
Produtores adotam postura mais cautelosa, mas marcas enxergam potencial na reta final da feira Mesmo com os juros elevados, montadoras presentes na Agrishow apostam no volume e na proximidade com o produtor rural para impulsionar as vendas de picapes. O cenário econômico ainda traz incertezas, e muitos produtores adotam uma postura mais cautelosa, mas as fabricantes enxergam potencial na reta final da feira, que ocorre até esta sexta-feira (2/5), em Ribeirão Preto (SP).
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As empresas apostam em descontos e taxas de juros subsidiadas para atrair os consumidores, e a expectativa é de que parte significativa das vendas se concentre no fim do evento. Segundo representantes das montadoras, a estratégia visa compensar a resistência inicial dos produtores, que tradicionalmente deixam a decisão de compra para o segundo semestre, quando os pedidos são faturados.
“Se o cara não tem crédito, fica muito difícil para ele conseguir trocar de carro ou equipamento”, afirma Matheus Amaral, gerente de Comunicação e Marketing da Ford. Ele ressalta que a montadora tem se adaptado ao momento do produtor, com a oferta de taxas mais atrativas e uma linha de produtos que atende desde a demanda por tecnologia até a necessidade de veículos mais robustos para o trabalho pesado.
O início da feira, marcado por chuva, reduziu o fluxo de visitantes, com impacto direto nas ações das montadoras. A Ford, por exemplo, precisou interromper o test-drive no primeiro dia. Apesar disso, Amaral acredita que os dias finais serão decisivos para os resultados.
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Ricardo Benichio
“O primeiro dia vem muito curioso, o segundo é mais ou menos, e agora começa o fechamento”, diz ele, estimando que as vendas da marca na campanha da Agrishow devem superar as mil unidades, entre antes, durante e após o evento.
A Mitsubishi compartilha o otimismo. Renato Vaz, supervisor de vendas da marca na feira, relata que os dois primeiros dias surpreenderam positivamente, com vendas acima do esperado. “Na quarta-feira vendemos mais de 20 picapes em um único dia”, afirma. A meta é chegar a 100 veículos vendidos até o encerramento da feira. Segundo ele, o diferencial neste ano tem sido o público mais decidido, que já está informado da campanha de descontos e chega ao estande pronto para negociar.
Saiba-mais taboola
Já a Volkswagen enfrentou um ritmo mais lento nos primeiros dias, mas viu a movimentação crescer a partir da quarta-feira. “Nossa turma ficou doida já, porque é muita gente”, brinca Egno Silva, diretor de vendas da concessionária da marca no evento.
A Saveiro, modelo de entrada voltado ao trabalho no campo, lidera as vendas. Em contrapartida, a picape Amarok sofre com o prazo de entrega estendido, que pode chegar a outubro. “Isso desestimula o produtor, que quer comprar agora e receber logo”, afirma Silva. Mesmo assim, a Volkswagen já vendeu mais de 150 veículos na semana, quase metade de Saveiros.
O comportamento mais cauteloso do produtor rural é consenso entre os fabricantes. A combinação de juros altos, incertezas econômicas e crédito restrito tem levado muitos a adiar a renovação de suas frotas. “O produtor considera que o crédito está caro e escasso. Quando você oferece uma taxa melhor, já ajuda a estimular a compra”, avalia Silva.
“Eu acredito que tem gente adiando troca, porque tem muita gente que estaria na hora de trocar a frota e eles estão adiando um pouco, esperando muito mais pro pro cenário do agronegócio do que para venda de automóveis”, explica.
Além disso, o modelo de compra tem mudado. Segundo representantes de vendas das montadoras ouvidos pela reportagem, as margens foram reduzidas para atrair compradores e “desovar produtos”, com a expectativa de ganhar em volume. No entanto, ao contrário de edições anteriores, em que produtores adquiriram lotes de veículos, as vendas têm sido mais fragmentadas, refletindo uma abordagem mais conservadora.
Ainda assim, o desejo por tecnologia segue forte. “O produtor quer acompanhar a tecnologia que ele vê nas máquinas agrícolas na sua camionete também”, destaca Amaral, da Ford.
O tíquete médio nas montadoras varia conforme o perfil do veículo e do comprador: entre R$ 95 mil para a Volkswagen, R$ 280 mil para a Mitsubishi e até R$ 320 mil na Ford.
Com a previsão de tempo firme e maior presença de visitantes nos últimos dias da Agrishow, as montadoras esperam transformar o interesse acumulado ao longo da semana em vendas efetivas. Para os fabricantes, o ambiente da feira segue sendo estratégico por aproximar diretamente quem vende e quem compra — mesmo que o produtor rural ainda prefira, por ora, olhar, comparar e planejar antes de decidir.
Modelos menos poluentes
Durante a Agrishow, montadoras apresentaram novos modelos de picapes com tecnologias voltadas à redução de emissões e maior eficiência energética. As iniciativas fazem parte de um movimento do setor automotivo para atender às demandas por veículos menos poluentes, inclusive em áreas rurais.
Entre os destaques, a fabricante chinesa Riddara levou ao evento uma picape totalmente elétrica. A Toyota apresentou um protótipo movido a biometano, enquanto a Mitsubishi exibiu um modelo que utiliza ARLA — agente redutor de emissões de óxidos de nitrogênio. Já a BYD levou à feira uma picape híbrida, capaz de rodar até 100 km no modo elétrico.
Apesar do avanço tecnológico, a adoção desses veículos no campo ainda encontra obstáculos, principalmente relacionados ao acesso à infraestrutura elétrica. A proposta de rodar parte do trajeto com energia elétrica pode ser vantajosa do ponto de vista econômico e ambiental, mas, em muitas áreas rurais, a rede elétrica é instável ou inexistente.
Questionada sobre como viabilizar a recarga em locais com infraestrutura limitada, a BYD informou que aposta na “autonomia do consumidor” para criar um “ecossistema de recarga” próprio, enquanto a Riddara não respondeu à solicitação da reportagem.
Segundo a BYD, a autonomia do consumidor incluiria o uso de painéis solares, inversores e sistemas de armazenamento de energia. O carregador é fornecido com o veículo, mas a instalação do restante da estrutura depende do produtor.
Essa alternativa, embora viável tecnicamente, envolve custos elevados e planejamento específico, o que pode dificultar sua adoção, sobretudo entre pequenos e médios produtores. A flexibilidade do sistema híbrido permite que o veículo continue rodando com o motor a combustão quando a bateria elétrica se esgota, o que ameniza a limitação, mas também indica que a operação integralmente elétrica ainda está distante de se tornar prática comum no campo.