
Em Ribeirão Preto (SP), Manuel Otero defendeu a construção de uma nova narrativa para o agro das Américas O diretor-geral do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), o argentino Manuel Otero, disse em Ribeirão Preto (SP) que a agricultura das Américas, responsável por 23% da produção agrícola do mundo, 29% das exportações de alimentos e 50% da biodiversidade mundial, precisa de uma nova narrativa que mostre que o setor, fortemente ligado à ciência e tecnologia atualmente, não é vilão e sim parte da solução para os desafios globais, que incluem as mudanças climáticas.
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“Precisamos derrubar a vinculação da nossa agricultura com pobreza, extrativismo, contaminação e culpa pelas mudanças climáticas. A agricultura está se transformando, inovando e assumindo novas responsabilidades com a sustentabilidade e a transição energética”, disse Otero.
Ele falou com a Globo Rural na última quarta-feira (25/6), depois de fazer palestra na 35ª Conferência Mundial do Ifama (International Food and Agribusiness Management Association ou Associação Internacional de Gestão de Alimentos e Agronegócios), promovida pela Harven Agribusiness School em parceria com a FB Group.
Otero citou o exemplo do Brasil, que passou de importador de alimentos na década de 70 a grande produtor e exportador de alimentos, como soja, carnes, café e suco de laranja, entre outros, e se mantém como um dos maiores em biodiversidade do mundo.
Segundo o diretor-geral do instituto especializado em desenvolvimento agrícola e rural que tem 34 países membros, incluindo Canadá, Estados Unidos e México, é falso culpar o setor agropecuário pela mudança climática, quando 75% da emissão de gases de efeito estufa vem da energia fóssil.
“Isso não significa que devemos reduzir os investimentos em plantio direto, integração lavoura-pecuária, recuperação de pastos e melhoramento genético para ter animais com menor tempo no ciclo produtivo. Sabemos que agricultura tem que ser sustentável ou não será agricultura. Temos que ter autocrítica, mas é fundamental aumentar a autoestima do agro, mirar o futuro e se concentrar nas oportunidades.”
Otero destacou que o IICA defende essas transformações, foca em projetos de sustentabilidade para melhorar e fortalecer os sistemas agroalimentares, afinal mais de 50 milhões de pessoas ainda passam fome no continente, mas também cobra novas políticas públicas baseadas na ciência e que empoderam os produtores como agentes de mudança.
O dirigente também cita como fundamental na transformação a colaboração entre o setor público, o setor privado, o setor acadêmico e a sociedade, além da formação de uma nova geração de líderes comprometidos com a inovação e a sustentabilidade que conectem as realidades locais com as agendas globais.
Na entrevista, o dirigente criticou ainda o que chamou de unilateralismo da Europa na implementação da lei antidesmatamento (EUDR), sem dar uma contrapartida ou reconhecer os esforços feitos pelos países produtores para garantir sustentabilidade e rastreabilidade à produção.
A European Union Deforestation Act (EUDR) impede os países do bloco europeu de importarem e comercializarem produtos provenientes de áreas onde tenha havido desmatamento ou degradação florestal desde 31 de dezembro de 2020 e deve entrar em vigor em janeiro de 2026.
“Eles tinham que nos escutar, conhecer nossos problemas, ajudar financeiramente no processo de transformação em vez de impor restrições unilaterais. Por isso, o IICA está trabalhando junto aos seus países membros para definir uma frente comum para defender nossos interesses.”
Uma outra frente de trabalho da instituição é o incentivo a um aumento do comércio exterior entre os países da América. Atualmente, apenas 14% do que o bloco exporta fica no continente. Otero diz que esse percentual pode até dobrar se houver um esforço dos países para criarem uma regra única.
“É uma vergonha ver que os países europeus têm um comércio intrabloco de 65% e os da América do Norte, 45%. Sempre estamos mirando os mercados da China, Europa, dos Estados Unidos e nunca miramos dentro da nossa região. É preciso fazer essa transformação.”
Otero, que morou duas vezes no Brasil, diz que o agronegócio do país está num processo irreversível de ficar cada vez mais sustentável e servir de exemplo para o mundo. Ele cita que há países que nem sequer entraram na era dos biocombustíveis e o Brasil está mostrando caminhos nessa área e provando que a produção de biocombustíveis é totalmente compatível com a produção de alimentos.
COP 30
Um dia antes de participar do Ifama, o diretor do IICA anunciou em Brasília a instalação do pavilhão Casa da Agricultura Sustentável das Américas na próxima COP 30 do Brasil, dentro do espaço denominado AgriZone, coordenado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), uma parceira de longa época do instituto.
O objetivo, segundo Otero, é levar os agricultores das Américas, atores cruciais para a segurança alimentar global, aos principais fóruns de negociação ambiental, contribuindo para posicionar a agricultura como solução e tirá-la do banco dos réus dos problemas que existem com o clima
O pavilhão do IICA também foi instalado nas COP do Egito (2022), Emirados Árabes Unidos (2023) e Azerbaijão (2024).






