
O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para a próxima quinta-feira (16/10) o julgamento de duas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs 5553 e 7755) que questionam a concessão de incentivos fiscais e reduções tributárias aos agrotóxicos comercializados no país e usados pelos agricultores brasileiros.
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O procurador-geral da República, Paulo Gonet, se manifestou contra os pedidos para derrubar os benefícios fiscais aos defensivos agrícolas. Segundo a PGR, não há incentivo ao consumo maior desses produtos por meio de isenções e desonerações. A exclusão da medida, por outro lado, poderia impactar diretamente no custo dos alimentos aos consumidores brasileiro, argumenta em parecer. As ações são relatadas pelo ministro Edson Fachin.
O julgamento ocorrerá em um momento em que o governo federal busca meios de aumentar a arrecadação de impostos após a derrubada pelo Congresso Nacional da Medida Provisória 1.303/2025, que previa a taxação de investimentos e poderia render quase R$ 20 bilhões aos cofres públicos em 2026.
A ADI 5553, de 2016, e a ADI 7755, de 2024, miram trechos do Convênio 100/1997 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) que reduzem em 60% a base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas saídas de insumos agropecuários específicos e normas do decreto 7.660/2011, que beneficiam esses produtos com a isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
Informações enviadas pela Receita Federal ao STF estimam que cada ponto percentual de IPI a ser cobrado dos agrotóxicos poderia gerar arrecadação anual de R$ 995 mil aos cofres públicos.
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A possível retirada de incentivos fiscais e isenções tributárias da comercialização de agrotóxicos no país poderia gerar um custo adicional de R$ 20,8 bilhões ao ano aos agricultores brasileiros, de acordo com dados apresentados pelo Ministério da Agricultura ao STF no ano passado.
“Não se vislumbra, portanto, na política fiscal questionada, afronta a normas constitucionais. O parecer é por que se julgue o pedido improcedente”, dizem duas manifestações semelhantes apresentadas em setembro pela PGR nos autos dos processos no STF.
A Presidência da República, a Advocacia-Geral da União e o Ministério da Agricultura já haviam defendido a constitucionalidade das medidas em manifestações enviadas ao STF. Mesmo assim, há temores no setor produtivo e na indústria de defensivos agrícolas.
O argumento dos partidos políticos (Psol e PV), que apresentaram as ações que pedem a inconstitucionalidade das desonerações, é que o custo menor facilita e estimula o uso de mais agrotóxicos no país. A PGR, no entanto, discorda.
“A maior ou menor custo, os pesticidas serão adquiridos para manejo da produção agrícola, de modo que sua exclusão abrupta de política de redução tributária teria impacto imediato no preço dos alimentos ao consumidor”, afirmou o procurador-geral, Paulo Gonet, no seu parecer.
“Sendo [o agrotóxico] um produto inelástico, seu consumo ocorrerá na exata medida do necessário, não sofrendo relevante alteração em razão do preço”, indicou Gonet, ao repetir trecho do voto do ministro Gilmar Mendes.
O Ministério da Agricultura já havia alertado o STF de que a possível retirada do benefício fiscal não vai gerar redução do uso de agrotóxicos. Segundo a Pasta, a alternativa química só é utilizada pelo produtor quando outras formas de manejo empregadas são tecnicamente insuficientes.
Os técnicos do ministério apontaram ainda que sem o uso de agrotóxicos químicos, a produção agrícola brasileira poderia ser reduzida em 50% e seria necessário dobrar a área plantada atualmente, o que geraria pressão por novos desmatamentos.
Manifestações
Em nota, a Croplife, que representa empresas produtoras de defensivos, disse que a retomada do julgamento é oportuna e defendeu a manutenção dos benefícios.
“Em eventual revogação do benefício fiscal, o custo dos defensivos pode ser elevado em 25%, o que resultará no aumento do custo da produção e, consecutivamente, aumento do preço dos alimentos. Como também, estimula a ilegalidade, trazendo reflexos nocivos à saúde e ao meio ambiente. A oneração fiscal neste contexto pode trazer prejuízos a toda a sociedade, ameaçando a segurança alimentar e elevando a inflação do país”, afirmou.
O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) não quis comentar.
Rogério Dias, presidente do Instituto Brasil Orgânico, afirmou que a manutenção da desoneração aos agrotóxicos é uma “incoerência”, que ela espera ser corrigida pelo STF. “Estamos sempre na expectativa de corrigir esse absurdo que existe há tanto tempo, que é deseonreção e isenção para um produto sabidamente prejudicial à saúde e ao meio ambiente”, afirmou. Segundo ele, o país sempre trabalhou para taxar produtos prejudiciais à saúde. “É uma incoerência total”, opinou.
Uma carta na manga para pressionar o STF pela extinção dos benefícios fiscais, disse Dias, é a criação do Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara), em junho deste ano.
“Temos um reforço no reconhecimento da necessidade de redução dos agrotóxicos. O Pronara tem esse papel”, disse. Ele defende que os impostos arrecadados sobre a comercialização de agrotóxicos sejam direcionados para a pesquisa e desenvolvimento de produtos alternativos aos defensivos químicos “para que, cada vez mais, os agrotóxicos possam ser retirados da agricultura brasileira”, concluiu.
Julgamento
O julgamento será retomado nesta quinta-feira (16/10). Em sessões anteriores, o relator, ministro Edson Fachin concordou com os pedidos e foi acompanhado pela ministra Cármen Lúcia. O ministro Gilmar Mendes inaugurou divergência, contra os argumentos de Psol e PV, e foi acompanhado pelos ministros Cristiano Zanin, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes.
Já os ministros André Mendonça e Flávio Dino apresentaram votos para julgar as normas parcialmente inconstitucionais. Eles argumentam pela inconstitucionalidade progressiva das normas impugnadas, com a fixação de prazo ao Poder Executivo para reavaliação da política de incentivo fiscal a insumos agropecuários.