Não se sabe ao certo exatamente quando, mas foi no século VII depois de Cristo que o dicionário árabe registrou a palavra qahwah, que significava, originalmente, “vinho”, para designar o café. A adoção do termo deveu-se à importância da planta de origem africana para os árabes. Foi nas terras altas de Kaffa, na Etiópia, que brotaram os primeiros cafezais.
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A lenda preservada em livros conta que um pastor de ovelhas chamado Kaldi percebeu que seus animais ficavam mais alertas e cheios de energia depois de comer os frutos vermelhos do cafeeiro. Intrigado, Kaldi provou o grão e sentiu uma vivacidade incomum. A palavra, transformada em kahveh no turco e depois em caffè no italiano, atravessou séculos até chegar a outros idiomas europeus, incluindo o português.
Séculos mais tarde, em 1969, em outro canto de terras altas, um episódio semelhante ocorreu com o povo indígena paiter suruí durante a reintegração de posse de um território próximo a Cacoal (RO). Na região, os frutos rubros do café brilhavam ao sol como pequenas joias.
Para os suruí, eram a fruta ancestral doce e saborosa chamada sarikab, nativa da Amazônia. Durante anos, aliás, os nativos consumiram o grão maduro como fruta, até que, em 1980, surgiram as primeiras iniciativas de cultivo no local.
Levou ao menos 11 anos para que Agamenon Gamasakaka Suruí começasse a trabalhar com cafezais na terra indígena Sete de Setembro, que se estende por 248.100 hectares entre os estados de Rondônia e Mato Grosso. Ele foi o primeiro indígena a cuidar do café na região, sem mais confundir o grão com a fruta amazônica.
Décadas depois, Celeste Suruí retomaria essa história de forma inusitada. Aos 20 anos, desafiou tradições de sua comunidade, recusou um casamento arranjado e deixou a aldeia para estudar em São Paulo. Juntou algum dinheiro que ganhou da mãe e da avó até embarcar em um avião, pela primeira vez, e partir em direção à maior cidade da América Latina.
Celeste Suruí e o povo indígena da terra Sete de Setembro têm adotado o sistema agroflorestal para ter lotes de grãos de especialidade
Thiago de Jesus
Hoje, aos 22 anos, é a primeira barista indígena do Brasil. Já serviu café amazônico ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e lançou sua própria marca, batizada de Sarikab.
É com orgulho que Celeste conta a história dos ancestrais – e a liberdade que ela conquistou com a cafeicultura deve-se aos conhecimentos de seu povo e também aos avanços da ciência nas últimas décadas.
Em Cacoal, a barista e os irmãos transformaram o território em área produtiva de cafés especiais, com apoio técnico da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e de outras instituições, que viram na produção indígena um modelo de manejo integrado à floresta.
“O café está presente entre os suruí desde 1969, oriundo de um processo colonizador mais recente que provocou a derrubada da floresta e a feitura de grandes roçados para seu plantio”, diz o rótulo de sua marca de grão especial. Por isso, quando os indígenas recuperaram o território, relata Celeste, não queriam ficar com as plantas de café, que eram uma lembrança das mortes e do infortúnio da “invasão dos brancos”, como define.
No entanto, parte da tribo insistiu para que as plantas ficassem – porque ainda confundiam o grão com as frutas sarikab e porque acreditavam que aquela podia ser uma forma de subsistência.
Da década de 1980 em diante, outros povos da região também começaram a explorar o café, até que se descobriu no Brasil que a variedade que brota na região é a robusta, uma variante do que se encontra na Ásia, entre o Vietnã e a Indonésia. “Foi então que surgiu o interesse em produzir mais”, conta Celeste.
O papel da ciência
Experiências como essas não ocorreriam sem os avanços da ciência. Segundo um levantamento que a revista científica Agronomy publicou em 2022, o Brasil respondeu, no ano anterior, por cerca de 40% das publicações de artigos científicos sobre café. Em um universo de 655 artigos, os de pesquisadores brasileiros foram os mais numerosos.
“Estamos vivendo um ciclo baseado em conhecimento gerado por pesquisa e ciência com conversas muito próximas entre instituições, produtores e empresas”, afirma Poliana Perrut, engenheira agrônoma, viveirista e cafeicultora em Cacoal. O trabalho dos cientistas acompanha o forte crescimento da demanda pela bebida no Brasil e no mundo.
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Rogério Albuquerque
Quando a Globo Rural nasceu, em 1985, a produção nacional era de cerca de 25 milhões de sacas de 60 quilos, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Quatro décadas depois, a colheita mais do que dobrou, chegando a 58 milhões de sacas. Nesse mesmo período, as exportações mais do que triplicaram, passando de 15,5 milhões para 50 milhões de sacas, de acordo com o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).
As pesquisas ocorrem em todas as frentes, como desenvolvimento de novas cultivares, adaptações das plantas a extremos climáticos, técnicas de manejo e melhoria da qualidade dos grãos.
Em um exemplo concreto, e de larga escala, desses avanços, a Embrapa apresentou, no ano passado, suas dez primeiras cultivares híbridas da espécie canéfora (Coffea canephora) para plantio na Amazônia – robusta e conilon são as principais variedades da espécie.
Segundo a estatal, essas cultivares (plantas que resultam de melhoramento genético) podem triplicar a produtividade média das lavouras na região.
Rondônia é o berço dos chamados robustas amazônicos, cafés que têm conquistado prestígio no mercado internacional nos anos recentes. Também esse fenômeno é consequência das conquistas da ciência brasileira.
De acordo com estudos da Embrapa, esses grãos surgiram a partir da mistura entre cafés conilon, que produtores mineiros, paranaenses e capixabas levaram para a região na década de 1970, e materiais genéticos 100% robusta que a Embrapa Rondônia obteve no Instituto Agronômico (IAC), de Campinas (SP), e introduziu na Amazônia em 1990.
Celeste Suruí prepara os equipamentos de barista para passar um café coado, usando um método japonês que incorporou para sofisticar a bebida. No meio da aldeia, em uma mesa de madeira que seus vizinhos suruí esculpiram, ela separa os grãos, mói, pesa em uma balança e milimetricamente prepara a dosagem, que leva 16 gramas de pó para 100 mililitros de água.
O aroma inebria. Cheiro de café forte, mas com doçura de fruta vermelha e açúcar queimado na panela.
Thiago de Jesus, fotógrafo e cinegrafista da Globo Rural, inicialmente prefere não aceitar a oferta de uma xícara, num primeiro impulso de quem “não gosta de café”. Mas a barista insiste, e Thiago aceita, bebe e reage com um sorriso suave, de quem gostou do que provou. “Eu sabia que você ia gostar. Esse é o café do seu povo, de gente de verdade”, diz Celeste. Ciência e conhecimento tradicional venceram mais uma vez.
Café brasileiro
Abic
Os cafezais brasileiros ocupam 1,88 milhão de hectares, segundo a Conab, distribuídos por 37 regiões com plantios. Essas áreas são responsáveis pela oferta de um terço de todo o café que se bebe no mundo, uma proporção que faz do grão um dos produtos do agro nacional mais dominantes no mercado global. “Sem o Brasil, o mundo não toma café”, resume Gerson Giomo, pesquisador do IAC.
A relação do Brasil com o café está prestes a completar 300 anos. Segundo os registros históricos, o grão chegou ao país em 1727 pelas mãos do sargento-mor Francisco de Mello Palheta, em um episódio que tem contornos de lenda. O ensaísta Afonso d’Escragnolle Taunay conta no livro Pequena História do Café no Brasil (1945) que o grão entrou clandestinamente em solo amazônico através da Guiana Francesa.
O sargento-mor teria conquistado a confiança da esposa do governador de Caiena, atualmente a capital guianense, e trouxe ao Brasil sementes e uma muda de Coffea arabica. Os primeiros plantios ocorreram no Pará, próximos a Belém, e depois surgiram lavouras no Maranhão e na Bahia.
Os resultados das plantações iniciais acabaram sendo pouco expressivos, já que as condições climáticas eram desfavoráveis.
Mas, a despeito dos percalços iniciais, o grão prosperou. Mais que isso, ele foi também um elemento central de transformações socioeconômicas profundas no Brasil durante o período colonial e também nas décadas que se seguiram à declaração de independência de Portugal.
São Paulo tornou-se o grande polo de cultivo de café no século XIX, e foi o dinheiro do grão que impulsionou a urbanização da capital do Estado e também financiou a primeira ferrovia do país, que passou a ligar o interior paulista ao porto de Santos. A expansão dos cafezais no país, em particular no Vale do Paraíba, em São Paulo, intensificou também o tráfico de africanos escravizados.
Mais tarde, a partir da segunda metade do século XIX, foi para trabalhar em lavouras de café que chegaram ao Brasil as primeiras levas de imigrantes europeus. De 1870 a 1930, o grão virou sinônimo de “ouro verde” e chegou a responder por 70% das exportações brasileiras.
Na historiografia nacional, esse período ficou conhecido como o Ciclo do Café, que chegou ao fim com a queda dos preços do produto no mercado internacional, agravada pela grande crise econômica global em 1929, batizada de Grande Depressão.
Agrofloresta
Diná Suruí acarinha as folhas da planta enquanto conta sobre os cuidados manuais que sua família tem com as lavouras do grão. As folhas são da primeira árvore de café encontrada em 1969 no território indígena do Suruí em Cacoal.
“Todas as vezes que me aproximo desse pé de café me lembro de como começou esse trabalho na minha família e no meu povo. Hoje, conseguimos atingir um café de qualidade que tem outro sabor”, frisa Diná.
O cultivo é em sistema de agrofloresta, e parte da produção integra projetos de microlotes que têm financiamento da Três Corações, uma das maiores empresas de café do país.
Para o pesquisador da Embrapa Rondônia Enrique Alves, essa qualidade reflete uma parceria firme entre tradição, conhecimento do produtor e ciência. A tríade, afirma, é que garante alta produtividade em Rondônia, onde 17.000 famílias dedicam-se à cafeicultura. A produção é majoritariamente familiar, com uma média de 3,4 hectares por produtor.
Há alguns anos, a produtividade dos cafeicultores locais era de níveis extrativistas, na faixa de dez sacas por hectare, mas, com a melhoria das tecnologias e do manejo, o rendimento subiu para 54 sacas por hectare, ficando acima da média nacional. “É a maior média de produtividade do país”, observa o pesquisador.
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Entre os diferenciais da produção brasileira, seja ela de arábica ou das variedades canéfora, estão as pesquisas sobre melhoramento, arranjos de plantio, cuidado com o solo e inclusão de colmeias nas lavouras.
“Cada clone tem uma microbiota individual e diferenciada. A genética surge e mostra sua diversidade quando se trabalham o solo e a adubação”, complementa o especialista. “É a magia do café.”
Avanços
Qualquer que seja a região produtora, os avanços na cafeicultura só foram possíveis graças aos saltos científicos no cultivo do grão nesses três séculos de história da cultura no país, ressalta a pesquisadora Julieta Almeida, que há pelo menos 14 anos dedica sua carreira ao desenvolvimento de clones no IAC, polo centenário da pesquisa cafeeira.
Para ela, doutora em biologia vegetal, a tradição agrícola que se formou em torno do café veio acompanhada do interesse em desenvolver pesquisas.
Hoje, o IAC mantém o maior germoplasma da América do Sul, um banco genético formado por coleções de sementes, mudas, variedades e espécies, que passam por estudos para garantir diversidade à espécie e apoiar programas de pesquisa e melhoramento. É um patrimônio científico que funciona como “biblioteca genética” da agricultura brasileira, define Julieta.
Os estudos com o café avançaram no Brasil, em especial os que elevam a qualidade do grão, em trabalhos como o da pesquisadora Julieta Almeida
Rogério Albuquerque
O instituto foi criado em 1887 a partir de um anúncio de Dom Pedro II. Segundo Júlio Mistro, companheiro de pesquisa de Julieta, a ligação histórica do imperador do Brasil com o café tornou possíveis avanços científicos em um momento em que já se via o grão como uma commodity.
“A diversidade e a extensão territorial do país ajudaram a ampliar diversas linhas de pesquisa e os locais de plantio”, diz Julieta.
Na década de 1990, o IAC consolidou suas pesquisas mais avançadas com a criação do Centro de Café Alcides Carvalho. O nome é uma homenagem ao agrônomo e geneticista que desenvolveu 65 variedades, um material que hoje corresponde a cerca de 90% do arábica que se cultiva no Brasil.
Outros países estão de olho no que pesquisadores brasileiro publicam, no portfólio das indústrias e na condução das lavouras, avalia Juliano Lourenço, produtor de café e vinho nas montanhas de Espírito Santo do Pinhal (SP).
Juliano Lourenço aproveitou o solo em que cultiva café, na Serra da Mantiqueira, para também plantar uvas para a produção de vinho
Thiago de Jesus
Para chegar ao município a partir de São Paulo, é preciso subir a Serra da Mantiqueira. Nesse caminho, nota-se uma transformação na paisagem verde: curvas nas montanhas estão preenchidas de plantas de café, que se mesclam com outros cultivos.
A propriedade de Juliano está a 1.200 metros acima do nível do mar, o que garante doçura à bebida. O produtor obtém os grãos a partir de uma mistura de mais de dez variedades que saem de seus campos experimentais.
Os plantios ocupam 63 hectares. Um espaço da propriedade é dedicado exclusivamente à genética do café. Nessa área ficam variedades que já passaram por melhoramento, além de cultivares desenvolvidas pelo IAC, como a laurina.
O nome representa a mais recente descoberta dos pesquisadores: um café de baixo teor de cafeína, mas que mantém alta produtividade. Está longe de ser o carro-chefe de Lourenço, mas está nos talhões para, no futuro, servir de referência para a expansão das atividades no ecoturismo, um negócio que o produtor criou com seu sócio, Felipe Aversa.
Os dois têm se dedicado ao cultivo de cafés de especialidade, que recebem manejo com práticas sustentáveis, têm colheita tardia, uma técnica que confere mais doçura ao grão e dá sabores exóticos à bebida.
Café especial
Para ser classificado assim, o café precisa ser avaliado segundo critérios da Specialty Coffee Association (SCA) e obter 80 pontos ou mais numa escala de 0 a 100, em provas de degustação chamadas “cupping”. A análise considera atributos como aroma, sabor, doçura, acidez, corpo, equilíbrio e ausência de defeitos nos grãos.
Além disso, o café especial é geralmente rastreável. Sabe-se de qual fazenda ou microlote ele saiu, se o cultivo segue práticas agrícolas cuidadosas e se a colheita é seletiva (apenas de frutos maduros), o que garante uniformidade e maior qualidade na xícara. É um nicho em ascensão no país e que desponta à medida que se abrem mercados, principalmente na Europa e na Ásia.
O segmento de cafés especiais representa cerca de 5% do consumo no Brasil, onde tem crescido 15% ao ano, em média, segundo a Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA). O potencial do segmento atraiu a produtora Lis Parro. Ela criou recentemente sua própria marca, a Reviver, que chega ao consumidor em uma lata personalizada, com indicação de receita e certificação de origem do Cerrado Mineiro.
A produção de dez hectares fica em Patrocínio, uma das cidades-polo dos cafés especiais. A produtora investe em agricultura regenerativa, adota manejo biológico e usa entrelinhas com mix de plantas. Além disso, a agricultora também participa da colheita manual, que requer “muita delicadeza”, diz.
Saiba-mais taboola
Filha de cafeicultoras e esposa de um produtor de grão commodity, Lis conta que o universo cafeeiro a encantou. “Eu ponho a mão na massa. Olha aqui, eu separando café no terreiro suspenso”, exclama, enquanto mostra um vídeo que gravou durante o processo de beneficiamento em sua lavoura.
O momento é propício para que ela desenvolva seu negócio. Em 2024, Lis conquistou o terceiro lugar de melhor café do Cerrado Mineiro e agora está em busca de parceiros para que mais consumidores tenham acesso à sua produção. A produtora é associada à cooperativa Expocacer, para a qual entrega a maior parte dos grãos que colhe. Mas, com sua marca, também quer chegar ao mercado de cafeterias especializadas.
O café também tem inspirado a formação de coletivos de mulheres que estão à frente das fazendas. Ela mesma faz parte de um, o Flores do Café, que reúne produtoras do Cerrado Mineiro que estão em busca de capacitação e troca de conhecimento técnico e pessoal. “O café tem essa magia”, resume Lis.
O investimento em café de especialidade também é forte em Rondônia, enfatiza o pesquisador Enrique Alves, da Embrapa, e a produtora, agrônoma e viveirista Poliana Perrut. Os dois observam que o forte aumento dos preços do grão nas últimas três safras tem atraído gente interessada em ingressar na cultura.
Poliana, que é uma liderança do robusta amazônico, presta auxílio a produtores da agricultura familiar para que desenvolvam seus cafezais. Em 2019, ela foi a primeira mulher a vencer o Concurso de Qualidade e Sustentabilidade do Café de Rondônia (Concafé), com um grão de bebida de 88,6 pontos.
Por atuar na produção e também na pesquisa, ela testa combinação de clones, faz blends e experimenta processos de beneficiamento como a fermentação com leveduras, o que dá sabores e texturas licorosas ao seu café. As experimentações são um trampolim para a conexão entre produtores, diz.
“O café é elemento vivo de histórias de famílias que superaram dificuldades. No território amazônico, isso fica muito evidente”, afirma Poliana.
A família Agrizzi começou há 42 anos a trabalhar com conilonemSooretama (ES), a 119 quilômetros de Vitória. A cultura ocupa 200 hectares, uma área que foi resultado de uma aventurade transição, segundo Sávio Agrizzi, que representa a terceira geração de plantadores de café da família. Ao lado do pai, Domingos, ele renova talhões com cultivares mais resistentes. O resultado desses esforços, avalia o produtor, será um manejo mais sustentável ambiental e financeiramente.
Cafeicultores Sávio e Domingos Agrizzi, de Sooretama (ES): sucessão familiar e inovações para aumentar a qualidade do grão canéfora
Thiago de Jesus
Com produção em franco crescimento, o Espírito Santo vem reforçando sua fama de berço do conilon. A variedade tem ajudado a compensar quebras de safras do arábica, decorrentes de problemas climáticos em outras regiões produtoras do país, especialmente em Minas Gerais, onde secas intensas prejudicaram as plantações a partir de 2022.
Assim como os Agrizzi, Deigson Mendes Bento e o pai, Ronaldo, também estão no processo de sucessão das atividades. Agricultores em Cacoal (RO), eles comemoram um feito pioneiro: os Bento foram os primeiros a montar uma agroindústria de robusta amazônico no Estado. A família cultiva café há 40 anos e descobriu o potencial dos grãos especiais e conquistou prêmios. Foi em 2019 que decidiram montar a própria estrutura de torrefação, que auxilia também outros produtores.
Hoje, há oito marcas de cafés especiais em Rondônia, e quase todas contam com o apoio da consultoria da família Bento. “Café gera qualidade de vida, sequestra carbono, garante renda e sucessão no campo. É uma cultura que une e dá propósito. Quem entra nesse mundo dificilmente sai”, afirma Deigson. “Hoje em dia, a gente vive da raiz do café e do que ele produz”.
O pai, Ronaldo, filho de mineiros, foi plantar café em Rondônia como meeiro e acabou se tornando referência da atividade no estado. “O café é tudo na vida da gente, da muda à xícara”, diz. Ele conta que decidiu abrir espaço também para o agroturismo. “Já visitei 20 países, e hoje recebemos visitantes do mundo todo para conhecer a nossa cafeicultura”, relata.
Produtores Deigson e Ronaldo Bento, de Cacoal (RO): dedicação à primeira agroindústria do Estado
Thiago de Jesus
No Brasil, a mecanização da cafeicultura é fenômeno relativamente recente. Luiz Vizeu, gerente de relações institucionais da Indústrias Colombo, assistiu ao crescimento da mecanização, em especial no cultivo de café canéfora, no início dos anos 2010. “No conilon, principalmente, a mecanização surgiu tardiamente, mas esse movimento ajudou a aumentar a produtividade”, diz. Foi graças a parcerias com produtores, conta, que a empresa desenvolveu um novo segmento de negócios.
Esse filão já conta com três tipos de máquinas para áreas de tamanhos diferentes. Nas lavouras de arábica, as máquinas ajudam até nas áreas mais íngremes e montanhosas. Esse é o caso, por exemplo, do município de Botelhos (MG), onde fica a fazenda-sede do Café Orfeu, uma das principais marcas brasileiras de cafés especiais, que também investiu em mecanização.
Os avanços das pesquisas e a disseminação da tecnologia têm sido pilares do aumento da produção brasileira. Tecnologias e técnicas que tornem as plantas mais resistentes a extremos climáticos, cultivo com baixa emissão de gases de efeito estufa, estudos moleculares, melhoramento genético e arranjos que preservem a natureza são algumas das principais frentes de pesquisa na atualidade.
Para além da bebida, também a ciência por trás dele coloca o Brasil em papel de protagonista. “Nos últimos anos, conseguimos alcançar uma visibilidade inimaginável”, atesta Vanusia Nogueira, diretora-executiva da Organização Internacional do Café (OIC).
*A jornalista viajou os trechos de Linhares (ES) e Cacoal (RO) a convite da Indústrias Colombo