As usinas de açúcar e etanol do Nordeste do Brasil estão em “compasso de espera”. Pouco mais de um mês depois da entrada em vigor da tarifa de 50% sobre exportações do Brasil para os Estados Unidos, os negócios com os clientes americanos estão praticamente parados, afirma o presidente da Associação de Produtores de Açúcar, Etanol e Bioenergia (Novabio), Renato Cunha.
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“As negociações estão sobrestadas até que venha um cenário mais claro. Estamos em compasso de espera e não temos uma solução definitiva, porque depende da dinâmica dos acontecimentos.”
O Brasil exporta açúcar para os Estados Unidos por uma cota de 146,6 mil toneladas, cumprida entre outubro de um ano e setembro do ano seguinte. A participação brasileira é a segunda maior, atrás da República Dominicana. Cunha destaca que os preços, geralmente, superam os do mercado internacional na bolsa de Nova York.
O volume embarcado dentro da cota era isento de taxa. Fora, a cobrança chegava a 80%. O presidente da Novabio explica, no entanto, que era comum o Brasil ter sua participação estendida pelo governo americano, em função da dificuldade de oferta de outros países, e os embarques chegaram a passar de 200 mil toneladas anos atrás.
Agora, a tarifa de 50% gerou um ônus “pesado” para as usinas do Nordeste. Cálculo da consultoria Datagro, ainda antes da entrada em vigor do tarifaço, estimava um custo adicional de US$ 27,9 milhões para a indústria, levando em consideração o volume da cota e um valor médio de US$ 371 por tonelada, praticado no ano passado.
“Haverá dificuldades para exportar e isso tem imposto uma rearrumação no planejamento da safra. Essa queda de faturamento, que chega a US$ 200 milhões, quase R$ 1 bilhão, é grande. Pode ser redirecionado, mas demora”, lamenta Cunha.
Na avaliação do presidente da Novabio, produtos importantes para a segurança alimentar não deveriam estar no tarifaço. Os Estados Unidos, acrescenta, importam cerca de 3 milhões de toneladas de açúcar por ano, são deficitários e dependem da commodity produzida em outros países.
“O tempo vai fazer com que haja maior necessidade deles, na questão de estoques, de segurança alimentar”, avalia.

Ao mesmo tempo que o açúcar foi incluído no tarifaço, o etanol é um dos itens da investigação aberta pelos Estados Unidos contra práticas comerciais do Brasil. Os americanos questionam o acesso ao mercado brasileiro do biocombustível, que cobra uma tarifa de importação do produto que vem de fora dos países do Mercosul.
Atualmente, a taxa é de 18%, mas chegou a ser de 20% e até mesmo zerada em anos anteriores. O governo Trump questiona a cobrança, sob o argumento de que gera um desequilíbrio no comércio bilateral. Em nota técnica, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) afirma que a política tarifária brasileira é transparente e está de acordo com regras internacionais da Organização Mundial do Comércio (OMC).
“O Brasil não precisa importar etanol. Não podemos ser compelidos a importar uma coisa de que não há necessidade. Brasil e Estados Unidos poderiam se unir para prospectar mercados. Há países aumentando sua necessidade”, avalia Renato Cunha.
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A safra 2025/26 começou com algum atraso na região Nordeste, afirma o presidente da Novabio. Chuvas em regiões produtoras, que podem ser benéficas para temporadas futuras, atrapalharam a colheita atual e levaram a uma descontinuidade das operações de quem iniciou ainda no mês de agosto a fabricação de açúcar e etanol.
Enquanto a indústria da região lida com as consequências do tarifaço dos Estados Unidos, vê um mercado internacional com preços de açúcar ‘comprimidos’ em Nova York.
Na sexta-feira (12/9), o contrato para outubro fechou a 15,79 centavos de dólar por libra-peso, uma desvalorização de 0,19%. Em um mês, a queda é de 6,67%, de acordo com o Valor Data. Para março de 2026, a commodity foi cotada a 16,52 centavos de dólar por libra-peso, alta de 0,12% no dia e baixa de 5,81% em um mês.
“O açúcar está de lado, mas acho que são fatores passageiros. Os fundamentos mundiais não sinalizam que o mercado deva ficar tão sobrecarregado”, avalia Cunha.
Relatório do Itaú BBA aponta que, só na primeira semana de setembro, o contrato para outubro teve baixa de 5%. Os analistas disseram que a pressão veio do avanço da safra brasileira e de notícias positivas sobre a produção na Índia e na Tailândia. “Esse cenário tranquiliza os compradores e pressiona os vendedores a acelerarem o ritmo de vendas.”
No Centro-sul do Brasil, as usinas fabricaram 3,61 milhões de toneladas de açúcar na primeira quinzena de agosto, 15,96% a mais que no mesmo período no ano passado, com 55% da matéria-prima direcionada à commodity. No acumulado da safra 2025/26, a produção é 4,67% inferior à do ano anterior, com um volume total de 22,8 milhões de toneladas. Desde o início da temporada, 52,51% da cana foi transformada no produto.
Também em relatório, o Rabobank destaca que a percepção atual é a de que não falta açúcar no mercado global, levando em conta o avanço da safra brasileira. Mas os números do Centro-sul trazem preocupações com a oferta.
A perspectiva de uma produção de 40 milhões de toneladas está cada vez mais distante. “Olhando mais adiante, as perspectivas preliminares para a safra no Centro-sul do Brasil devem pesar mais na avaliação do quadro de oferta e demanda.”
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Os preços do etanol, por sua vez, se mantêm firmes. Em São Paulo, o indicador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) acumula pelo menos sete semanas seguidas de alta. Entre 1º e 5 de setembro, a média foi de R$ 2,7831 o litro, alta de 1,52% em relação à semana anterior. Comparando com a primeira semana de agosto, a valorização é de 5,83%.
De um lado, a produção no Centro-sul está menor que a da safra passada. Na primeira quinzena de agosto, foram 2,19 bilhões de litros, somando anidro e hidratado, retração de 5,21%. No acumulado da temporada 2025/26, foram 16,07 bilhões, queda de 11,12%. A fabricação do biocombustível de milho tem expectativa de crescimento, mas deve compensar apenas em parte a baixa no volume do de cana.
De outro lado, a perspectiva é de elevação na demanda, especialmente por etanol anidro, em função do aumento da mistura na gasolina, que passou para 30% em 1º de agosto. “Com isso, os preços do etanol têm subido, refletindo uma perspectiva de estoques reduzidos na entressafra”, avalia o Rabobank.
“Considerando uma produção menor, além do maior uso de etanol anidro na mistura com gasolina, a oferta de etanol hidratado deverá sofrer uma restrição ainda maior. O cenário deve ser de uma tendência de alta nos preços”, acrescenta o Itaú BBA.