
Empresa francesa faturou R$ 17 bilhões em 2024 e mira os R$ 35 bilhões; crescimento deve vir por meio de aumento da produção e de aquisições Numa entrevista há 10 anos ao Valor, Patrick Sauvageot, então o principal executivo no país de uma ainda pouco conhecida Lactalis, disse que tinha o desafio de construir a operação brasileira a partir de várias aquisições, tal qual um lego. E a ambição do grupo controlador francês, dono da marca Président, não era pequena: a meta era criar a maior empresa de lácteos do Brasil. O lego ainda não está totalmente montado, afirma agora Sauvageot, que hoje é presidente da Lactalis Américas, mas o objetivo de ser a líder do segmento já foi alcançado.
Leia também
Lactalis quer ampliar seu domínio no mercado brasileiro
Lactalis investirá R$ 313 milhões para ampliar produção de lácteos no Paraná
Desde que chegou ao Brasil, com a compra da empresa familiar de queijos Balkis em 2013, a companhia francesa investiu R$ 7,7 bilhões no país, número que inclui aquisições de laticínios (R$ 5 bilhões) e aportes em ampliações de fábricas (R$ 2,68 bilhões).
Em sua estratégia agressiva de crescimento, a Lactalis adquiriu em 2014 uma empresa quebrada, a LBR, e uma em formação, a Elebat (da BRF). Em 2019, foi a vez da mineira Itambé, que pertencia à Cooperativa Central dos Produtores Rurais do Estado de Minas Gerais (CCPR). Foram movimentos complexos e que em alguns casos, como no da Itambé, ocorreram diante de disputa judicial (com a concorrente mexicana Lala). A aquisição mais recente — e relevante — foi a operação de iogurtes da DPA em 2023.
Com esses movimentos — contados em um livro sobre a história da Lactalis no Brasil — , a empresa lidera hoje a captação de leite no país e atua em todas as categorias de lácteos. São 2,7 bilhões de litros recebidos por ano, destinados à produção de queijos, iogurtes, leite UHT, leite em pó, manteiga, requeijão, leite condensado e creme de leite, em 23 unidades pelo país.
Embora já seja a maior do segmento, a companhia busca mais, pois avalia que há potencial para o avanço da demanda por lácteos no país. “Temos a ambição de duplicar a dimensão de Lactalis do Brasil, e estamos caminhando para isso. Uma parte vai vir de aquisições, uma parte de crescimento interno e de crescimento também do consumo”, estima Sauvageot em entrevista exclusiva ao Valor.
No ano passado, a empresa faturou R$ 17 bilhões no Brasil, 10% acima de 2023, e a meta é alcançar R$ 35 bilhões até 2030, diz o CEO da Lactalis Brasil, Roosevelt Júnior. Para alcançar esse montante, será necessário ampliar a captação de leite, as operações de processamento e investir em agregação de valor nos próximos anos.
Saiba-mais taboola
Os executivos admitem que crescer via aquisições depende das oportunidades. E no caso da Lactalis há outro fator a se considerar: a concorrência dentro do próprio grupo controlador, que mantém há anos uma estratégia de crescimento via aquisições que fez dele o maior do mundo em lácteos. “O problema é que estamos em concorrência dentro do grupo com outras oportunidades”, observa Sauvageot.
Recentemente, a empresa, que tem capital fechado e é controlada pela família Besnier, anunciou interesse em comprar a operação da Fonterra na Ásia e fez duas aquisições nos Estados Unidos: o negócio de queijo fresco da Kraft e a operação de iogurtes da Yoplait. “São países com moedas fortes, com mercado super-rentáveis. Então, de certo modo, estamos em competição”, diz.
A captação de matéria-prima com produtores também terá de crescer “muito”, mas os executivos não arriscam um número.
O certo é que será preciso atrair mais fornecedores. Hoje, cerca de 60% do leite recebido pela Lactalis vêm de cooperativas com as quais a empresa fez acordos para fornecimento. A mineira CCPR é a principal entre elas. A Lactalis também recebe leite de mais cinco cooperativas, no Paraná e no Rio Grande do Sul. No total, são cerca de 10 mil produtores ligados às entidades.
“Por isso que os acordos com as cooperativas são muito importantes. Se queremos duplicar a nossa posição, teremos de arrumar outros”, afirma o presidente da Lactalis Américas.
Também será preciso aumentar o número de produtores que fornecem de forma independente à Lactalis, que hoje são 6 mil. E ainda a adesão a um programa considerado a menina dos olhos da empresa: o Lactaleite, que dá assistência técnica aos pecuaristas, visando melhoria de produtividade e qualidade e redução de custos. Segundo Roosevelt Junior, no último ano, a produção do grupo de 1 mil produtores que participa do programa cresceu 16%.
A empresa quer ampliar essas parcerias, que miram a fidelização no fornecimento, e tem o desenvolvimento da cadeia de lácteos no Brasil como uma de suas prioridades. “O fato de sermos o número 1 nos cria obrigações”, afirma Sauvageot. Para ele, o país não consegue atender toda a demanda e importa lácteos porque a cadeia leiteira não está bem estruturada e suficientemente competitiva. E isso faz com que o custo de produção seja alto e o leite seja caro.
Os varejistas também “não estão felizes com o leite”, diz ele, pois alegam margens pequenas em relação a outros produtos e falta de previsibilidade sobre os preços. “Há insatisfação em toda a cadeia, e achamos que o papel do líder é ajudar a construir uma cadeia mais rentável. (…) Ajudar o produtor a ganhar dinheiro, porque se ele ganhar dinheiro, vai investir para melhorar a produtividade e a qualidade do leite”, avalia.
A despeito das dificuldades na cadeia, a Lactalis cresceu muito nos últimos anos no Brasil. Mas a montagem do lego não terminou, segundo o executivo. As peças que faltam dizem respeito ao serviço ao cliente. “Temos que melhorar”, diz. E também ao número de produtores que participam do programa Lactaleite. “Por que não são 4.000?”, indaga. “Seria muito bom para a empresa. Porque hoje temos potencial de venda bem acima de nossa capacidade de produção”, reconhece Sauvageot.





