A reaproximação diplomática entre Estados Unidos e China, marcada pelo encontro entre o presidente Donald Trump e o líder Xi Jinping, mexeu com o mercado de soja no Brasil e também com os preços do grão na bolsa de Chicago ontem (30/10).
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O acordo que permitirá a retomada das vendas de soja dos EUA aos chineses, anunciado após o encontro entre os dois líderes, fez os prêmios praticados no porto de Paranaguá (PR) — diferencial entre o valor em Chicago e o preço para exportação — caírem entre US$ 0,15 e US$ 0,20 por bushel. Além disso, o acordo paralisou as vendas de soja do Brasil.
Em Chicago, a perspectiva de demanda pela soja dos Estados Unidos fez os contratos da oleaginosa para novembro subirem 1,02%, para US$ 10,91 por bushel. Na máxima do dia, a cotação chegou a US$ 11,01 o bushel. Os lotes para janeiro de 2026 fecharam em alta de 1,21%, a US$ 11,07 por bushel, segundo o Valor Data.
“O comprador [da soja brasileira] desapareceu e agora está tentando entender o que foi acordado”, afirmou Adriano Lo Turco, analista de mercado da Agroconsult. Ele acrescentou que, nesse cenário, o exportador derrubou o prêmio no porto de Paranaguá na tentativa de vender o grão.
O encontro entre Trump e Xi Jinping, em Busan, na Coreia do Sul, sinalizou uma trégua parcial na disputa comercial entre as duas maiores economias do mundo e a retomada das compras chinesas de produtos agrícolas americanos.
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Após a reunião, Trump afirmou que a China voltará a adquirir “tremendas quantidades de soja e outros produtos agrícolas imediatamente”. O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, anunciou que os chineses devem comprar 12 milhões de toneladas de soja entre agora e janeiro e 25 milhões de toneladas de soja por ano, durante os próximos três anos.
As declarações de Trump e Bessent ocorreram após a confirmação de que a estatal chinesa Cofco comprou, nesta semana, três cargas de soja dos EUA, num total 180 mil toneladas, reforçando a boa vontade de acordo.
No entanto, há dúvidas no mercado sobre como o acordo vai funcionar, o que explica a paralisia dos negócios. Um dos questionamentos é se o volume de 25 milhões de toneladas por ano anunciado refere-se ao ano-safra (setembro-agosto) ou ao ano comercial, segundo Lo Turco.
Apesar da falta de detalhamento, os investidores nos mercados de grãos se animaram no pregão de ontem. Só as especulações anteriores ao encontro já haviam feito a soja subir 2,3% em três dias.
Alta da soja em Chicago compensa queda no prêmio?
A valorização da soja em Chicago, porém, não deve compensar a queda nos prêmios, um problema para os produtores brasileiros. “O resultado agora é que se fechou uma janela de oportunidade de comércio da safra velha (2024/25). E, provavelmente, pressionará os preços da safra nova. Isto é, em reais por saca, o produtor terá um valor menor”, afirmou Lo Turco.
Para Marcela Marini, analista de grãos e oleaginosas do Rabobank, “se confirmada uma nova safra recorde em 2026, os prêmios no Brasil poderão ser comprimidos e atingir patamares negativos ao longo do ano”. Nesse cenário, os preços em reais recebidos pelos produtores podem cair, enquanto as indústrias de esmagamento tendem a se beneficiar da aquisição de soja mais barata.
Apesar do acordo entre EUA e China, a expectativa é que o Brasil continue a fornecer mais de 70 milhões de toneladas de soja aos chineses. Ana Lodi, analista da StoneX, observou que os volumes previstos no acordo entre China e EUA são similares aos comercializados antes do acirramento das tensões comerciais entre os dois países. “Dessa forma, não devem ocorrer grandes mudanças nos fluxos globais de soja”, disse.
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Na safra 2024/25, os EUA forneceram 22,6 milhões de toneladas à China. No ciclo anterior, 25 milhões, e, em 2022/23, 31 milhões. O Departamento de Agricultura americano (USDA) estima que o país exportará 47 milhões de toneladas no ciclo 2025/26, bem abaixo das 112 milhões previstas para o Brasil. Essa diferença reforça a leitura de que, mesmo com a trégua entre EUA e China, o Brasil continuará sendo o principal destino da demanda chinesa.
Nos EUA, o acordo é visto como uma sinalização política de que Trump não largou seu eleitor do Meio-Oeste. Mas, segundo reportagem da Reuters, o impacto positivo para os produtores americanos tende a ser “limitado”, uma vez que a China mantém hoje uma base de fornecedores mais diversificada, com a América do Sul em posição dominante.
(Colaborou Raphael Salomão, de São Paulo)