteira da resistência. Esse é o nosso maior ganho”, comemora o executivo. Após cinco anos de programa, a Danone conseguiu reduzir suas emissões de carbono em 47%, e as de metano, em 42%.
Encontro da ONG WWF com pequenos pecuaristas da região: o poder do conhecimento
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Segundo Vanessa Romario de Paula, analista da Embrapa Gado de Leite, o segredo por trás desses ganhos está na eficiência. Isso significa, em outras palavras, que aumentar a produção, por si só, não representa necessariamente melhora da sustentabilidade. Isso ocorre porque, ao aumentar a produtividade, o pecuarista pode estar reduzindo a pegada de carbono por litro de leite, mas também aumentando a emissão total da sua atividade.
“Tem que haver um equilíbrio entre o uso de insumos, o que se está produzindo e o que se está consumindo na fazenda. Às vezes, uma fazenda pequena, com uma produtividade um pouco mais baixa em função da característica do sistema de produção, pode ter um desempenho ambientalmente tão bom quanto uma fazenda de gado confinado produzindo 40 litros por dia”, pontua a especialista.
Monitoramento
Há cinco anos, a Embrapa Gado de Leite começou a monitorar 20 fazendas de leite como parte de um projeto de cooperação técnica com a iniciativa privada. Com as observações, a empresa constatou que a redução das emissões de carbono tem pautado os esforços por aumento de eficiência na pecuária leiteira.
Reduzir a emissão de gases de efeito estufa é importante, e os efeitos sobre o meio ambiente são bem mais abrangentes, garante a analista. “O nome que está se dando a tudo isso é carbono porque há todo esse movimento global de redução, mas nós avaliamos várias categorias de impacto ambiental, e os ganhos são muito mais amplos”, diz Vanessa.
Ela menciona, por exemplo, a melhoria da saúde do solo a partir da rotação de pastagens e tratamento dos dejetos dos animais. “Há um ganho com a redução das emissões de carbono, mas também um ganho econômico, graças à diminuição do uso de fertilizantes, o que tem impacto direto sobre a qualidade do solo. O produtor usa melhor a terra produzindo mais numa mesma área”, sustenta.