Passado o susto com o tarifaço americano, do qual os exportadores brasileiros de suco de laranja escaparam após a divulgação da lista de exceções, o setor volta suas preocupações agora por uma transformação profunda no mercado de sucos. Além de se ver pressionado pela queda de volume de matéria-prima e por desafios climáticos que afetam a produção de frutas, o setor está diante de mudanças no comportamento do consumidor que colocam os produtores numa encruzilhada.
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“Vi duas consultorias apresentarem diagnósticos semelhantes: a demanda cai, os preços oscilam, e o consumidor busca novas experiências”, afirmou o presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR), Ibiapaba Netto, após participar do Juice Summit, principal conferência mundial do setor, realizada na semana passada em Bruges, na Bélgica.
Segundo ele, as tendências que hoje moldam o consumo global de bebidas abrem tanto riscos quanto oportunidades. “O suco começa a aparecer como ingrediente em bebidas funcionais e probióticas, que estão em alta. Pode ser um movimento de ‘perde-perde’ ou de ‘ganha-ganha’: se o uso aumentar, o volume ajuda a equilibrar preços e melhora a qualidade; mas, se o suco virar apenas um ingrediente, o mercado pode encolher ainda mais”, disse o dirigente.
As consultorias Euromonitor e Nielsen mostraram que o mercado mundial de sucos vive uma contradição: o faturamento cresce, mas impulsionado pela inflação e não pelo aumento de consumo. E, em regiões de consumo maduro, como Europa e América do Norte, o volume recua, enquanto bebidas energéticas, funcionais e “shots” de imunidade ganham espaço.
A busca por funcionalidade e autocuidado está alterando o padrão de consumo. “Os consumidores querem produtos que façam bem, [que deem] imunidade, energia, saúde digestiva. É uma mudança estrutural, e o suco precisa encontrar seu espaço nisso”, observou Netto.
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No caso brasileiro, o impacto climático também entra na equação. O executivo destacou que as anomalias de temperatura e o avanço do greening — doença fúngica sem cura — estão reduzindo a produtividade e afetando o sabor da fruta, o que afeta a competitividade do país. E, enquanto o Brasil enfrenta limitações no campo, novos players se movem para ocupar espaço no mercado global.
Segundo o presidente da CitrusBR, Egito, Turquia, Grécia e África do Sul apresentaram estratégias agressivas de produção durante a Anuga, maior feira mundial de alimentos e bebidas, realizada em Colônia, na Alemanha. “O Egito, por exemplo, planeja processar 50 milhões de caixas de laranja em cinco anos, enquanto hoje processa 8 milhões [de caixas ao ano]. São países que estão investindo pesado e se posicionando como fornecedores globais de suco”, disse. “Eles não têm greening e têm estruturas enxutas, o que reduz custos e aumenta a competitividade.”
Ainda que esses mercados não tenham escala individualmente para rivalizar com o Brasil, no conjunto eles já aparecem como uma “sombra estratégica”.
No longo prazo, a movimentação desses países pode gerar uma consolidação do setor, e players mundiais podem fazer aquisições. Segundo o presidente da CitrusBr, o executivo Hans Roelofs, ex-CEO da Refresco, maior engarrafadora de sucos da Europa, que realizou mais de 30 aquisições na última década, defendeu em uma palestra no Juice Summit que a consolidação é “inevitável” para o setor, “marcado por margens apertadas e excesso de capacidade”, afirmou.
“No exterior, há muitas pequenas processadoras. A consolidação entre engarrafadores e produtores deve acelerar em vários países”, avaliou Netto.