A alta nos preços do café no mercado internacional, que supera 80% em dois anos, está valorizando também as terras destinadas à cultura Brasil afora. Além do aumento das cotações do grão, a oferta restrita de áreas disponíveis para venda e o interesse pelo cultivo de café — um produto com consumo crescente pelo mundo — também explicam a valorização.
Levantamento da S&P Global Commodity Insights obtido pelo Valor mostra que, no intervalo entre abril e junho deste ano, o preço médio das terras de café no Brasil subiu 3,21% em relação ao mesmo período de 2024, para R$ 58,52 mil por hectare. No intervalo de três anos, a valorização na média nacional já chega a 32,7%, de acordo com o levantamento.
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O Estado que registrou a maior alta de abril a junho, na comparação anual, foi a Bahia, com avanço de 9,2%. Na análise da S&P, essa é a região com o menor preço médio, de R$ 23,75 mil por hectare, indicando que há potencial para expansão do café.
Minas Gerais e São Paulo, os dois maiores produtores de café arábica do Brasil, são as regiões mais valorizadas. No segundo trimestre, a alta foi de 3,18% em Minas Gerais em relação ao mesmo período um ano antes, para R$ 72,11 mil por hectare. Em São Paulo, o aumento foi de 2,33% na mesma base de comparação, para R$ 80,66 mil. Em três anos, as altas acumuladas são de 26,26% em Minas e de 27,54% em São Paulo.
O agricultor João Gerodo, que produz café em Santa Cruz da Prata (MG), busca aproveitar o mercado aquecido. Ele está negociando a venda de uma área de cerca de 12 hectares, que pertence a um irmão dele, com potencial para plantio de café entre Guaxupé (MG) e São Pedro da União (MG).
“Com certeza percebemos essa valorização nas áreas de café aqui na região nos últimos tempos. O café está em alta e ele é o forte no sul de Minas”, afirma. Segundo Gerodo, há dois potenciais compradores interessados na propriedade. Um já é produtor e aguarda a colheita para formalizar a proposta e o outro ofereceu um terreno para ajudar na negociação.
Gabriel Faleiros e Leydiane Brito, analistas da S&P Global Commodity Insights, explicam que o café é uma cultura de alto valor agregado que requer um ambiente adequado para atender aos seus padrões de qualidade, incluindo terras localizadas em altitudes apropriadas, uma topografia que possibilite a mecanização e a irrigação, entre outros fatores.
Esses requisitos, aliás, são destacados nos anúncios de venda de terras nos classificados de jornais locais e boletins online consultados pela reportagem, durante viagem a regiões de café do sul de Minas Gerais. E agregam valor à terra. Na publicação mensal Folha Rural, da Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé (Cooxupé), há ofertas de áreas com irrigação.
“Esses elementos, aliados à crescente demanda por terras destinadas a esse cultivo e ao desbalanceamento da oferta e demanda mundial nos últimos anos, têm sustentado os preços da commodity, resultando na valorização dessas áreas”, afirmam os especialistas da S&P. Na avaliação deles, as áreas de café devem seguir valorizadas. “Há uma limitação na oferta de áreas já consolidadas, e o custo para a formação de novas áreas é considerável, o que contribui para a sustentação dos preços das terras”.
Produtores do sul de Minas, que preferem não se identificar, contaram ao Valor que, em função da alta do café, adiaram a venda de suas propriedades e pensam em comprar ou arrendar mais áreas, mesmo com valorização das terras.
Por outro lado, há cafeicultor aproveitando para vender parte da propriedade para quitar dívidas e fazer caixa, já que o preço do hectare está mais alto, em especial se os cafeeiros estão sendo cuidados para que a lavoura seja repassada em plena condição produtiva.
Um deles relata à reportagem do Valor que, em busca de liquidez, vai se desfazer de 10 hectares na região entre Guaxupé e Nova Resende (MG). A área tem mais de 40 mil pés de cafés que estão em sua terceira safra de escala comercial.
Os valores do hectare variam de acordo com a estrutura do cafezal. Segundo produtores, a proximidade de açudes e rios e a documentação em dia “agregam valor” à área.
Apesar de os preços de café estarem mais voláteis no mercado internacional recentemente, devido à taxa de 50% imposta pelos EUA, a tendência é que o valor do hectare nas negociações de terras para a cultura não seja afetado, segundo Gustavo Fonseca, sócio-diretor da AGBI, gestora focada em investimento em ativos reais.
Em geral, os preços das terras não respondem de forma imediata aos eventos de mercado, uma vez que a terra é um ativo imobilizado de alto valor, não depreciável, e considerado um bem de segurança e fonte de renda.
No entanto, dizem os especialistas da S&P, o comportamento dos preços das commodities e seu impacto na rentabilidade é um indicador importante, que pode ter reflexos no mercado de terras nos próximos semestres.
No arrendamento, as altas são ainda mais expressivas. O dado mais recente da S&P, relativo a junho, indica que o valor médio do arrendamento de uma área de café chegou a R$ 9,45 mil por hectare, um aumento de 92,9% na comparação anual.
Os contratos de arrendamento de café variam, com indexações baseadas em número de sacas, participação na produção ou atreladas ao salário mínimo.